Publicado em 5 de julho de 2020 às 20:37
A economia brasileira vai ter um longo e árduo caminho pela frente para conseguir deixar para trás os impactos brutais que a pandemia do novo coronavírus tem deixado no faturamento e nos investimentos de empresas, na renda dos trabalhadores e na arrecadação dos governos. Uma retomada rápida, como se previa inicialmente, parece cada vez mais difícil, uma vez que a desigualdade social deve ser ampliada. >
A Gazeta questionou três economistas sobre o que será necessário fazer desde já para garantir uma recuperação o mais breve possível da economia. Os caminhos apontados não são pautas novas e nem fáceis. O ponto central das propostas é consenso entre a maioria dos especialistas: fazer reformas e melhorar o ambiente de negócios de forma a reduzir as incertezas e dar mais confiança.>
Isso se fará ainda mais necessário no pós-pandemia para que as pessoas tenham renda e coragem para consumir, e também para que as empresas decidam investir, criando mais emprego e renda. Hoje tudo isso está travado, como lembra o economista Orlando Caliman:>
"Ninguém está comprando: o governo está injetando um volume de recursos enorme na economia, seja através do auxílio emergencial, do saque do Fundo de Garantia (FGTS), ou do crédito. Mas nesse período a gente vê que o volume de recursos em poupança aumentou porque as pessoas não estão gastando justamente pela falta de confiança de que vão manter o emprego ou recuperar a renda". >
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Pesquisador da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), Marcel Balassiano lembra um fator social preocupante que precisará ser levado em conta nas medidas para recuperação do país: "Praticamente todo mundo vai sair dessa crise mais pobre do que entrou. Mesmo com a ajuda do governo, a queda de renda ainda é muito grande".>
Por isso, a economista e professora da Fucape Arilda Teixeira avalia que ter um olhar social é uma obrigação do governo. Para isso, ela defende um profundo corte de gastos na máquina pública para abrir espaço no orçamento.>
Os economistas elencaram cinco medidas necessárias para estimular a retomada do crescimento econômico. São propostas já em debate há algum tempo, mas que, segundo eles, ganham mais urgência agora. As aplicações vão além do governo federal e também podem ser feitas ao nível local, no Espírito Santo, como iniciativas para melhorar o ambiente de negócios. Confira:>
A crise vai deixar como consequência um cenário de desemprego elevado, queda de renda e aumento da desigualdade, ou seja, as pessoas vão ficar mais pobres. No momento atual, medidas como o auxílio emergencial tem ajudado nesse sentido, mas ele não resolverá o problema nem poderá ser eterno. >
"Os gastos temporários não podem se tornar permanentes. Mas talvez seja sim uma boa hora para pensar numa política de renda mínima mais ampliada que no pós-pandemia ainda dê alguma ajuda", disse Marcel Balassiano, pesquisador do Ibre/FGV. >
O governo federal já anunciou, por exemplo, que pretende lançar até o final do ano o programa Renda Brasil, com maior abrangência que o Bolsa Família e que terá um auxílio mensal maior que o programa criado no governo Lula (PT).>
Para seguir bancando os investimentos sociais e também ajudando empresas, se torna mais urgente uma redução dos gastos públicos e uma política de maior austeridade fiscal. Para além de ver onde cortar no Orçamento, para Orlando Caliman é preciso repensar todo o governo. Ele cita, por exemplo, a necessidade de se avançar com a reforma administrativa:>
"Tem que rever o gasto público, qualificá-lo. A reforma administrativa tem que passar para isso, reduzir o astronômico gasto com pessoal e enxugar o Estado", diz. >
Caso isso não aconteça, a economista Arilda Teixeira faz um alerta: "A iminência de um calote da dívida é algo possível se não for feito um corte de gastos na máquina pública. Há uma dificuldade, que foi a decisão do Supremo Tribunal Federal que proibiu cortes de salário para servidores. Isso é algo ruim para as contas públicas porque dificulta esse ajuste".>
Promover melhorias no ambiente de negócios para atrair investimentos é algo que já está na pauta há algum tempo, mas que agora exige ainda mais celeridade, na avaliação dos economistas, tanto a nível federal como local, para recuperar a confiança do investidor.>
Orlando Caliman
EconomistaNo caso da reforma tributária, o economista defende que se vá além da unificação de impostos, mas que também se repense a forma de se arrecadar recursos públicos no Brasil. "Essa tributação regressiva acaba prejudicando os mais pobres", lembra Caliman.>
A redução da burocracia como um todo, segundo Marcel Balassiano, é uma agenda que precisará ser retomada com urgência. "Esse debate hoje está paralisado. A gente vai ter que voltar nele para melhorar o ambiente econômico, aumentar a produtividade e assim voltar a ter anúncios de investimentos e de criação de empregos".>
Nessa linha, o governo federal estuda, por exemplo, uma nova desoneração da folha de pagamentos das empresas visando a incentivar a abertura de vagas formais. A criação de um imposto único federal também deve ser proposta pela equipe econômica visando à simplificação do sistema. >
As obras de infraestrutura deverão são apontadas como potenciais molas propulsoras para a retomada do crescimento no pós-pandemia. A primeira boa sinalização para isso já foi dada com a aprovação do novo marco legal do saneamento básico, setor que deve demandar investimentos da ordem de R$ 9 bilhões só no Espírito Santo nos próximos anos.>
Acelerar essas obras é fundamental, tanto a nível federal como estadual. Em ambos os casos, como faltam recursos diante da crise fiscal, os economistas apontam a necessidade de andar com a agenda de privatizações e concessões, trazendo dinheiro privado, sobretudo do exterior, para garantir esses investimentos e gerar empregos.>
"É uma agenda em que estamos atrasados até. Precisamos que essas concessões e obras de infraestrutura saiam do papel para a economia funcionar. A mobilização que já está sendo feita nesse sentido é bem-vinda e precisa ganhar celeridade", comenta a economista Arilda Teixeira.>
No governo federal, projetos como leilões de rodovias, portos e aeroportos foram mantidos para este ano. A ideia nem é tanto gerar caixa com as concessões, e sim garantir que investimentos aguardados saiam do papel, como é o caso no Espírito Santo da duplicação da BR 262.>
Para realizar todas as medidas citadas anteriormente e mesmo assim transmitir um sinal maior de tranquilidade à população e aos investidores, é preciso que os ânimos sejam acalmados em Brasília de forma a reduzir as incertezas políticas. >
"Na pandemia tivemos crises políticas relacionadas ao vírus e também outras sem relação com isso. Uma coleção de crises. Como a divergência entre presidente e governadores e as trocas de ministros. Tudo isso eleva a incerteza e a crise política em um momento já de dura crise sanitária e econômica", diz Marcel Balassiano.>
Ele conclui: "para que seja possível fazer as reformas, por exemplo, precisamos que haja harmonia entre os Poderes e até da ajuda dos governadores. Toda essa animosidade é um empecilho que acaba prejudicando muito e que precisa ser deixado para trás".>
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