A eleição municipal já é neste domingo (15), mas ainda tem eleitor que não decidiu em quem vai votar. Os "indecisos de última hora" relatam dificuldade para escolher um nome e apontam, entre as principais frustrações, o excesso de candidatos com propostas genéricas e pouca divulgação de candidaturas menos conhecidas. Muitos pretendem pesquisar e escolher em quem votar apenas nas últimas horas. Outros, porém, cogitam anular o voto.
A pandemia do coronavírus também impactou na tomada de decisão. Apesar das campanhas insistirem na estratégia tradicional de rua, com carreatas e passeatas, alguns eleitores afirmam que não se sentiram tão próximos dos candidatos, deixando mais difícil o diálogo entre quem disputa os votos e a comunidade.
A estudante Adrielly Silvino, de 23 anos, é uma das que relatam que sentiu a campanha mais "distante". Moradora do bairro São Conrado, em Cariacica, ela não se sente representada por nenhum dos 14 nomes que disputam a prefeitura e acredita que vai "acabar não votando em ninguém."
"Eu acho que faltou divulgação, não sei se por conta da pandemia. Acho que faltou conversas com os moradores, batendo de porta em porta, um contato mais próximo. Pode ter sido pela pandemia, mas eu acho que foi uma campanha distante", afirma.
Lizandra Portela, moradora do bairro Flexal I, também em Cariacica, concorda. Ela trabalha na avenida Expedito Garcia, um dos principais endereços que recebe carros de som e passeatas durante o período eleitoral, por abrigar uma grande parcela de comerciantes do município. Ela relata que viu "muita gritaria, promessas de melhorar Cariacica, mas sempre dos mesmos candidatos e nunca um diálogo com a comunidade."
O sentimento é o mesmo de Kezzia Jansen, de 26 anos, que mora em Serra Sede. A empresária admite que não acompanhou de perto a campanha, mas, pelo que viu em redes sociais, sentiu falta de mais divulgação dos candidatos a prefeito. "A briga na Serra é muito forte entre dois nomes e eu senti falta de ver campanha dos outros candidatos, mesmo os que têm nomes fortes e já são políticos, vi pouco", pontua.
Em Vila Velha também. Gabriel Lima, de 28 anos, relata que viu propaganda de poucos candidatos, sendo que o município conta com 11 nomes na disputa. "Eu acho que falta propaganda política, não estou ouvindo muito da maioria dos candidatos. Tudo que eu vi era do prefeito ou de outros candidatos mais ricos que pagam para colocar divulgação na rua", relata. Ele relatou que não conhece a maioria dos candidatos.
Guardas municipais armadas, construção de mais hospitais e até implantação de escolas militares. Esses são alguns dos pontos em comum nas promessas de candidatos que concorrem ao cargo de prefeito em todas as cidades da Grande Vitória. Alguns eleitores, no entanto, não gostaram do que foi proposto pelos candidatos. Entre as reclamações mais recorrentes dos indecisos está a de que as propostas apresentadas pelos candidatos são genéricas e parecidas.
É o principal fator de indecisão, por exemplo, para o servidor público Guilherme de Souza, de 36 anos. Morador do bairro São Diego, na Serra, Guilherme afirma que ouviu muito sobre "investir em educação e infraestrutura", mas pouco do que será feito, de fato, para isso.
Para a guarda portuária Desirée DAvilla dos Santos, de 41 anos, moradora no bairro Inhanguetá, em Vitória, o problema das propostas vai além de serem genéricas. Para ela, algumas das ideias apresentadas fogem da realidade.
Eu acho que faltam propostas reais e possíveis. São coisas que a gente sabe que são muito difíceis de serem realizadas porque o prefeito não age sozinho, ele depende de um bom diálogo com a Câmara de vereadores por exemplo. Propostas mais reais e mais próximas da realidade do povo. É o que falta, pontua.
Desirée lamenta, também, que o momento de propaganda eleitoral tenha se tornado "uma novela mexicana" com candidatos se atacando. "A guerra que se instalou atrapalha as pessoas que acreditam muito no que veem na TV, nos candidatos. Pessoas que não entendem que é um palco, virou um monte de personagem montando aquela briga toda. E enquanto isso, nada de propostas reais", opina.
Em todos os municípios foi possível registrar ataques entre concorrentes, mas em Vitória, dois dos candidatos que estão na dianteira das pesquisas travaram uma verdadeira guerra de acusações e provocações, principalmente durante o tempo de propaganda eleitoral na TV.
