Publicado em 2 de julho de 2020 às 09:10
Os efeitos negativos da crise do novo coronavírus no emprego já ultrapassam aqueles vivenciados durante o auge da crise fiscal brasileira, em 2015. Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), só nos três primeiros meses de pandemia, o Espírito Santo perdeu 28,5 mil postos de trabalho. Em todo o ano de 2015, pior ano da crise, a perda foi de 46,9 mil vagas.>
Comparando períodos iguais, os cinco primeiros meses da crise fiscal (janeiro a maio de 2015) terminaram com um saldo negativo de emprego de 9 mil. Isso significa que houve 9 mil demissões a mais do que admissões. Nos cinco primeiro meses de 2020, esse saldo já está próximo de 25 mil. >
Os dados do Caged mostram ainda que abril deste ano foi o mês com o pior saldo de empregos no Estado desde 1996, quando começa a série histórica. Só o setor do comércio fechou mais de 5 mil postos de trabalho.
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Para a economista Arilda Teixeira, a Covid-19 nos colocou diante da pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial. Ela aponta, contudo, que, diferentemente das anteriores, essa é a primeira vez que a crise não tem raízes econômicas.
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"Essa recessão está sendo provocada por uma questão de saúde pública. Ela é, antes de tudo, uma crise sanitária. A economia sofre os efeitos da pandemia, mas não tem instrumentos para anular esses efeitos, como houve em outras ocasiões", avalia. >
As medidas de contenção da pandemia provocaram uma espiral negativa em toda a economia. Com a população em casa, o comércio não vende. Sem vender, não há demanda para os setores produtivos. Sem produção, muitas empresas fecham ou demitem seus funcionários. Sem emprego e sem renda, o trabalhador não compra e prejudica o comércio. >
"É uma grade sinuca de bico. O ruim dessa história é que ela representa perda de qualidade de vida, desgaste emocional, além das mortes, naturalmente. É um custo humanitário incalculável", afirma a economista.
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Outra característica da crise do coronavírus apontada por especialistas é a velocidade. Como em muitos locais as atividades econômicas foram praticamente paralisadas por meses, as consequências chegaram de forma concentrada. >
"As crises de 2015 e de 2008 (da bolha do mercado imobiliário americano) chegaram ao mercado de trabalho de forma mais suave. Essa foi abrupta", aponta o economista Eduardo Araújo. >
Araújo lembra ainda que a chegada do coronavírus ocorreu em um momento em que o país e o Estado ainda estavam, lentamente e com muito esforço, recuperando as vagas de emprego perdidas na crise anterior. Isso potencializou os efeitos negativos no mercado de trabalho. >
"Os economistas sempre falaram da década de 1980 como sendo a 'década perdida' de crescimento econômico. Mas, hoje, já há um consenso de que a verdadeira década perdida é a de 2010 a 2020", afirma.>
Mesmo que a pandemia tenha afetado toda a população, ela atingiu de forma mais dura as pessoas que já são vulneráveis, acentuando ainda mais desigualdades de gênero, de raça e de renda no mercado de trabalho. >
"Essa crise teve um impacto maior no setor de serviços, comércio, hotelaria, negócios relacionados ao entretenimento e ao turismo. São aqueles onde tradicionalmente há mais mulheres e jovens", afirma Araújo. >
Há ainda uma grande parcela da população que nem sequer entra das estatísticas do Caged. Os trabalhadores informais, sem carteira assinada, representam quase 60% da força e trabalho e também foram gravemente impactados. >
"Como o rio corre para o mar, naturalmente os mais prejudicados nesse desarranjo são os menos favorecidos. Os trabalhadores informais são os mais precários e os que mais sofrem. Há uma sobreposição de situações muito graves do ponto de vista humano", avalia Arilda Teixeira. >
Ambos especialistas concordam que qualquer perspectiva de recuperação econômica depende da distribuição de uma vacina contra o novo coronavírus. Só a partir daí, será possível calcular o estrago feito pela pandemia e começar a traçar um plano de retomada mais concreto. >
"Até que haja solução sanitária, não haverá solução econômica", opina Arilda. >
Até que seja encontrada uma saída na forma de vacina ou de cura para a doença, os efeitos da crise ainda podem se acentuar. Com o fim da vigência de algumas medidas paliativas do governo federal, como o auxílio emergencial e a redução de jornada e salários, é possível que haja uma nova onda de demissões. >
"Há um risco muito grande de a gente ter o fim da validade dessas medidas antes da volta efetiva da economia. Há esforços para a produção de uma vacina, mas ainda não há clareza de como e quando essa distribuição deve acontecer. Toda essa incerteza gera medo nos empresários e na população. E, do ponto de vista econômico, esse medo implica em perdas maiores ainda de negócios e de faturamento", explica Araújo.
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