Publicado em 9 de abril de 2020 às 20:17
Com os impactos econômicos negativos causados aos cofres públicos e ao orçamento da famílias para pôr em prática as políticas de combate ao coronavírus, muitos são os questionamentos sobre qual é a parcela de contribuição dada pela classe política durante a pandemia. No Poder Legislativo, por exemplo, além dos excelentes salários, os parlamentares dispõem de quantias consideráveis de recursos à disposição para o exercício do mandato. >
Por enquanto, a Assembleia Legislativa do Espírito Santo e a Câmara dos Deputados anunciaram medidas institucionais para a redução de algumas despesas, contratos e gastos. Mas as despesas com cota de gabinete e carros oficiais, por exemplo, não sofreram alterações. Cabe a cada parlamentar decidir se vai gastar todo o valor que tem disponível. >
Mesmo em caso de economia, já que a circulação com os carros diminuiu e não há emissão passagens, por exemplo, o dinheiro poupado não é repassado ao governo do Estado para poder ser utilizado nas ações de combate ao coronavírus. >
No caso da Assembleia, um ato do presidente Erick Musso (Republicanos) desta quarta-feira (8) determinou cortes que vão representar um contingenciamento de R$ 8 milhões. Houve suspensão e redução de contratos, de compras de materiais, equipamentos e obras, e também a suspensão do pagamento de benefícios aos servidores, como os adicionais de penosidade, periculosidade e insalubridade. O corte não afeta os salários-base dos parlamentares e servidores.>
>
A Assembleia deixar de pagar temporariamente algumas gratificações, que são adicionais ao salário, pois elas estão vinculadas ao exercício de atividades estritamente presenciais. A gratificação de penosidade, por exemplo, é paga aos motoristas, que recebem 25% ou 40% de adicional sobre o salário. Os servidores da segurança legislativa e recepção também recebem uma gratificação de risco de vida no valor de 40%. Outras funções também recebem insalubridade, de acordo com o grau, em 15%, 25% ou 40%. >
Esses R$ 8 milhões, contudo, não serão aplicados diretamente nas ações contra a pandemia. Segundo a Assembleia, esse recurso, e também aquilo que for economizado pelos deputados, fica no caixa do Legislativo, pois são destinados à manutenção do parlamento e só podem ser gastos pelo Poder Legislativo. No entanto, de forma indireta, a medida faz com que o governo consiga economizar nas suas obrigações, pois sua previsão orçamentária futura pode ser realocada.>
Questionada se iria repassar dinheiro ao Executivo de alguma forma, como por meio de superavit, por exemplo, a Assembleia afirmou que isso não ocorrerá. A Casa informou que não deve haver "sobra" de recursos para repassar ao governo, e que faz os ajustes para não precisar pedir suplementação, ou seja, mais recursos dos cofres do Tesouro.>
Há superavit quando recursos destinados ao Legislativo estadual em um determinado ano não são gastos em sua totalidade e voltam aos cofres do Estado. Mas depois o próprio governo pode destinar esse recurso de volta ao Legislativo, por meio de crédito suplementar, como ocorreu em 2019, por exemplo. O orçamento total da Assembleia em 2020 foi de R$ 225,1 milhões.>
As verbas de gabinete de R$ 3 mil por mês, a que cada um dos 30 deputados tem direito, não sofreram cortes. Elas representam uma despesa de R$ 1,08 milhão em 2020. O gasto continua a cargo de cada parlamentar, que pode utilizá-lo para itens que incluem gasolina, impressão de cópias reprográficas, diárias, postagens nos Correios, serviços de telefonia, material de gabinete e passagens aéreas. >
O recurso não é cumulativo, então aqueles que não gastam toda a quantia não podem resgatar o valor "economizado" para outra coisa. O valor não utilizado volta para o Orçamento Geral da Assembleia, para receber uma nova destinação.>
Com relação aos carros oficiais, sete deputados devolveram o veículo, desde o início da suspensão das atividades presenciais: Vandinho Leite (PSDB), Lorenzo Pazolini (Republicanos), Euclério Sampaio (DEM), Sergio Majeski (PSB), Bruno Lamas (PSB), Danilo Bahiense (PSL) e Erick Musso (Republicanos). >