Apesar da dificuldade, no entanto, Desirée pretende estudar nessa reta final para escolher um candidato. Diferente de quem cogita anular o voto, ela quer escolher alguém em quem, de fato, acredita.
Na cidade canela-verde, Matheus Gomes, de 24 anos, sente falta de propostas voltadas para pautas sociais. Entusiasta da política, o jornalista tem interesse de conhecer o plano de governo dos candidatos. "Eu realmente leio os panfletos que recebo", conta. Para ele, os candidatos que despontam nas pesquisas tem trajetórias políticas e propostas muito parecidas e, por isso, "falta pluralidade, independente do espectro político."
O fim das coligações para eleição de vereador teve como consequência uma explosão de candidaturas. Sem a possibilidade de concorrer em blocos, os partidos foram obrigados a lançar uma chapa completa de candidatos ao Legislativo e, por isso, manter um candidato a prefeito se tornou mais importante para "puxar voto" e dividir palanque. O resultado foi uma eleição com recorde de candidaturas pelo Estado.
Cariacica, por exemplo, foi de quatro candidatos em 2016 para 14 em 2020. Lizandra e Adrielly sentiram a diferença. Ambas reclamaram que, com o número alto de candidatos, se tornou praticamente impossível "conhecer a proposta de todos."
Mas não só as candidaturas para prefeitura aumentaram. O excesso de candidaturas para vereador também foi notado pelos eleitores. Na Serra, por exemplo, são 748 candidatos a vereador e 23 vagas, ou seja, são 32,5 candidatos por vaga. Para Kezzia, o cenário fica "bagunçado" e a sensação é a de que seria preciso mais obstáculos para lançar candidaturas.
"Parece que qualquer um virou candidato a vereador, tem muitos e as vezes com propostas que nem fazem sentido. Não trazem coisas reais que vão mudar! Não tem como todos esses candidatos terem estudado, entendido o que é a função e o que de fato a cidade precisa. Como não tem critério para ser candidato, todo mundo está tentando e nem todos pensando no que realmente importa", aponta.
O que mais pesa para Lizandra, de Cariacica, não é nem as propostas e nem tanto o excesso de candidatos, embora ela admita que isso também causou dúvidas. Ela tem um candidato com quem simpatizou, mas ainda não bateu o martelo por acreditar que "ele não tem chances reais de vencer". Ela se preocupa com o que é conhecido como voto útil.
O que tem me atrapalhado é que quem eu acho que é bom não tem chance nenhuma de ganhar. E os candidatos que estão na frente eu não concordo. Meu problema de indecisão é que não quero desperdiçar meu voto. Estou em dúvida se voto com o coração ou voto pensando no útil, relata.
O medo dela e de Gabriel Matosinhos, de 28 anos, morador de Bento Ferreira, na Capital, é ter um segundo turno com duas opções que eles não queriam de jeito nenhum. Os dois municípios terão 2º turno por terem mais de 200 mil eleitores, se nenhum candidato obtiver mais de 50% dos votos válidos.
O "voto útil" pesa muito para o programador. Há cerca de oito anos ele procura estudar todos os candidatos e seus planos de governo para escolher algum. Para decidir, no entanto, também pensa de forma prática: traça uma estratégia voltada para não eleger quem não acredita.
A gente não pode votar apenas considerando o que candidato que a gente quer. Tem que pensar no candidato que a não quer e quem, de fato, tem chance de impedir que aquela pessoa vença. O que pesa pra mim é meu voto ser útil, se não acaba sendo um voto nulo, afirma.
A intenção da reforma política ao proibir as coligações para vereadores era frear a proliferação de partidos políticos no Brasil, mas o cenário de recorde de candidaturas confirma que o plano não deu muito certo. É o que diz o cientista político Fernando Pignaton ao analisar as queixas dos eleitores capixabas que ainda estão indecisos.
O Brasil tem mais de 30 partidos políticos. Para o especialista, o alto número acaba pulverizando as candidaturas e enfraquecendo as instituições partidárias. O voto é dado para um candidato e não para uma legenda, assim, se elege "pessoas e não propostas e ideologias".
"Sem partidos fortes para estruturar as candidaturas, construir o caminho político de pessoas capacitadas e dentro de padrões ideológicos, as campanhas ficam muito fragmentadas. As siglas lançam nomes só para cumprir cotas e por isso, existem os candidatos aventureiros", assinala.
Pignaton também acredita que a pandemia foi responsável por dificultar a entrega das informações. "É muita informação para ser assimilada em um curto espaço de tempo e em um cenário de pandemia", pontua.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta