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Bruno Funchal: 'Aterrissagem do auxílio é a expansão do Bolsa Família'

Bruno Funchal: "Aterrissagem do auxílio é a expansão do Bolsa Família"

Para secretário do Tesouro Nacional, equilibrar as contas e avançar com a agenda de reformas é fundamental. Segundo ele, alguns projetos devem ser votados pelo Congresso ainda neste ano

Publicado em 1 de dezembro de 2020 às 21:04

Bruno Funchal é secretário do Tesouro Nacional
Bruno Funchal é secretário do Tesouro Nacional Crédito: Antonio Cruz/Agência Brasil

Todos os sinais apontam para uma recuperação da economia em V, mas, para que o crescimento seja consistente, o país precisa reequilibrar as contas e avançar com a agenda de reformas. É esse o entendimento do secretário do Tesouro NacionalBruno Funchal, que acredita que projetos de lei importantes, que ficaram travados no Congresso pela pandemia do coronavírus, devem ser votados até o final de dezembro.

E assim como a questão fiscal, o problema social é outro aspecto que não pode ser esquecido pela equipe econômica. Para o guardião dos cofres do governo federal, o auxílio emergencial foi essencial para socorrer os mais pobres no momento da pandemia, porém, continuar com ele, não é algo economicamente viável. A esperança de melhorar renda dos mais afetados pela crise é o processo de retomada que tem se observado.

“Temos acompanhado vários dados novos, principalmente de atividade econômica. E todos os sinais, tanto em termos de arrecadação quanto de atividade do setor industrial, comércio, etc., são de recuperação em V. O único setor com recuperação mais lenta é o setor de serviços, mas também já tem mostrado melhora", destaca.

"A economia mostra uma forte recuperação depois da queda do início da pandemia. O cenário que está se construindo é positivo. As expectativas de queda do PIB hoje são de 4,55%. A previsão anterior era muito pior. E as previsões de crescimento para 2021 são boas. Nesse curto prazo, vamos ter uma retomada. O desafio será depois"

Bruno Funchal

Secretário do Tesouro Nacional

Funchal palestrará nesta quinta-feira (2) no lançamento do Anuário Espírito Santo da Rede Gazeta. A apresentação da revista e do site com dados e análises ocorrerá no Vitória Summit 2020, conferência híbrida, com atividades presenciais restritas a 80 convidados e painéis digitais para discutir os rumos da política e da economia no pós-pandemia.

De acordo com Funchal, melhorar a gestão fiscal é um dos principais desafios do país no momento. Os esforços para minimizar os efeitos da pandemia do novo coronavírus, como pagamento do auxílio emergencial, apoio à área da saúde, liberação de crédito, políticas de proteção ao emprego, e o socorro para Estados e municípios tiveram um custo alto.

O rombo aos cofres do Tesouro Nacional em 2020 é estimado em R$ 844,6 bilhões, sendo que, para este ano, o governo tinha autorização para registrar em suas contas um déficit primário de até R$ 124,1 bilhões. Isto é, a dívida pública federal cresceu 6,8 vezes além do previsto, e deve fechar o ano em cerca de 94% do PIB (Produto Interno Bruto).

Questionado se a situação poderia ser pior sem o auxílio emergencial – que foi aplicado principalmente em consumo –, o secretário do Tesouro destacou que o benefício teve sua importância na economia, mas esse nunca foi o objetivo principal.

“Vejo o auxílio como uma política muito importante, mas não para aumentar o PIB e sim para auxiliar as famílias que perderam a possibilidade de gerar renda e ficaram totalmente desassistidas. É uma política para proteção dos vulneráveis, e não para aumentar consumo, embora tenha acontecido.”

Funchal observa, entretanto, que, apesar de sua importância, o auxílio emergencial é uma política social cara, e o governo não vê espaço para estendê-lo ou oferecê-lo de forma permanente.

Diante disso, a expectativa é de que a página seja virada em 2021, caso a tendência de recuperação se mantenha. O governo, entretanto, trabalha em uma alternativa para atender à população vulnerável remanescente, sem comprometer os cofres públicos com gastos da mesma magnitude do auxílio ou outros programas sociais.

"Temos uma política social de aterrissagem para o ano que vem que é a expansão do Bolsa Família. O programa inclusive já teve o orçamento ampliado, de R$ 29 bilhões para mais de R$ 34 bilhões. É um aumento considerável, de cerca de 17%. E é um desenho que comporta essa transição – do auxílio de R$ 600 de abril a setembro, de R$ 300 dali a dezembro, até os R$ 190 mensais, aproximadamente, do Bolsa Família. Mais famílias na linha da pobreza vão conseguir entrar"

Bruno Funchal

Secretário do Tesouro Nacional
Secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal. Ele é ex-secretário da Fazenda do ES e também é professor de Economia da Fucape
Funchal era professor de Economia da Fucape Crédito: Ministério da Economia/Divulgação

Essas ações adotadas na pandemia poderiam causar um estrago na economia brasileira se elas continuarem?

