Quase 500 famílias que moram na Região Serrana do Espírito Santo estão sem energia elétrica há quase uma semana. Como se isso já não fosse ruim o suficiente, várias dependem do fornecimento elétrico para ter acesso à água, bombeada de poços artesianos – ausência ainda mais grave durante a pandemia.
A situação é enfrentada por quem vive no distrito de Santa Isabel, em Domingos Martins; na comunidade de Vila Maria, no município de Vargem Alta; e nas regiões de Alto Rio Fundo, Bom Jesus, Costa Pereira e Rio Fundo, em Marechal Floriano. O transtorno começou após as fortes chuvas da última quarta-feira (31).
Durante a tempestade – com direito a granizo, raios e ventos fortes – diversos prejuízos foram sendo registrados de Norte a Sul do Estado. Na Grande Vitória, por exemplo, o abastecimento de água chegou a ser interrompido. A BR 262 precisou ser interditada por quedas de árvore, e 23 pessoas ficaram desalojadas.
Desde então, a comerciante Geania Cordeiro sofre com a escuridão e as torneiras secas em Domingos Martins. Vivendo com outras sete pessoas, incluindo uma criança de nove anos e outra de apenas dois, a alimentação tem sido à base de pão e salame. Situação semelhante à de aproximadamente 36 vizinhos.
"É um galão por dia, a R$ 10. Não é muito, mas também não é qualquer dinheiro, principalmente na pandemia, que estou com meu comércio fechado. Tem gente que não tem condição", comentou. "Fora que é muita vasilha suja, muita mosca. De noite, eu queimo papelão para ver se diminui", continuou Geania.
Para além das dificuldades, ela tem um medo extra em relação ao coronavírus. "Não tem como ficar lavando a mão toda hora e nem ficar passando gel, porque a mão fica grudenta. Eu tenho rinite alérgica. Sem querer, levo a mão ao nariz. Estamos jogados aqui, só Deus para proteger a gente", desabafou.
Em um drama parecido, estão a manicure Alice Mendes Ferreira e a estudante Nicolle Maria da Silva Milagre, que vivem em Vargem Alta. Ambas só têm água graças ao acesso a uma nascente e alguma iluminação por velas. As duas ainda têm parentes com saúde delicada e se preocupam, especialmente, com eles.
"Meu avô é idoso, vai fazer 80 anos em agosto e precisa de cuidados. Ele respira com a ajuda de aparelhos e precisou ser levado ao centro da cidade. A sobrinha de uma vizinha precisa de nebulização também", contou Nicolle, dizendo que a comunidade já acumula um prejuízo de R$ 2 mil devido às comidas estragadas.
Já Alice tem uma avó diabética. "A gente fica com medo de acontecer algo com ela, precisar ligar e não conseguir. Até pedir ajuda para um vizinho é difícil à noite, no escuro total. Eu só tenho alguma bateria no celular, porque meu pai leva os telefones para onde ele trabalha, que está com energia", disse.
Próximo dali, em Marechal Floriano, a diarista Diana de Freitas de Oliveira também precisou recorrer à nascente e à água mineral para poder fazer, minimamente, algumas atividades básicas do dia a dia. "Compramos galão para beber e fazer comida; e usamos a água que o vizinho cede para tomar banho", contou.
Em comum, as quatro capixabas também relataram a falta de apoio dos respectivos municípios no que diz respeito à alimentação e ao fornecimento de água. Assim como a demora e a falta de perspectiva da empresa EDP, concessionária responsável pela distribuição de energia elétrica no Espírito Santo.
Por meio de nota, a EDP admitiu que 498 clientes estão sem energia elétrica em Domingos Martins, Marechal Floriano e Vargem Alta. "No total, 132 mil foram afetados no Estado pelo vendaval com queda de granizo registrado na semana passada. Isso significa que 99% dos clientes já estão com fornecimento normalizado", informou.
A distribuidora esclareceu que a demora no restabelecimento se deve à queda de florestas de eucaliptos e árvores de grande porte sobre a rede elétrica. "Não são precisos apenas reparos, mas reconstrução de trechos inteiros. Desde o início da contingência, foi necessário reinstalar 65 quilômetros de fios e substituir 328 postes", detalhou.
"Com isso, o número de ocorrências diárias ficou dez vezes maior que a média. Para solucionar o problema, 658 colaboradores trabalham de forma dedicada na região. Vale lembrar que a maior parte dos clientes ainda desligados se encontra na zona rural e equipes enfrentam dificuldades de acesso", continuou a empresa.
Por fim, a EDP garantiu que vai realizar a instalação provisória de geradores "nos pontos mais críticos" e que realiza um mapeamento junto às prefeituras para o envio de caminhões-pipa. A concessionária, porém, não especificou quais locais serão abrangidos e nem quando esse apoio será prestado à população.
Também por meio de nota, a Prefeitura de Domingos Martins disse ter "conhecimento da falta de energia em algumas regiões do município, ocorrida após a forte tempestade da última quarta-feira (31)" e que se reuniu, nesta terça-feira (6), com um representante da EDP para "discutir a situação".
"Alguns moradores tiveram o fornecimento de água interrompido em virtude do desligamento de energia. Por isso, o município firmou uma parceria com a Cesan para garantir o abastecimento de água nestes locais com caminhões de água potável, até que o fornecimento de energia seja restabelecido", garantiu.
Sobre a situação das vias que dão acesso às casas afetadas e que estaria prejudicando as equipes da EDP, a prefeitura afirmou que recebeu "várias demandas de árvores caídas em estradas locais, mas que as principais já foram reparadas no decorrer do dia seguinte. Ou seja, na quinta-feira (1)".
Já a Prefeitura de Marechal Floriano confirmou que "as vias (que dão acesso aos locais afetados) foram extremamente prejudicadas", mas informou que "o município está realizando a limpeza e a liberação das vias que foram bloqueadas pela queda de árvores e encostas, por meio do uso de máquinas especializadas".
De acordo com a administração, a comunidade de Araguaya e os bairros de Santa Rita e Alto Marechal também foram "profundamente afetados". No entanto, nestes locais, o fornecimento de energia e o abastecimento de água já foram restabelecidos. Para os demais, "a EDP não tem previsão para normalidade".
A reportagem de A Gazeta também entrou em contato com a Prefeitura de Vargem Alta e ainda aguarda uma resposta. Quando o retorno for dado, esse texto será atualizado.
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