Também não há gasto com os carros dos deputados Fabrício Gandini (Cidadania), Hércules Silveira (MDB), Emílio Mameri (PSDB) e Carlos Von (Avante), que abriram mão dos veículos a que têm direito desde o início do mandato. >
Neste caso, há uma economia provocada pelos deputados que abriram mão do veículo, pois barateia o contrato de locação. Para aqueles que devolveram o carro temporariamente, representa somente a economia com combustível. >
Dois deputados já protocolaram medidas para propor a redução de seus próprios salários na Assembleia. Uma delas, de Luciano Machado (PV), prevê a diminuição de 30% dos vencimentos dos deputados durante a pandemia. Assim, o salário, que é de R$ 25 mil, passaria para R$ 17,5 mil. O deputado Hércules Silveira (MDB) sugeriu um corte de 25%, o que faria chegar a R$ 18.750. >
Para serem aprovadas, as propostas precisam ser colocadas em pauta pelo presidente na próxima sessão virtual da Casa, que ainda não tem data para acontecer. >
O corte de gastos anunciado pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), será de R$ 150 milhões nos gastos. A determinação reduz as despesas de viagens nacionais e internacionais de servidores e deputados, horas extras e outros custos operacionais.>
No caso da Câmara, o dinheiro, na prática, poderá ser utilizado pelo governo. Isso porque o ofício da Câmara informa ao Tesouro Nacional que não utilizará este montante; assim, o valor pode ser realocado para outras finalidades.>
O orçamento total da Câmara, segundo a Lei Orçamentária Anual de 2020, é de R$ 6,2 bilhões. O corte não impacta nos salários de servidores e parlamentares. >
A portaria de Maia indica que R$ 43 milhões serão da área de pessoal, R$ 49 milhões de investimentos e R$ 58 milhões no custeio operacional. Com os efeitos do novo coronavírus, as sessões na Câmara são feitas remotamente. Os parlamentares participam por videoconferência e não há necessidade de deslocamento para Brasília.>
Segundo a assessoria da Câmara, ainda não foi previsto nenhum tipo de limitação à cota parlamentar. Para os deputados federais do Espírito Santo, o valor disponível é de R$ 37.423,91 por mês, que podem ser gastos com passagens aéreas, telefonia, serviços postais, manutenção de escritórios, alimentação, fretamento de carros, hospedagem, combustíveis, serviços de segurança, consultorias, entre outras despesas. >
O Senado ainda não anunciou nenhum tipo de contingenciamento interno, ou limitação para a cota de gabinete durante a pandemia. >
"Recursos economizados têm que ir para o combate efetivo à crise"
"A medida de corte de gastos pelo Poder Legislativo é importante, mas vejo que, por ser o Poder que é eminentemente político, deveria fazer um esforço maior de economia. No caso da Assembleia, se a economia feita não pode ser destinada para uma ajuda efetiva na crise, isso tem que ser mudado. Os deputados poderiam estudar a medida jurídica que alteraria isso, para que o dinheiro economizado possa ir para o Executivo gastar nas ações do coronavírus. A economia anunciada é de quase 4%, e penso que poderia ser ainda maior. É hora de rever contratos, gastos, já que a atividade presencial vai continuar diminuída por um período longo de tempo. Seria interessante que todos os Poderes passassem um pente-fino enorme nos seus orçamentos, e verificassem a possibilidade de reduzi-los ao máximo. Além disso, os Estados vão precisar pressionar ainda mais o governo federal, que é quem tem a responsabilidade fundamental do enfrentamento da crise. E para que os Estados possam ter autoridade ético-política, precisam dar exemplo. Para além das medidas emergenciais, temos que pensar no mundo pós-Covid. Me parece que ele vai cobrar muito mais responsabilidade dos agentes públicos e privados. A crise está nos ensinando a importância do poder estatal. As pessoas vão cobrar um poder público eficiente, que tenha planejamento, instrumentos efetivos de ação".
Coronavírus
Rafael Simões - Professor da UVV, mestre em História Social das Relações Políticas>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta