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Tira-dúvidas: os direitos de donos de imóveis com problemas na estrutura

Tira-dúvidas: os direitos de donos de imóveis com problemas na estrutura

Especialistas em direito do consumidor explicaram o que a lei prevê para proprietários, inquilinos e vizinhos de imóveis com risco de segurança. Prédio em Vila Velha está interditado desde o dia 24 de janeiro com problemas estruturais

Publicado em 2 de fevereiro de 2021 às 20:23- Atualizado há 3 anos

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Equipe de engenheiros especialistas do Crea-ES foram ao bairro Nova Itaparica, em Vila Velha, para mais uma vistoria no prédio que apresentou instabilidades na estrutura, na madrugada de domingo (24/01)
Equipe de engenheiros especialistas do Crea-ES em vistoria no prédio que apresentou instabilidades na estrutura. (Ricardo Medeiros )
Luiza Marcondes
Repórter / [email protected]

Na madrugada do domingo, dia 24 de janeiro, um prédio no bairro Nova Itaparica, em Vila Velha, ameaçou desabar. O edifício Santos II, inaugurado em 2018, foi interditado pela Defesa Civil por problemas na estrutura e os moradores tiveram que deixar suas casas.

Nove dias depois da interdição, os moradores do prédio não sabem quando e nem se poderão voltar para casa. Sobram dúvidas sobre os direitos que eles têm enquanto consumidores diante dos transtornos e prejuízos. A situação é ainda mais grave considerando que, como mostrou A Gazeta, a prefeitura não encontrou registros de licenciamentos para a construção e nem autorização para habitação. Sem isso, os proprietários não conseguem fazer a escritura das unidades ou fazer a venda delas.

Para além deste caso específico, essas são dúvidas de muitos outros consumidores que compraram imóveis onde, posteriormente, foram identificados problemas estruturais. Para o especialista em Direito Civil e do Consumidor Luiz Gustavo Tardin existe na compra de um bem uma relação contratual que dá a ambos os lados direitos e deveres.

Nesta terça-feira (2), o especialista tirou dúvidas sobre o tema no quadro "Olho Vivo", na rádio CBN Vitória. Ele esclareceu, por exemplo, que um dos deveres da construtora ou incorporadora de um imóvel é entregar o produto com a segurança esperada. Se isso não acontecer, o consumidor tem duas opções:

Aspas de citação

Se é entregue um produto, no caso o apartamento, que depois de um tempo de uso tem problemas estruturais como aqueles que foram apresentados, isso dá ao morador, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, o direito de pleitear uma indenização ou exigir do construtor ou incorporador o conserto e reparo 

Luiz Gustavo Tardin
Especialista em direito civil e do consumidor
Aspas de citação

No caso de indenização, ele explica que ela pode ser integral, "o que compreende, por exemplo, o valor que [o cliente] pagou pelo imóvel e o custo que teve com escritura e registro, o ressarcimento por benfeitorias feitas, custos com condomínio ao longo do tempo, entre outros, além do dano moral".  (Veja o tíra-dúvidas completo no final da matéria)

ENTENDA O CASO

A interdição do prédio Santos II aconteceu depois que moradores escutaram fortes estalos e sentiram a estrutura ceder. O edifício foi evacuado pela Defesa Civil do município por segurança e, com isso, os moradores estão acomodados em hotéis pagos pela construtora responsável pela obra, a Santos. O caso é investigado pela Polícia Civil. 

A Prefeitura de Vila Velha informou que, além do prédio interditado, foram identificadas outras quatro edificações no entorno que são de propriedade da construtora Santos e que não possuem nem licença de construção e nem Habite-se, que é a certidão emitida após vistoria da obra pronta e que atesta que o imóvel pode servir como moradia. A prefeitura disse ainda que a empresa foi notificada e multada por todos os prédios em situação irregular.

O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo (Crea-ES) notificou a construtora com 19 autos de infração relacionadas a empreendimentos da empresa, que envolvem seis prédios no mesmo município. O conselho apontou que foram constatadas irregularidades como falta de responsável técnico, ausência das anotações de Responsabilidade Técnica (ART) dos projetos e exercício ilegal da profissão.

Já a Santos afirma que a construção do condomínio estava dentro da lei e que todas as obras possuem engenheiro responsável, projetos e responsabilidade técnica empresarial, com as devidas ARTs. Em entrevista para a TV Gazeta, a advogada da empresa, Márcia Nunes, disse que  a empresa tinha todas as autorizações do Crea e afirmou que a pandemia atrapalhou a regularização do Habite-se, mas que isso está em andamento. 

OS DIREITOS

Apesar dos proprietários não terem a escritura dos imóveis, a professora de Direito Civil Renata Paganotto assegurou que eles têm sim direito de exigir que a construtora repare os danos que sofreram. “Os compradores desses imóveis são compradores também de um serviço. A construtora tem o dever de entregar uma obra sólida e sem risco para os moradores. A situação deles é de muita vulnerabilidade”, disse em entrevista à TV Gazeta.

Luiz Gustavo Tardin destacou: "o artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor fala que o fabricante, produtor ou construtor responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação de danos causados aos consumidores por defeitos recorrentes de fabricação, construção, montagem, fórmulas, etc. E o mesmo artigo 12 coloca que o produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera".

O diretor-presidente do Instituto Estadual de Proteção e Defesa ao Consumidor (Procon-ES), Rogério Athayde, explicou ainda que o primeiro passo para a reparação dos proprietários será a divulgação do laudo da perícia que vai apontar o que causou os problemas na estrutura do prédio.

Equipe de engenheiros especialistas do Crea-ES foram ao bairro Nova Itaparica, em Vila Velha, para mais uma vistoria no prédio que apresentou instabilidades na estrutura, na madrugada de domingo (24/01)
Edifício Santos II foi interditado em Nova Itaparica, Vila Velha. (Ricardo Medeiros )

“Qualquer produto, quando adquirido, tem garantia de 90 dias. Isso em uma obra é uma rachadura, um azulejo que descola, problemas no piso, ou até de estrutura. Como se passaram dois anos, que é um prazo relativamente curto para um bem como um imóvel, é necessário que seja feito um laudo pericial para apontar o que causou esse problema, se foi algo estrutural ou causado por um morador, por exemplo”, diz Athayde.

O diretor do Procon ainda argumenta que o consumidor não pode ficar desassistido. Se provada a responsabilidade da construtora, os proprietários devem ser ressarcidos. Isso porque o artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor determina que tantos produtos duráveis quanto não duráveis que se tornem impróprios para o consumo a que se destinam - no caso dos apartamentos, não podendo mais serem usados como moradia - devem obrigatoriamente ser reparados pelo fornecedor no prazo máximo de 30 dias.

“Apesar de não terem a escritura, eles têm a propriedade e posse do imóvel. Se o laudo provar que houve falha da construtora, essa garantia do consumidor é reaberta e a empresa tem que reparar o dano no prazo máximo de 30 dias. Se não o fizer, os proprietários têm direito de exigir ou a substituição ou a restituição do valor, conforme for o acordo”, explica o diretor.

TIRA-DÚVIDAS

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    O advogado especialista em direito civil e do consumidor Luiz Gustavo Tardin explica que, se é entregue um produto, no caso um imóvel, e depois de um tempo de uso há problemas estruturais, isso dá ao morador, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, o direito de pleitear uma indenização ou exigir do construtor ou incorporador o conserto e reparo.

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    Sim. Segundo o advogado, pode ser pleiteado pelo consumidor o recebimento de uma indenização integral, que compreende, por exemplo, o valor que ele pagou pelo imóvel, custos com escritura e registro, com benfeitorias feitas e com o condomínio.

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    De acordo com o diretor do Procon-ES, Rogério Athayde, o primeiro passo é ter o laudo da perícia que aponte o que causou os problemas. O laudo também vai apontar a responsabilidade.

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    O advogado Luiz Gustavo Tardin explicou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem um entendimento que o consumidor pode exigir a reparação dentro da "razoável duração" daquele produto. "Então, o prazo não está limitado a 90 dias, nem cinco anos. Na verdade, a partir do momento que uma estrutura daquela venha a ruir ou apresente problemas estruturais, estando dentro de uma razoável duração, e não tendo apresentado a segurança que se esperava, o consumidor pode pleitear, se quiser, uma reparação, ou exigir o conserto do produto. Cada morador pode ver o que é mais interessante para ele e fazer esse pleito para a construtora ou incorporador".

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    Não. "Se o consumidor optar por exigir o conserto, isso ainda dá a ele o direito de ser indenizado, pelos danos morais e materiais, pelos prejuízos que teve, pela necessidade de evacuar imóvel, o transtorno que teve por conta disso", disse Tardin.

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    "Se ficar provado que o produto não tem conserto, não tem jeito. Todos os proprietários podem pleitear a indenização. Eles têm o direito de serem indenizados por todos os danos suportados, pela construtora, incorporadora e todos os fornecedores que participaram daquela construção", comentou o advogado.

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    O advogado lista duas opções processuais. "Mesmo que o morador obtenha uma sentença condenatória na reparação dos danos, a construtora e o incorporador vão responder e pagar com o patrimônio que eles dispõe. Se o CNPJ da construtora não tiver patrimônio disponível para fazer as indenizações, temos dentro do Código de Defesa do Consumidor um instituto chamado desconsideração da personalidade jurídica, que é a possibilidade de acionar os sócios e acionistas das construtoras." A outra opção é pedir o bloqueio de bens na Justiça para garantir os pagamentos. "Quem é prejudicado por situações como essa e teme que a construtora, incorporadora ou qualquer outro fornecedor não tenha patrimônio disponível, pode pedir, junto aos seus advogados, medidas de urgência para bloquear o patrimônio daqueles que vão reparar o dano para não ter que aguardar todo o trâmite do processo, que pode durar muitos anos, e no fim desse período a empresa não ter mais o dinheiro para pagar."

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    Sim. O especialista deixa claro que o inquilino também pode pedir uma reparação dos danos pelos transtornos que ele teve, como por desocupar o imóvel que estava habitando, o custo da saída, o novo aluguel, além de danos morais. Já o proprietário, além de poder pedir a reparação de danos no valor do imóvel, também poderia requerer, neste caso, o ressarcimento dos valores perdidos de aluguel. "É um dinheiro que ele deixou de lucrar com o apartamento que estava alugado e que também pode ser indenizado", frisou Tardin.

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    Sim. De acordo com Tardin, "se os vizinhos registrarem problemas em razão do risco de segurança e tiveram que deixar as suas residências por isso, eles são considerados consumidores por equiparação, pois também foram vítimas. Então eles recebem o mesmo tratamento no Código de Defesa do Consumidor e também podem pedir a reparação dos danos".

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    Segundo o advogado, se ficar caracterizado que houve desvalorização do imóvel em função dos problemas, esse consumidor pode ser ressarcido. "O dono que optou pelo conserto do imóvel e por refazer a obra vai ter direito a pleitear o valor correspondente a desvalorização, se ficar demonstrado que o imóvel desvalorizou mesmo".

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* Com informações da Rádio CBN Vitória

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