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Peixe-leão: ameaça que pode chegar ao litoral do ES é vendida na internet

Peixe-leão: ameaça que pode chegar ao litoral do ES é vendida na internet

Espécie invasora, vinda dos oceanos Índico e Pacífico, não possui predadores naturais e se alimenta de diversas espécies, além de ser venenosa e perigosa para o ser humano

Publicado em 29 de julho de 2023 às 08:22

Ícone - Tempo de Leitura 8min de leitura
Peixe-leão pode representar risco à fauna e atividade pesqueira
Peixe-leão pode representar risco à fauna e à atividade pesqueira. (Volodymyr Burdyak/Freepik)
Felipe Sena
Estagiário / [email protected]

À primeira vista, alguns podem achar lindo, outros acharão feio e a maioria vai concordar que ele é, no mínimo, exótico. Um peixe que chama a atenção em um aquário. E isso o fez parar na casa de vários criadores. O peixe-leão é uma espécie típica dos oceanos Índico e Pacífico que chegou ao Oceano Atlântico, que banha o litoral brasileiro, onde consegue se alimentar de várias espécies, se reproduzir rapidamente e não tem nenhum predador natural, causando desequilíbrio por onde passa. Mesmo assim, é possível comprá-lo sem restrição pela internet por aqui.

A espécie foi introduzida no Atlântico pela região do Golfo do México, litoral dos Estados Unidos. Uma das hipóteses dos pesquisadores é o criador ter abandonado o bicho — como, infelizmente, é comum com vários outros animais domésticos. Nesse caso, entretanto, a introdução do peixe-leão em um ecossistema marinho diferente gera grande impacto ambiental e até econômico, na atividade pesqueira. No Brasil, ele já foi detectado no litoral do Nordeste e pode, a qualquer momento, chegar à costa capixaba.

O professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Agnaldo Silva Martins, que é doutor em Oceanografia Biológica, explica que a falta de um predador natural no litoral brasileiro faz com que o peixe-leão seja um problema.

"Ele se alimenta de muitos tipos de presa e não tem muita preferência. Como é uma espécie venenosa, supõe-se que talvez tenha dificuldade de ter um predador que se acostume a predá-lo. Então, existe o receio que ele se torne superabundante e venha a competir com outras espécies que já existem no ambiente", disse. 

De acordo com o Ibama, a importação é ilegal, ou seja, não é possível trazer a espécie de outro país. Mas caso o peixe seja encontrado e capturado na costa nacional, não existe nenhuma restrição à venda. "Como o animal está no mar, qualquer pescador pode pescar e vender, desde que tenha o Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP)", informou, por nota.

O órgão também alega que "a invasão biológica é um tema complexo que deve ser abordado por diversas instituições, e tais ocorrências devem ser relatadas na expectativa de que outros órgãos também atuem dentro de suas competências". Além disso, o Ibama afirma realizar uma série de estudos e trabalhos para conter a invasão no litoral do Brasil. A nota enviada pelo Ibama pode ser lida, na íntegra, no final desta reportagem.

O Ibama orienta que, caso alguém veja ou tenha informações sobre o peixe-leão no Brasil, repasse os dados através do Simaf (https://simaf.ibama.gov.br/), que é um sistema do instituto para registro de espécies exóticas invasoras.

Anúncio de venda do Peixe-leão em um marketplace. (Reprodução Internet)

Qual é o problema causado pelo peixe-leão?

Antes de falar sobre o problema, é importante entender o conceito de espécie invasora. Presas e predadores se organizam nos ecossistemas naturais. Quando um organismo fora dessa organização é inserido, existe o risco de um desequilíbrio ecológico.

Por exemplo: um animal grande come um animal médio, que, por sua vez, se alimenta de um animal pequeno. O ecossistema segue em equilíbrio até uma espécie invasora chegar e passar a se alimentar do animal pequeno e sem ser predado por nenhum dos maiores. Sem um predador, ele vai se multiplicando e acabando com o pequeno. A escassez de alimento fará com que o médio também comece a desaparecer. Consequentemente, o grande também, restando apenas uma superpopulação do invasor. 

É comum que espécies se tornem invasoras. "Ele não é a primeira espécie invasora marinha. Existem muitas assim, por causa da globalização. Mas essa é uma espécie que existe um temor particular, porque ele é um predador muito voraz", disse o professor Agnaldo.

O peixe-leão, no entanto, vem com uma série de complicadores a mais. Ele tem vários espinhos venenosos e, por isso, dificilmente encontra predadores na natureza. Por outro lado, se alimenta de várias espécies, sendo capaz de comer outros animais que tenham até o mesmo tamanho que ele. Tudo isso somado à sua grande capacidade de reprodução. 

"Faz parte da dieta dele pequenos peixes, formas juvenis, filhotes, peixes que podem ser recursos pesqueiros quando crescerem. Ele também pode eliminar espécies competidoras, reduzindo a biodiversidade. Também pode gerar acidentes com banhistas", alerta o cientista. Geralmente, o peixe-leão vive numa profundidade entre 60m e 100m. Porém, no litoral brasileiro, ele já foi encontrado em locais mais rasos, entre 4m e 2m de profundidade.

Agnaldo, no entanto, ressalta que essas são apenas possibilidades. Os reais impactos de uma chegada do peixe-leão ao litoral capixaba só serão conhecidos caso a espécie apareça por aqui.

O peixe-leão pode chegar ao Espírito Santo?

"Estamos apreensivos, esperando que ele não chegue aqui. Mas, se chegar, é um problema que vamos ter que lidar", disse Agnaldo. Existe a possibilidade do avanço da espécie pela costa do Brasil, como aconteceu no Golfo do México. 

