Publicado em 18 de janeiro de 2020 às 05:01
A situação previdenciária é um problema em todo o Brasil. Com déficits maiores ano após ano, União, Estados e municípios começaram a se movimentar para solucionar ou, pelo menos, diminuir essa adversidade. >
No Espírito Santo, dados do Tribunal de Contas (TCES) apontam que a situação é mais complicada em 14 municípios que não conseguiram reunir os recursos necessários para manter os sistemas próprios de aposentadoria. Nesses locais, há 52.467 servidores.>
O governo federal conseguiu, no segundo semestre do ano passado, aprovar a reforma da Previdência, que aumenta a alíquota que deve ser paga e o tempo de contribuição dos servidores federais e trabalhadores da iniciativa privada. Também determina uma idade mínima, entre outros fatores.>
Já no fim de dezembro, o governo do Espírito Santo conseguiu que sua proposta para os servidores estaduais passasse na Assembleia Legislativa. Basicamente, ela segue as leis que foram aprovadas em nível nacional. Agora, é a vez dos municípios.>
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Alguns já começaram a se movimentar, como Cachoeiro de Itapemirim e Viana - que já aumentaram a alíquota para os servidores municipais de 11% para 14%, com aprovação nas suas câmaras. Outros ainda precisam fazer as mudanças. Eles também precisam regulamentar a readaptação de servidores, transferir o pagamento de benefícios temporários, entre outras ações.>
Se não fizerem tais mudanças, podem perder o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), o que inviabilizaria a transferência de receitas voluntárias como empréstimos e convênios com os entes governamentais.>
Na prática, a perda do CRP vai fazer com que as prefeituras só possam receber os repasses constitucionais (como verbas para Saúde e Educação, por exemplo). Mas outros recursos como convênios para compra de veículos ou empréstimos para o início e conclusão de obras não poderão ser feitos.>
Entre os municípios que precisam se movimentar estão os que se encontram em situação crítica. Em Barra de São Francisco, por exemplo, o regime previdenciário da cidade tem R$ 1,37 milhão em caixa, quando deveria ter R$ 246,57 milhões - menos de R$ 0,01 para cada R$ 1 de dívida, segundo dados do Tribunal de Contas. >
Em situação semelhante estão outros nove municípios que possuem o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS): Alegre, Guaçuí, São Gabriel da Palha, Mantenópolis, Santa Leopoldina, Serra, Fundão, João Neiva e Aracruz. Em todos eles, a relação ativo/passivo atuarial (quanto dinheiro há em caixa e quanto seria necessário para pagar inativos) não passa de R$ 0,28 - quando o indicado era ter, pelo menos, R$ 0,70 para cada R$ 1 de dívida.>
As prefeituras em piores situações com relação à Previdência admitem que têm problemas e que algo precisa ser feito para mudar o cenário. Os 14 municípios foram procurados para comentar o momento financeiro que vivem - sete responderam e todos disseram, no mínimo, estudar as mudanças que devem ser feitas no sistema previdenciário. >
Os dados são de 2018, pois os relativos a 2019 ainda não foram compilados. Mas, segundo o Tribunal, a realidade não mudou de um ano para o outro. O cenário previdenciário é ainda pior em Mimoso do Sul, Cariacica, São José do Calçado e Vila Velha. Esses municípios possuem o RPPS e já fizeram uma segregação de massa, mas nem assim conseguiram deixar a relação ativo/passivo atuarial no nível adequado. Neste caso, a relação ideal passa a ser superior a R$ 1 para cada R$ 1 de dívida.>
Gilson Daniel
presidente da Associação dos Municípios do Estado do Espírito Santo (Amunes)A segregação de massa acontece quando o município vê que não tem capacidade financeira para pagar os aposentados num prazo de 35 anos. Então, são feitos estudos que separam os ativos dos inativos. Na prática, a prefeitura fica com duas folhas de pagamento - a de ativos e a de inativos. Enquanto isso, o regime próprio vai acumulando os valores para se tornar sustentável, explicou a secretária de Controle Externo do TCES, Simone Velten.>
Depois que é feita a segregação, o regime do município passa a ter duas classificações diferentes: Fundo Financeiro - que é pago pela administração municipal e possui um grande número de aposentados e pequena quantidade de servidores ativos; e Fundo Previdenciário - que é pago pelo regime próprio de previdência e apresenta um pequeno número de aposentados e muitos servidores na ativa.>
Em todo o Espírito Santo, existem 34 regimes próprios municipais. Desses, 12 já fizeram a segregação de massas e 22 ainda não precisaram fazer. De acordo com Velten, esses 22 municípios ainda podem optar pela segregação e ganhar um fôlego para o pagamento das aposentadorias. Mas, para isso, é preciso que haja um estudo de avaliação atuarial.>
Os 34 regimes próprios serão responsáveis, nos próximos anos, pela aposentadoria de 52.467 servidores municipais, segundo dados do TCES. E a situação de todos é preocupante, segundo o presidente da Associação Capixaba dos Institutos de Previdência (Acip), Wilson Paz. >
Nós estamos em ano eleitoral, um período em que é muito difícil fazer qualquer tipo de mudança que diz respeito ao servidor e à aposentadoria dele. E o tema é sensível. Quanto mais tempo você demora para aprovar a alteração nas regras, pior fica. O ideal é que essa reforma já tivesse vindo do Congresso também para as cidades. Mas, como não foi possível, agora os municípios precisam se movimentar, destacou.>
As mudanças devem ser feitas até julho, pelo previsto na lei previdenciária promulgada pelo Congresso em outubro de 2019. A dificuldade na aprovação das reformas, que devem passar pelas Câmaras de Vereadores, tem feito até alguns gestores cogitarem a exclusão dos regimes próprios - como aconteceu há alguns anos com Castelo e São Mateus, que tiveram seus RPPS extintos. Isso, porém, não é aconselhado pela Acip. >
Acabar com o regime próprio pode trazer problemas para a prefeitura, que vai ter que continuar pagando os servidores por um longo tempo. Fazer a segregação de massa, por sua vez, resolve o problema de forma imediata, mas empurra ele para administrações futuras. O mais indicado mesmo é fazer a reforma necessária para deixar os institutos financeiramente saudáveis, conclui o presidente da Acip. >
Contribuição para a previdência não era sustentável
A reforma da Previdência já veio um pouco tarde, porque a forma na qual o sistema previdenciário estava disposto anteriormente fazia com que os gastos tivessem uma natureza perdulária - gastava-se muito com previdência e a contribuição não era sustentável. O sinal de que uma mudança seria necessária já havia sido dado há muito tempo. Os municípios trilharam o mesmo caminho que foi percorrido pela União e pelos Estados - e só agora que a mudança está sendo feita. A gente sabe que as cidades estão numa situação previdenciária muito difícil e se você não conseguir gerar um equilíbrio entre a fonte de renda e a fonte pagadora, elas vão acabar aumentando o déficit. É importante que os municípios alterem o que for necessário para chegarem a um modelo sustentável e que garanta a manutenção do Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP) para continuar a receber os repasses federais
Alexandre Wernersbach, Diretor-presidente da Fundação de Previdência Complementar do Estado do Espírito Santo
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