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TJES mantém condenação de ex-deputado e igreja por 'rachadinha'

TJES mantém condenação de ex-deputado e igreja por 'rachadinha'

Caso envolvia ainda, segundo a Justiça, o uso de servidores públicos em atividades religiosas, como aulas na escola bíblica de uma igreja neopentecostal

Publicado em 30 de dezembro de 2025 às 13:55

A Justiça do Espírito Santo barrou, às vésperas do recesso do Judiciário, a tentativa de um ex-deputado estadual e de outros réus de levar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF) um processo que apurou esquema de “rachadinha” e uso irregular de servidores públicos. A decisão foi revelada no último dia 19 e mantém a condenação por improbidade administrativa, que também envolve a Igreja Universal do Reino de Deus.

A negativa foi assinada pelo ex-vice-presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), desembargador Namyr Carlos de Souza Filho, que não admitiu os recursos Especial e Extraordinário apresentados pelo ex-deputado Robson de Souza Vaillant, por seu ex-chefe de gabinete Marcelo Cirino Barbosa e por Vanderson de Souza Vaillant, irmão do parlamentar.

TJES
Sede do Tribunal de Justiça do ES Crédito: Carlos Alberto Silva

Com isso, os réus ficam impedidos de levar o caso às instâncias superiores, e o processo segue para a fase final, próxima do trânsito em julgado, quando não caberá mais recurso da decisão.

Procurada pela reportagem desde a tarde de segunda-feira (29), a defesa de Robson Vaillant esclareceu que o barramento dos recursos neste momento é um procedimento previsto e que o caso ainda não está encerrado.

"Isso é normal e possível de acontecer. Na ação em que foi negada a subida ao STJ, os prazos ficam suspensos devido ao recesso e não correm até 20 de janeiro. Assim que os prazos e audiências retomarem, faremos o agravo de instrumento em até 15 dias para garantir a subida do recurso e a análise em Brasília", afirmou Geraldo Vieira Simões, advogado do ex-deputado.

A reportagem também tentou contato desde a tarde de segunda, via ligações telefônicas, por email e Whatsapp, com dois advogados que representam a Igreja Universal, mas não obteve retorno até a publicação deste texto. A defesa de Marcelo Cirino Barbosa e Vanderson de Souza Vaillant não foi localizada. O espaço segue aberto para as devidas manifestações.

As irregularidades foram apuradas em investigação do Ministério Público do Espírito Santo (MPES), iniciada em 2009, e dizem respeito ao período entre 2002 e 2006, quando Robson Vaillant exercia mandato na Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales).

Segundo a condenação, servidores comissionados do gabinete eram obrigados a devolver parte dos salários, prática conhecida como “rachadinha”. Os valores eram repassados, principalmente, a Vanderson Vaillant ou ao então chefe de gabinete Marcelo Cirino.

Além disso, servidores pagos pela Assembleia atuavam, na prática, em atividades ligadas à Igreja Universal, onde Vaillant atuava como pastor, caracterizando desvio de finalidade do serviço público.

Depoimentos confirmaram irregularidades

O processo reuniu depoimentos considerados decisivos pela Justiça. Em um dos casos, uma servidora nomeada como técnica de gabinete afirmou, em depoimento, que não exercia atividades na Assembleia Legislativa, mas trabalhava como empregada doméstica no apartamento do deputado.

Ela relatou que seu cartão bancário ficava sob a posse do chefe de gabinete e que, embora o salário formal fosse de quase R$ 2 mil à época, recebia apenas R$ 600.

Outro depoimento apontou que uma servidora, oficialmente lotada no gabinete parlamentar, atuava exclusivamente em atividades internas da Central da Escola Bíblica Infantil (EBI) da Igreja Universal, embora fosse remunerada com recursos públicos do Legislativo estadual.

O que os réus alegaram nos recursos

Nos recursos apresentados ao TJES, os réus sustentaram diferentes teses para tentar reverter a condenação.

A defesa de Robson de Souza Vaillant alegou que não ficou comprovado o dolo, ou seja, a intenção de cometer irregularidades, e que a condenação violou princípios constitucionais, como o do devido processo legal. Também defendeu que as mudanças na Lei de Improbidade Administrativa deveriam levar à revisão mais ampla das punições.

Já Marcelo Cirino Barbosa argumentou que a condenação se baseou em provas frágeis e contraditórias, especialmente depoimentos, e sustentou que a decisão teria extrapolado os limites da acusação apresentada pelo Ministério Público. A defesa pediu o reexame das provas e a anulação da condenação.

No caso de Vanderson de Souza Vaillant, a defesa alegou ausência de provas suficientes para caracterizar enriquecimento ilícito e questionou a aplicação das sanções, afirmando que não houve comprovação de participação direta nos atos irregulares.

Por que o TJES rejeitou os pedidos

Ao analisar os recursos, o vice-presidente do TJES concluiu que as defesas pretendiam, na prática, o reexame de fatos e provas, o que não é permitido nessa fase do processo.

Na decisão, o desembargador destacou que o conjunto probatório já havia sido analisado pelas instâncias inferiores e sustentava, de forma consistente, a condenação. Por isso, aplicou as Súmulas 7 do STJ e 279 do STF, que impedem a rediscussão de provas em recursos aos tribunais superiores.

Nova lei reduziu multa, mas manteve punições

Durante o andamento do processo, a Justiça aplicou as mudanças da Lei 14.230/2021, que alterou a Lei de Improbidade Administrativa. Em setembro de 2024, o TJES reduziu a multa aplicada a Robson Vaillant de R$ 20 mil para R$ 10 mil, ao considerar que a nova norma era mais favorável ao réu.

Mesmo com a redução, a Justiça manteve as punições principais, por entender que o esquema de “rachadinha” caracteriza enriquecimento ilícito com dolo, conduta que continua prevista e punida pela legislação atual.

Condenação mantida

Com a decisão revelada no dia 19, antes do recesso do Judiciário capixaba, ficam mantidas as punições impostas aos réus.

Robson Vaillant, Vanderson Vaillant e Marcelo Cirino seguem condenados à perda da função pública e à suspensão dos direitos políticos por quatro anos. A Igreja Universal do Reino de Deus também teve mantida a condenação ao pagamento de multa civil de R$ 20 mil, por ter, segundo o processo, se beneficiado do trabalho de servidores públicos custeados pelo Estado.

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