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Projetos de capixabas sobre direitos LGBT+ são poucos e não saem do papel

Projetos de capixabas sobre direitos LGBT+ são poucos e não saem do papel

Nas últimas duas décadas, apenas 12 propostas foram apresentadas na Assembleia Legislativa e no Congresso, nenhuma delas foi aprovada. Há ainda projetos que tentam excluir direitos desta população

Publicado em 27 de junho de 2020 às 07:00

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Atualmente, seis propostas de parlamentares capixabas tramitam no Congresso e na Assembleia. Duas delas violam direitos LGBT+
Até hoje, não houve aprovação de nenhum projeto de lei de autoria capixaba que garanta direitos a população LGBT+. (Freepick Imagens)

Cinquenta e um anos após os protestos de Stonewall, em Nova York, que deram origem ao Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer, pessoas intersexo, assexuais e outros) , comemorado neste domingo (28), minorias sexuais e de gênero em todo mundo ainda lutam pelo reconhecimento de suas demandas. O Legislativo brasileiro, contudo, pouco tem contribuído para mudar essa realidade.

No Espírito Santo, a atuação dos parlamentares para garantir os direitos da população LGBT+ é pequena. Até hoje, não houve aprovação de nenhum projeto de lei de autoria capixaba com esse objetivo no Congresso Nacional ou na Assembleia Legislativa do Espírito Santo.

A única iniciativa aprovada no Legislativo estadual partiu do governo, com a Criação do Conselho Estadual LGBT, em 2016.

Os registros da Assembleia e da bancada capixaba no Congresso mostram que, nas últimas duas décadas, 12 propostas (confira no fim da reportagem) foram apresentadas, sendo que cinco delas buscaram retirar e não garantir direitos. Atualmente seis projetos de lei estão tramitando no âmbito federal e estadual. 

Para o levantamento, feito nos portais das Casas Legislativas, a reportagem de A Gazeta utilizou os termos LGBT, homossexuais, homossexualidade, transexual, gay, homofobia. Não foi delimitado período de tempo.

O projeto mais recente é de autoria da senadora Rose de Freitas (Podemos) e criminaliza a homofobia. Protocolado em 2019, o texto enquadra atos homofóbicos e transfóbicos na Lei 7.716/89, como crimes de racismo. “Essa discriminação que presenciamos são muitas vezes denunciadas e não tem penalidade prevista. A lei vai punir manifestações de ódio, preconceito e intolerância”, destacou a senadora.

Tanto na Assembleia quanto no Congresso, poucos propostas foram apresentadas por parlamentares capixabas em benefício da população LGBT+
Tanto na Assembleia quanto no Congresso, poucos propostas foram apresentadas por parlamentares capixabas em benefício da população LGBT+. (Freepik/Arte A Gazeta)

A proposta foi apresentada depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou a criminalização da homofobia no ano passado, criticando a omissão do Congresso a respeito do tema.

Também no Congresso Nacional, tramita um projeto, do deputado federal Sérgio Vidigal (PDT), que proíbe o tratamento discriminatório para doadores de sangue. O texto, de 2015, impede que questionamentos a respeito da orientação sexual do doador sejam feitas no cadastro. “É algo extremamente discriminatório e que não pode ser permitido na sociedade atual”, declarou.

O tema também foi julgado recentemente pelo STF, que derrubou normas que impediam homossexuais de doarem sangue. O projeto de Vidigal foi incorporado a outro, da deputada Laura Carneiro (DEM/RJ), em tramitação desde 2003, que torna crime rejeitar doação de sangue devido à orientação sexual, com pena de reclusão de um a três anos. O texto aguarda votação no plenário.

Na Assembleia Legislativa, tramita desde o ano passado uma proposta de autoria do deputado Fabrício Gandini (Cidadania), que estabelece punições administrativas a estabelecimentos e agentes públicos que discriminem pessoas por causa da orientação sexual, ou seja, que tiverem atitudes homofóbicas. Entre as sanções previstas estão a cassação de licença do estabelecimento e aplicação de multa no valor aproximado de R$ 3.500.

A última movimentação do projeto de Gandini é de agosto do ano passado, quando a deputada estadual Janete de Sá (PMN) foi designada relatora. Propostas similares viraram lei em outros Estados e municípios, como São Paulo.

