Publicado em 3 de abril de 2020 às 18:35
Após dias contrariando publicamente as orientações do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, sobre a melhor forma de evitar a propagação do coronavírus, nesta quinta-feira (2) o presidente Jair Bolsonaro disse que falta "humildade" ao ministro e, embora tenha afirmado que não pretende dispensá-lo "no meio da guerra", ressaltou que ninguém é "indemissível" em seu governo. >
O protagonismo de Mandetta diante da crise envolvendo a pandemia do coronavírus já vinha incomodando o presidente há algum tempo, o que fica demonstrado também na falta de sintonia dos discursos dos dois, desde 17 de março, semana em que foram tomadas as primeiras medidas. O próprio Bolsonaro resumiu: "A gente está se bicando há algum tempo".>
A principal divergência entre Bolsonaro e Mandetta é sobre a questão do isolamento social. Enquanto o presidente defende flexibilizar medidas como fechamento de escolas e do comércio para mitigar os efeitos na economia, permitindo que jovens voltem ao trabalho, Mandetta tem mantido a orientação para as pessoas ficarem em casa. A recomendação do ministro segue o que dizem especialistas e a Organização Mundial da Saúde (OMS). >
Veja alguns episódios que mostraram as divergências entre o Ministro da Saúde e o presidente da República.>
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Após ter recomendado em sua transmissão semanal do dia 12 de março, ao lado do ministro da Saúde, que protestos fossem adiados para frear o vírus, no dia da manifestação, 15 de março, o presidente desceu a rampa do Palácio do Planalto e tocou nas mãos de dezenas de militantes, pegou os celulares deles para tirar selfies, balançou bandeiras e faixas dadas pelos seus apoiadores. Tudo isso sem nenhuma proteção individual, como máscara ou luvas.>
Após a aparição pública do presidente, quando ele já era fortemente criticado, Mandetta declarou que as aglomerações eram um "equívoco" diante do avanço da doença no país. >
Luiz Henrique Mandetta
em entrevista no dia 16 de marçoNo pronunciamento em rede nacional de 24 de março, Bolsonaro criticou as medidas para conter o coronavírus que vêm sendo tomadas por governadores e prefeitos em todo o país. O presidente tem afirmado que a economia vai sofrer com fechamento de comércio e que trabalhadores informais ficarão sem comida, tornando o isolamento social impossível. >
Jair Bolsonaro
durante pronunciamento oficial de rádio e TVNo dia 30 Mandetta voltou a pedir que sejam mantidas as recomendações feitas pelos estados para conter o avanço da epidemia do novo coronavírus. >
"Por enquanto mantenham as recomendações dos estados, porque nesse momento é a medida mais recomendável, porque temos muitas fragilidades ainda no sistema de saúde">
No dia 28, em entrevista coletiva após a reunião com o presidente, o ministro da Saúde criticou as carreatas pela reabertura do comércio. Esses atos defendidos por Bolsonaro, que chegou a inclusive compartilhar vídeos nas redes sociais. >
"Pedimos à sociedade que comporte-se. Prevaleça, primeiro, a lei do bom senso. As carreatas, não é hora agora. Fazer movimento assimétrico de efeito manada...Daqui a duas semanas, três semanas, os que falam 'vamos fazer carreata', vão ser os mesmos que ficarão em casa. Não é hora", disse Mandetta. >
Enquanto o presidente defende a aplicação do medicamento em pacientes da covid-19, Mandetta pede cautela até que haja comprovação científica da eficácia desse fármaco, normalmente usado para malária. >
Jair Bolsonaro
no pronunciamento da TV, no dia 24 de março.Mandetta tem afirmado que considera os estudos sobre a eficácia do tratamento com a substância ainda muito incipientes. "[Uso de cloroquina] Não é panacéia, não veio para salvar a humanidade. É um estudo incipiente que está sendo feito mundo afora. Por que não abre para o cara que está no primeiro dia? Se tomada [cloroquina], pode dar arritmia cardíaca e paralisar a função do fígado. Poderíamos ter mais mortes por mal uso do medicamento do que pela virose", afirmou o ministro, que também é médico. >
No pronunciamento do dia 24 de março, Bolsonaro saiu em defesa do isolamento vertical, pela primeira vez, deixando apenas idosos e pessoas com doenças pré-existentes fora do convívio social. "O que se passa no mundo tem mostrado que o grupo de risco é o das pessoas acima dos 60 anos. Então, por que fechar escolas? Raros são os casos fatais de pessoas sãs, com menos de 40 anos de idade. 90% de nós não teremos qualquer manifestação caso se contamine".>
No dia seguinte, em entrevista, Bolsonaro disse ia conversar com o ministro da Saúde para que a orientação do governo federal mude.>
"O que precisa ser feito: botar esse povo para trabalhar, preservar os idosos, preservar aqueles que têm problemas de saúde, mais nada além disso. Caso contrário, o que aconteceu no Chile vai ser fichinha perto do que pode acontecer no Brasil", afirmou o presidente. >
Em diversas declarações, Mandetta não se colocou favoravelmente a esta estratégia.>
Luiz Henrique Mandetta
em entrevista coletiva.No dia 31 Bolsonaro usou trecho de pronunciamento do diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, para alegar que, agora, até a entidade internacional estaria defendendo o retorno ao trabalho. >
Jair Bolsonaro
em pronunciamento na TV, no dia 31 de março.Depois desta declaração, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, negou que a Organização Mundial da Saúde (OMS) tenha defendido o retorno imediato das pessoas ao trabalho, conforme fez crer o presidente. Mais do que isso, Mandetta defendeu ainda o máximo de distanciamento social e a manutenção das quarentenas definidas pelos estados no combate ao novo coronavírus. >
A afirmação atribuída ao diretor da OMS foi distorcida por Bolsonaro. O que a organização pede é que gestores públicos, como Bolsonaro, deem condições para que as pessoas pobres possam cumprir as recomendações das autoridades em saúde pública, como o isolamento social.>
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