"É uma espécie que tem o interesse da aquariofilia (prática de criar peixes em aquários). Em alguns lugares, é feita a criação. Provavelmente, foi introduzido pelos Estados Unidos. Houve algum tipo de acidente, não se sabe exatamente qual, em que o peixe escapou para o mar, para o ambiente natural, e se estabeleceu desde ali na costa do Golfo do México, na costa dos Estados Unidos e começou a se espalhar em direção ao sul", explica o professor Agnaldo.

Por isso, o especialista destaca ser fundamental que criadores não façam o descarte do peixe no ralo, córregos, rios e, principalmente, no mar. Também devem ter muito cuidado ao manusear o peixe para evitar qualquer tipo de acidente. 

Veja, abaixo, a nota do Ibama na íntegra

Inicialmente, é preciso esclarecer que peixe-leão (Lionfish) é o nome popular (nome comum) para os peixes marinhos do gênero Pterois spp.

A invasão biológica é um tema complexo que deve ser abordado por diversas instituições e tais ocorrências devem ser relatadas na expectativa de que outros órgãos também atuem dentro de suas competências;

A Lei complementar 140/2011 dispõe, em seu art. 7º, que compete à União controlar a introdução no País de espécies exóticas potencialmente invasoras que possam ameaçar os ecossistemas, habitats e espécies nativas;

Existem ainda uma série de normas nacionais e internacionais (CDB etc) que tratam das questões relativas as espécies exóticas invasoras;

No âmbito do MMA, existe um instrumento denominado: Estratégia Nacional para Espécies Exóticas Invasoras.

A Estratégia Nacional para Espécies Exóticas Invasoras é uma inciativa do Ministério do Meio Ambiente, instituída pela Resolução CONABIO 07/2018, que consolida diretrizes e decisões da Convenção sobre Diversidade Biológica - CDB aplicadas às diversas instâncias nacionais de governança ambiental. Ela estabelece, com clareza, o caminho para sua implementação, definindo ações prioritárias para gestão, prevenção, manejo e controle de espécies invasoras, referendadas por diversas esferas e setores de governo e da sociedade até 2030. A Estratégia Nacional foca espécies invasoras que ameaçam ou impactam a diversidade biológica e busca estabelecer a visão integrada entre os setores afetados em função de impactos, danos e prejuízos ambientais, sociais, culturais, sanitários e econômicos. Seu objetivo é orientar a implementação de medidas para evitar a introdução e a dispersão; reduzir impactos de espécies exóticas invasoras sobre a biodiversidade brasileira e os serviços ambientais e ecossistêmicos; e controlar ou erradicar tais espécies em território nacional.

Visando enfrentar a problemática da bioinvasão ocasionada pelo peixe-leão, o Ibama tem atuado em várias frentes no âmbito de suas competências, como por exemplo:

a) De forma proativa, desde 2014 o Ibama proíbe a importação desses animais para qualquer finalidade, mesmo a legislação permitindo a importação;

b) 05 espécies do gênero Pterois constam como proibidas a importação conforme registrado no Anexo III da PORTARIA Ibama Nº 102/2022 (Estabelece normas, critérios e padrões para exportação e importação de peixes de águas continentais, marinhas e estuarinas, com finalidade ornamental e de aquariofilia), sendo Pterois antennata, Pterois miles, Pterois radiata, Pterois sphex e Pterois volitans;

c) Em 2022, o Ibama instituiu um Grupo de Trabalho para atuar no problema do peixe-leão; O referido GT Peixe-leão tem a seguinte finalidade:

I - Formular proposta de ato normativo para fins de manejo do peixe-leão, Pterois spp.;

II - Articular junto aos Órgãos de meio ambiente e afins, bem como a pesquisadores especialistas em espécies exóticas invasoras a obtenção de subsídios aos trabalhos do GT;

III - Levantar informações e documentos técnicos de temas como biologia, dinâmica populacional e dados de pesca e comércio sobre a referida espécie; e

IV – Discutir a elaboração de plano de ação emergencial com vistas ao enfrentamento da bioinvasão;

d) já houve três reuniões de onde saíram alguns encaminhamentos, dentre eles:

e) E ainda, as Superintendências do Ibama em alguns estados têm atuado no tema em vários eventos, tais como:

1) O Ibama Ceara compõe o Grupo de Trabalho do Peixe-Leão no Ceará que inclui diversas instituições locais; além disso, o Ibama (Superintendência do Ceara) participou dos seguintes eventos:

I AUDIÊNCIA PÚBLICA : O PEIXE LEÃO,PERIGO AOS PESCADORES NO LITORAL CEARENSE 05/07/2022 Youtube

II A equipe do IBAMA-CE ministrou palestras e participou de uma mesa-redonda sobre o peixe-leão no IFCE/Acaraú (12847840); a equipe recebeu da Profa. Rafaela Maia seis espécimes de peixe-leão, que estavam congelados no seu laboratório no IFCE/Acarau-CE;

III O Ibama no RN também tem participado de reuniões locais que discutiram a problemática do peixe-leão no litoral do Rio Grande do Norte;

Não obstante, a área ambiental federal deve avançar na elaboração de uma Estratégia Nacional de Combate e Controle do Peixe-Leão Invasor, em conjunto com instituições com competência sobre o assunto, membros da comunidade científica e demais grupos da sociedade civil. A literatura científica aponta que o início de uma invasão biológica é momento o mais favorável para o estabelecimento de programas de detecção e controle, uma vez que quanto maior a população da espécie invasora em águas nacionais, que cresce em grande velocidade na ausência de predadores naturais, mis complexas e custosas serão as medidas necessárias.

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