A IMPORTÂNCIA DE LEGISLAR CAUSAS LGBT+

Em um país como Brasil, onde mais se mata LGBTs, legislar em benefício dessa população é essencial. De acordo com a advogada e presidente da Comissão de Diversidade da Ordem dos Advogados do Brasil – seccional São Paulo (OAB-SP), Marina Ganzarolli, as leis dão legitimidade democrática às demandas das minorias e são atos de defesa da existência delas.

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Vivemos em um país recordista em crimes de ódio, com transexuais que têm uma expectativa de vida extremamente baixa, sem acesso a emprego e educação. É preciso combater a violência e a marginalização em que essa população está submetida. A gente começa a construir isso por meio de leis que vão assegurar direitos fundamentais e proteção. São formas de se reconhecer a existência de uma população e suas necessidades e nela inclui-se os LGBTQIA+. É papel do Legislativo certificar que todas as pessoas sejam tratadas de forma igual no país

Marina Ganzarolli
Advogada e especialista em Direito das Minorias
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Muitos parlamentares, contudo, têm se omitido do debate e pouco contribuído com proposições. Isso acontece principalmente no âmbito estadual. Segundo a advogada e desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) Maria Berenice Dias, há várias demandas que carecem atualmente de regulamentação.

“É importante notar que diversas leis para assegurar direitos a essa população podem ser propostas, como a criação de serviços e canais específicos de atendimento às minorias. Cabe aos Estados e municípios medidas de combate à homofobia com aplicação de multas, por exemplo, regulamentação da aposentadoria de transexuais, do uso de banheiros de acordo com a identidade de gênero, garantia da utilização do nome social.”

Apenas leis, contudo, não são suficientes para garantir os direitos da população LGBT. Para o presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Gênero da Ordem dos Advogados do Brasil – seccional Espírito Santo (OAB-ES), Hiago Rocha, o combate à opressão requer a adoção de diversas políticas públicas.

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Ter direitos assegurados pela lei não significa sair de uma situação de vulnerabilidade. A gente não pode pensar que apenas leis são fundamentais na nossa luta, políticas sociais precisam ser aplicadas e ampliadas. O racismo está criminalizado há mais de 30 anos e nós continuamos uma sociedade extremamente racista. Enfrentar a opressão contra os LGBTQI+ vai muito além da legislação, é preciso falar de política, de economia, da ocupação de espaços culturais

Hiago Rocha 
Presidente da Comissão de 
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PROJETOS DE LEI BUSCAM EXCLUIR DIREITOS

Além do número reduzido de iniciativas protocoladas nos Legislativos favoráveis à população LGBT+, projetos que propõem excluir ou violar direitos já conquistados têm se multiplicado nas Casas.

Na Câmara dos Deputados tramita um projeto de lei, apresentado em 2019 pela deputada federal Soraya Manato (PSL), que altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. O texto acrescenta uma nova hipótese para anulação de casamento: casos de redesignação sexual em que não houve conhecimento prévio de um dos parceiros.

Para Hiago Rocha, da OAB-ES, a proposta desrespeita os direitos fundamentais das pessoas transexuais, querendo obrigá-las a se identificar com um gênero que não as representa.

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As trans merecem proteção e tantos direitos civis quanto qualquer outra pessoa, como o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à dignidade. Ninguém é obrigado a dizer com qual órgão sexual nasceu. Afinal de contas, se no processo de constituição da família esse fato foi insignificante até o momento do casamento, como pode vir a ser depois?”

Hiago Rocha 
Presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Gênero da OAB-ES
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Para Soraya Manato, o projeto não é preconceituoso. “O matrimônio é uma troca de confiança. Isso é um requisito mínimo para que uma relação amorosa dê certo”, afirmou.

A proposta aguarda designação de relator na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara.

Outro projeto de lei polêmico tramita na Assembleia Legislativa. De autoria do Capitão Assumção (Patriota), a proposta apresentada neste ano estabelece o sexo biológico como único critério para definir o gênero dos competidores em eventos esportivos no Estado. O texto obriga pessoas transexuais a disputarem campeonatos em equipes de gênero que elas não se reconhecem.

“Tirar direito de uma trans competir na categoria da sua identidade de gênero não implica em vantagem. O que é preciso fazer para viabilizar isso é o estabelecimento de parâmetros hormonais”, argumentou Hiago.

O projeto do Capitão Assumção aguarda parecer jurídico da Assembleia. “Geneticamente só existe homem e mulher, e a performance no esporte é uma questão de genética. Temos que pensar na igualdade do ser humano e não das minorias”, declarou o deputado.

Confira as 12 propostas apresentadas até hoje pelos parlamentares capixabas:

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