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Empresas testam empregados em massa para Covid-19, mas tática preocupa

Empresas testam empregados em massa para Covid-19, mas tática preocupa

Para garantir retomada segura das operações, companhias fazem seus próprios inquéritos sorológicos. Especialistas, no entanto, alertam para risco de confiar nos exames rápidos

Publicado em 6 de junho de 2020 às 06:00

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Coleta de sangue de para para realização do teste rápido de Covid-19 pela Petrobras
Coleta de sangue de para para realização do teste rápido de Covid-19 pela Petrobras. (Agência Petrobras/Divulgação)

A pandemia do novo coronavírus afetou em cheio as rotinas produtivas das empresas. Desde o início, quando o vírus começou a circular no Brasil, companhias de todos os portes sentiram esse baque e muitas já tomaram por si só medidas até então consideradas extremas, como concessão de férias coletivas ou mesmo a paralisação das atividades.

No Espírito Santo, grandes indústrias como o Estaleiro Jurong e a Marcopolo optaram por medidas assim no início da pandemia, além das outras que tiveram que se adequar por determinação do governo fechando as portas ou implantando o home office. Agora, a maioria já está retomando parcialmente as atividades, mas com uma série de medidas preventivas de segurança.

Além dos cuidados no dia a dia com as medidas sanitárias, como o distanciamento social, reforço na limpeza e o uso de máscaras, grandes companhias estão investindo pesado na aquisição e realização de testes rápidos de sangue em funcionários, que servem para ver se a pessoa tem anticorpos da doença por já ter contraído o coronavírus. Em alguns casos, as empresas aplicam também o teste com biologia molecular, o PCR, que fornece o diagnóstico preciso da Covid-19. Geralmente, é usado pelas empregadoras em quem tem sintomas gripais.

O mais comum tem sido o teste rápido. No Estado, gigantes como Vale e Petrobras são algumas que têm usado esse modelo para examinar em massa funcionários próprios e terceirizados antes da entrada nas unidades, por exemplo.

Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Empresas Metalúrgicas do Estado (Sindimetal-ES), Max Célio Carvalho, grandes empresas do setor também estão aplicando os testes sobretudo para checar o índice de contágio entre os trabalhadores próprios e terceirizados, e que isso deve passar a ser periódico.

No caso da Vale, a empresa não informou periodicidade, mas garantiu que faz os exames rápidos e que isso é acompanhado de uma triagem diária. A Petrobras afirmou que tem feito ampla testagem para triagem de profissionais antes do início de atividades em áreas operacionais, como plataformas. A ArcelorMittal também tem realizado exames similares, mas não especificou seus métodos.

Esse teste rápido é o mesmo utilizado pela Secretaria de Estado de Saúde (Sesa) no Inquérito Sorológico para estimar o percentual da população capixaba que já teve contato com o vírus. A sorologia verifica a resposta imunológica do corpo em relação ao vírus. Isso é feito a partir da detecção de anticorpos em pessoas que foram expostas ao coronavírus. Nesse caso, o exame é realizado a partir da amostra de sangue do paciente.

O médico infectologista Carlos Urbano ressaltou, porém, que há uma diferença do uso desses testes em empresas quanto a aplicação pela Sesa. "O teste da Secretaria de Saúde é para investigar em um grupo populacional quem teve Covid-19 a fim de fazer uma estimativa de quem já teve contato com o vírus. Ele não é usado para diagnóstico. Nesse caso, usa-se o PCR".

EFICIÊNCIA E RISCOS

O objetivo da aplicação nas empresas é dar mais segurança aos funcionários e garantir as operações. Porém, essa testagem tem pouca eficácia na visão de especialistas. A avaliação é que a eficiência desse exame é baixa e que se isso for o parâmetro para definir quem pode trabalhar ou não, pode acabar trazendo mais riscos.

Urbano explicou que para que esse exame seja realizado, é preciso esperar cerca de 14 dias do início dos sintomas. Isso se deve ao fato de que produção de anticorpos no organismo só ocorre depois de um período mínimo após a exposição ao vírus. Assim, ao longo desse tempo, o trabalhador que estiver contaminado pode estar transmitindo a doença para outras pessoas.

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Esses testes [rápidos] falham muito. Eles não dizem quem está com a doença, mas sim quem já teve. Então a utilidade disso numa empresa é limitada, primeiro porque ele erra muito, segundo porque mesmo se alguém já tiver tido contato com o vírus, isso não garante que ela está imune e nunca mais vai pegar

Carlos Urbano
Infectologista
Aspas de citação

Um estudo do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos aponta que esses testes de imunidade podem dar errado em metade das vezes, e por isso eles não devem ser usados para determinar quando uma pessoa voltará ao trabalho, por exemplo. Uma pessoa pode receber um falso positivo e achar que já teve contato com a doença, mas não ter sido infectada ainda,

"Também há o risco de falso negativo, porque uma pessoa pode estar com a doença e isso não ser identificado ainda. Então não dá pra ver uma aplicação prática disso para tomar decisões numa empresa", destacou Urbano.

A orientação do CDC é só os resultados desses testes não devem ser levados em conta para definir quem deve ficar em isolamento, e que, em caso de um resultado positivo desses testes, seja feito um segundo exame para contraprova.

Ao reforçar que o teste rápido não é o método adequado para avaliar a volta ao trabalho, a médica infectologista Rúbia Miossi explicou ainda que qualquer exame é complementar ao diagnóstico médico.

ENTENDA OS TESTES DE COVID-19

Teste rápido sorológico
Como é: colhe amostra de sangue que é colocada em contato com um reagente que detecta a presença de anticorpos (IgG e IgM), defesas produzidas pelo corpo humano contra o coronavírus. 
Serve para: identificar se o organismo possui anticorpos contra o coronavírus, ou seja, se já houve contato com a doença.
Quando pode ser feito: após 14 dias de se sentirem sintomas ou ter contato com pessoas que tiveram o vírus.
Resultado: em até 15 minutos. 

PCR
Como é:
colhe a secreção da garganta e do nariz do paciente através de um swab – instrumento parecido com um cotonete – que, em seguida, é encaminhado a um laboratório.
Serve para: identificar quem está com o vírus.
Quando pode ser feito: quando houver presença de sintomas.
Resultado: em até 48 horas.

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Fonte:

"É um teste que não deve ser utilizado sem recomendação médica e acompanhamento do caso. Esses exames só têm valor para pacientes que tiveram um quadro respiratório. Fazer ele aleatoriamente em pessoas assintomáticas pode gerar confusão de diagnósticos e não ajudar na definição se a pessoa já pegou a doença ou não", afirmou.

Há ainda outro risco desses testes rápidos, segundo a médica. "São exames que podem ter reação cruzada, respondendo positivo sem ter coronavírus por ter dado reação cruzada com algum outro tipo de anticorpo".

PADRÃO OURO

O ideal para uso em empresas seria o teste PCR, considerado padrão ouro e que de fato é utilizado pelos órgãos de saúde para confirmar a doença. Esse teste é o que de fato serve para o diagnóstico da Covid-19, através da análise da secreção de pacientes.

A infectologista Rúbia Miossi destacou que ele só tem aplicação em quem está com sintomas. "O PCR é um exame de secreção respiratória capaz de identificar partículas virais do paciente sintomático e identificar que a pessoa está com o coronavírus".

Covid-19: Testes para detectar o novo coronavírus em Linhares
Teste PCR é feito em laboratório a partir da coleta da secreção de quem está com sintomas. (Prefeitura de Linhares )

No Estado, o PCR é usado por indústrias como a Imetame, e que os aplica em “colaboradores que estão embarcando para uma obra em São Paulo, e também em os que estão na linha de frente nas ações de prevenção ao Covid-19 na empresa”. A Petrobras também aplica esse exame em profissionais com sintomas.

Na Suzano e em Portocel, ele é realizado em situações pontuais quando identificada a necessidade, quando há casos suspeitos de contaminação e sempre no retorno ao trabalho para aqueles que foram diagnosticados como positivo.

A Sesa foi questionada sobre qual procedimento é o recomendável para empresas e se os casos por elas confirmados são contabilizados pela Secretaria. A assessoria informou apenas que todos os casos suspeitos ou confirmados de coronavírus devem ser notificados por meio do Sistema de Informação em Saúde e-SUS Vigilância em Saúde (VS), e que em relação às empresas, elas devem entrar em contato com a Vigilância Municipal para os devidos trâmites.

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