  • Uma política feita para um momento de crise não pode se perpetuar. Estamos numa situação complicada, e se o déficit aumenta, a dívida aumenta, então a percepção de risco cresce e os juros também. Consequentemente, a atividade econômica contrai e o desemprego aumenta. A gente não tem condições de fazer esse tipo de política. E governo não faz PIB. Gasto do governo não gera crescimento sustentável, o que faz isso é trazer condições para investimentos, que incluem um cenário fiscal equilibrado.

O socorro pago pelo governo federal aos Estados e municípios foi uma boa medida?

  • Tivemos uma parte que era transferência, outra era suspensão temporária do pagamento de dívidas e a contrapartida que era o congelamento de salários de servidores. O modelo de pagamento fixo foi muito bom, pois gera previsibilidade tanto para Estados quanto para a União, e a obrigação de diminuição de despesas obrigatórias e congelamento do salário do servidores também foi positiva. Mas pode se discutir se foi acima do ideal. Se a gente observar a arrecadação dos Estados comparando 2020 e 2019, já estão com uma arrecadação 1% maior, desconsiderando a ajuda. Se adicionar os repasses e ajuda da União, fica 16% maior. Mas a União está em situação difícil. Até outubro, a arrecadação federal estava 11% abaixo comparada com 2019.

As reformas tributária e administrativa não aconteceram, apenas a da Previdência, e elas são urgentes. Como avançar com elas no Congresso?

  • Tivemos a votação da reforma de recuperação judicial, uma mudança no modelo do FGTS, que foi importante para trazer mais facilidade de saque, o Marco do Saneamento foi aprovado mais recentemente. Então, algumas coisas aconteceram entre o ano passado e este ano. Quanto às outras reformas, a primeira coisa a destacar é: elas avançaram. Isso é importante. Elas estão no Congresso. A da Previdência avançou em 2019, e em 2020, que a gente ia avançar com a administrativa e o pacto federativo, veio a pandemia. Não tivemos reformas estruturais, mas tivemos propostas importantes para a gestão da crise. Nos dedicamos a isso porque era necessário. Trabalhamos 24 horas, sete dias por semana. Mas agora que a situação começa a melhorar, queremos avançar com as outras reformas. Só precisamos entender como fazer andar dentro do Congresso. Tem timing político. Cada coisa tem seu tempo. Mas o importante é que estão no Congresso. Não tem mais nada dependendo do governo no momento.

O que precisa ser aprovado primeiro: a reforma administrativa ou a tributária?

  • Primeiro, temos que terminar o ano bem, ver o que tem um bom andamento na Câmara e no Senado. Para este ano, a previsão é que saiam ainda a independência do Banco Central, o marco da cabotagem – que é importantíssimo para o Espírito Santo, que tem vocação para isso. Também temos a Lei do Gás, que é algo que a bancada capixaba tem que ficar em cima, porque também beneficia muito o Estado. Isso é para 2020, no curto prazo. Para 2021, a previsão é voltar a andar com as outras reformas. Mas, entre administrativa ou tributária, a segunda é a que traria efeitos mais rápidos.

Na reforma tributária, a discussão da nova CPMF chegou mesmo ao fim?

  • Não sei, realmente. Está na comissão, mas não está tendo uma evolução. A primeira coisa é colocar as alternativas na mesa. Não podemos negar nada no primeiro momento. O principal é avançar num modelo que reduza a burocracia, reduza a complexidade do sistema tributário.

Existe saída para as contas públicas sem que o governo aumente a carga tributária?

  • Existe. O processo de consolidação fiscal, que é o ajuste das contas públicas, leva tempo, mas ajuda. A solução é pelo lado da melhoria da qualidade dos gastos, mas é algo mais lento, muito engessado. Outro caminho pode ser pelo aumento do crescimento econômico, que melhora a produtividade e eleva a receita. Isso tudo contribui para o equilíbrio das contas, e melhoria do ambiente de negócios.

Como avalia a situação fiscal e econômica do ES?

  • O Tesouro Nacional divulgou, inclusive, em agosto o boletim dos entes subnacionais, e o Espírito Santo se destaca. É um Estado com as contas bastante organizadas. Se você olha para os pares, como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, você observa que estão em situação frágil. E uma das coisas que o Espírito Santo tem feito de diferente é controlar a despesa com pessoal. Os outros não têm conseguido. Com isso, cria espaço para poupança, e pode investir e fazer políticas para a população. O cumprimento do teto de gastos também é importante.

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