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Outdoor de turma de 1978 da Ufes em apoio a Bolsonaro divide médicos

Outdoor de turma de 1978 da Ufes em apoio a Bolsonaro divide médicos

Parte do grupo de médicos, que estudaram juntos na universidade, decidiu fazer uma publicação em defesa do presidente. Placa causou incômodo aos não bolsonaristas

Publicado em 3 de setembro de 2020 às 19:15

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Outdoor de médicos em apoio a Bolsonaro, próximo a Terceira Ponte, em Vila Velha
Outdoor de médicos em apoio a Bolsonaro, próximo à Terceira Ponte, em Vila Velha. Um dos apoiadores se arrependeu de ter contribuído para a peça e pediu para ter o nome apagado. (Hélio Moraes)

Um outdoor instalado nesta semana na avenida que dá acesso à Terceira Ponte, em Vila Velha, para manifestar apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em nome da turma de Medicina de 1978 da Ufes, gerou incômodo entre os médicos integrantes do grupo. Na turma, que é composta por 55 pessoas, 19 médicos endossaram e assinaram a divulgação, enquanto uma parte preferiu não registrar os nomes na peça e outra foi contrária, por não apoiar Bolsonaro. 

A turma de 1978 é conhecida por ter sido a que refundou o Diretório Acadêmico de Medicina na Ufes, que foi o primeiro a reabrir durante a ditadura militar. Também esteve envolvida no retorno do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da universidade naquele período, que teve como 1º presidente o ex-governador Paulo Hartung (sem partido), então estudante de Economia.

A instalação do outdoor foi discutida por cerca de dois meses no grupo de WhatsApp da turma, por iniciativa do médico cardiologista Hélio Monteiro de Moraes. Durante os debates, uma parte dos médicos chegou a pedir que a mensagem não fosse colocada em nome de toda a turma, formada há 41 anos. 

Por conta disso, segundo Moraes, sugeriu-se que no outdoor não estivesse escrito "Os alunos da turma de 78 apoiam Bolsonaro", e sim, "Alunos da turma de 78 apoiam Bolsonaro", com a assinatura dos apoiadores. Foram somente eles que também custearam a implantação do outdoor, que ficará no local por um mês. Um dos signatários, contudo, se arrependeu de expor o nome e pediu para apagá-lo. Assim,  o primeiro nome da lista está coberto por uma tarja branca.

Alguns integrantes da turma, mais identificados com a esquerda, teriam saído do grupo, por conta da discussão do outdoor. O organizador Hélio Moraes nega. "Ninguém saiu do grupo por causa disso. Algumas pessoas já tinham saído por outras discussões, pois temos muita participação política. Mesmo aqueles que não apoiam Bolsonaro respeitaram", disse. Entre os apoiadores, há médicos que hoje moram fora do Estado e também fora do país.

Segundo Moraes, a ideia de publicar o posicionamento de parte da turma em um outdoor foi uma forma de dar apoio público e explícito a Bolsonaro. A escolha por publicá-lo nesta semana levou em conta, inclusive, a "Semana da Pátria". 

"Sempre discutimos como podemos ajudar o presidente de alguma maneira.  A gente sente que é um presidente honesto, que faz um governo tentando acertar, e as ações do governo dele têm o apoio da maioria da turma. Mas, nos últimos tempos, temos visto ele ser muito atacado pelo STF, pelo Congresso, pela imprensa e decidimos nos manifestar. Eu catalisei o espírito da turma", contou.

Em meio à pandemia de Covid-19, Bolsonaro tem dado declarações e adotado atitudes contrárias às orientações de médicos infectologistas, desencorajando, por exemplo, o uso de máscaras e a manutenção do distanciamento social. Repetidamente, o presidente minimiza a doença, que já foi chamada por ele de "gripezinha". A  Covid-19 já matou mais de 120 mil pessoas no país em poucos meses. Para Hélio Moraes, no entanto, o presidente tem sido "injustiçado" ao receber críticas. 

O médico Darly Vervloet foi um dos integrantes da turma de 78 que concordou com a publicação do outdoor. "Pela situação política do país, da dificuldade que vemos para ele governar, com todos os lados tentando impedir. Em conversas no grupo, vi que a maioria era pró-Bolsonaro. Participei pouco, mas concordei e entrei", contou.

"A MAIORIA NÃO ASSINOU"

Um dos médicos da turma que conversou com A Gazeta, e pediu para não ser identificado, explicitou descontentamento com a atitude. "A maioria não assinou. Os petistas foram muito desrespeitados e saíram do grupo. Eu fiquei no grupo para fazer provocações intelectuais e também para conhecer essa nova direita. O pessoal está muito agressivo nas discussões", disse.

Outdoor de médicos em apoio a Bolsonaro, próximo a Terceira Ponte, em Vila Velha
Outdoor de médicos em apoio a Bolsonaro, próximo a Terceira Ponte, em Vila Velha. (Hélio Moraes)

O também médico Fernando Herkenhoff, conhecido por ter sido ex-militante do PCB no período da faculdade, considerou que foi feita uma exposição equivocada, mas diz que reconhece a legitimidade da manifestação.

"O grupo é da turma, quase todos estão presentes e como todos os grupos de todas as turmas, e famílias, tem uma polarização. O país está muito polarizado. Fui convidado para participar, e manifestei a minha discordância, pois não apoio o governo Bolsonaro. Não sei se esta é a melhor forma de manifestar o apoio ao governo, eu publicamente não apoio, mas reconheço o direito deles", afirmou. 

Ele pontuou que a turma possui um engajamento histórico na política. "Foi uma turma que teve uma participação na redemocratização do país, apostamos no MDB como via democrática para derrotar a ditadura militar. Defendíamos uma política de respeito à democracia", contou.

Hélio Moraes avaliou que a situação não gerou incômodo. "Fiz a proposta, demos a oportunidade de todos falarem. Os contrários não falaram nada, silenciaram. Somente uma pessoa nos pediu para ser explícito e mostrar que não é a opinião da turma toda. O outdoor não é agressivo com ninguém, nem é mentiroso."

"GUERRA DE OUTDOORS"

Desde julho, uma "guerra" política de outdoors tomou conta de ruas e avenidas da Grande Vitória e até mesmo do interior do Espírito Santo. Há peças contra e a favor do presidente, a maioria sem pedir voto ou fazer ataques.

As peças a favor do presidente têm sido financiadas por pessoas e movimentos de direita no Estado. Há envolvimento também de pré-candidatos às eleições municipais. Já para os outdoors contra o presidente o financiamento também vem de um movimento articulado. No Estado, algumas peças foram pagas por um sindicato nacional de servidores.

Há também episódios de vandalismo tanto contra as peças pró-Bolsonaro quanto em relação às que são críticas. Pelo menos três casos foram registrados no mês de julho. A lei prevê punição para esse tipo de atitude.

Um dos outdoors instalados em Vitória, financiado até por políticos, também usou a imagem de Bolsonaro para fazer propaganda da hidroxicloroquina, remédio sem comprovação científica para o tratamento da Covid-19. A prefeitura, baseando-se no Código Sanitário Municipal e em uma resolução da Anvisa (96/2008), mandou retirar.

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