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Como a prisão de Queiroz pode atingir Jair Bolsonaro

Como a prisão de Queiroz pode atingir Jair Bolsonaro

Prisão de Queiroz não significa problemas jurídicos para o presidente, mas politicamente é  mais um fator que agrava a crise que o governo enfrenta

Publicado em 18 de junho de 2020 às 20:58

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Flavio Bolsonaro e Fabrício Queiroz
Queiroz tem ligação com a família Bolsonaro desde a década de 1980. (Divulgação)

polêmica envolvendo o nome de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, persegue o clã Bolsonaro desde 2018, quando logo após as eleições que elegeram o capitão para a Presidência, em dezembro, relatórios do antigo Conselho de Atividade Financeiras (Coaf) apresentaram movimentações suspeitas na conta de Queiroz. Com a prisão do ex-policial, realizada nesta quinta-feira (18), que afeta diretamente o filho 01 do presidente, Bolsonaro é colocado sob mais pressão política em um momento que já é crítico. 

Especialistas avaliam que, juridicamente, não há nada que ligue os supostos crimes cometidos por Queiroz, enquanto era assessor de Flávio, ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), pelo menos por enquanto. Politicamente, no entanto, o presidente encontra mais uma bomba que "estoura perigosamente perto", uma vez que além da ligação do próprio Queiroz com a família, ele foi encontrado na casa do advogado de Flávio, Frederick Wassaf, figura constante no Palácio do Planalto e da Alvorada. 

Tanto Wassef como a família Bolsonaro afirmavam que não tinham contato com Queiroz desde que o suposto esquema de "rachadinha" no gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio veio à tona, no final de 2018.

No entanto, nesta quinta, o próprio Flávio Bolsonaro fez a relação de que a prisão de Queiroz teria sido para atingir o pai, em publicação nas redes sociais.  "A verdade prevalecerá! Mais uma peça foi movimentada no tabuleiro para atacar Bolsonaro. Em 16 anos como deputado no Rio nunca houve uma vírgula contra mim. Bastou o presidente Bolsonaro se eleger para mudar tudo! O jogo é bruto!".

O cenário político já estava em grande tensão antes da prisão de Queiroz. O fato novo reacende uma crise que estava deixada um pouco de lado, mas não menos nociva para a imagem da família Bolsonaro, pois a investigação de Flávio por corrupção prejudica a narrativa criada por seu pai na campanha eleitoral de 2018, da luta para livrar o Brasil da corrupção. A imagem do presidente acaba contaminada, já que Flávio não é apenas seu filho, mas também um político e seu conselheiro.

De acordo com o cientista político Nauê Bernardo, o presidente é atingido diretamente porque passa a estar em uma posição em que é obrigado a se posicionar: entregar o filho "aos lobos" e buscar se descolar, o máximo possível, da imagem dele ou mover a máquina pública para tentar protegê-lo. "O que existe fortes indícios de que ele já tem feito", pontua.

Outro fator agravante para o cenário, relembra Nauê, é o de que Glávio também responde a inquérito sobre essas fatos, mas devido ao foro privilegiado pelo cargo de senador, a investigação corre no Supremo Tribunal Federal, instituição com quem Bolsonaro e seus aliados estão "em guerra" cada vez mais declarada. O especialista, que também é advogado, sustenta que o episódio é só mais uma prova de que "o castelo de cartas" de Bolsonaro ruiu nas últimas semanas.

"Um mês atrás Bolsonaro reinava absoluto, sem ninguém levantar a voz contra ele. De lá pra cá, com as manifestações contrárias nas ruas, a queda da popularidade nas redes sociais e a validação do inquérito das fake news ele tem tido sucessivas derrotas", detalha.

Para João Gualberto, também cientista político, o presidente é afetado porque "se elegeu sozinho, mas governa com os três filhos". A ligação de um filho com um esquema de corrupção significaria, também, a desconstrução de todo discurso e estrutura política em cima da qual se elegeu. "Jair se elegeu com o discurso de disruptura, feito em cima da corrupção exposta pela Lava-Jato", ressalta.

Em cima da estrutura eleitoral da própria família Bolsonaro, avalia João Gualberto, cada um possui um papel. Jair sendo o líder e o agitador, que fala o que o público quer ouvir, Eduardo o "homem da ideologia", responsável por bater na tecla da ideologia de extrema-direita e a guerra com a esquerda, Carlos quem cuida do "mundo digital e da presença da família nas redes" sobrando para Flávio, assim, ao que tudo indica, o papel de gerir os recursos de campanha.

"Se for provado o esquema de rachadinhas, significa não só que foi 'debaixo do nariz' de Jair, mas que foi dentro dessa estrutura organizada de campanha", finaliza.

SEM EFEITOS JURÍDICOS, POR ENQUANTO

Apesar de todas as consequências políticas da prisão de Queiroz para a família Bolsonaro, até o momento apenas Flávio Bolsonaro pode ser juridicamente prejudicado. O advogado especialista em casos de corrupção Raphael Abad explica que não há ligações claras de Jair Bolsonaro com as supostas práticas criminosas do assessor de seu filho. "Quando seu filho é maior de idade não existe mais responsabilidade ou relação direta com os atos", aponta.

Mas, assim como a corrupção sistêmica que aconteceu no Brasil nos últimos anos, a prática de rachadinha, em que os funcionários são obrigados a devolver parte de seus salários, também nunca é executada por um homem só. Caso Queiroz resolva falar, ele poderia envolver mais integrantes da família Bolsonaro, inclusive o pai, nas investigações.

Neste caso da rachadinha, anda não houve denúncia pelo Ministério Público, e a suspeita é de interferência de Queiroz nas investigações da Promotoria, por isso a prisão preventiva.

RELAÇÃO

Jair Bolsonaro e Queiroz se conhecem desde 1984. Queiroz foi recruta do agora presidente na Brigada de Infantaria Paraquedista, do Exército. Depois, Bolsonaro seguiu a carreira política, e Queiroz entrou para a Polícia Militar do Rio de Janeiro, de onde já se aposentou.

Queiroz, que foi nomeado em 2007 e deixou o gabinete de Flávio no dia 15 de outubro de 2018, é amigo de longa data do atual presidente. Entre as movimentações milionárias que chamaram a atenção na conta de Queiroz está um cheque de R$ 24 mil repassado à primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Prisão de Fabrício Queiroz em Atibaia, interior de São Paulo(Divulgação/ Policia Federal)

O advogado criminalista e professor da FDV Israel Domingos Jorio ressalta que, mesmo assim, o presidente continua fora da equação juridicamente.

"Não basta provar as ilicitudes das transações, que, até onde sabemos, constam em nome da esposa. Deve-se provar a atuação pessoal dele, concorrendo de alguma forma para o eventual crime." O professor acredita que é difícil, se for provada ilegalidade nas transações, que Michelle tenha cometido por contra própria. "Mas o ônus é da acusação, que precisa demonstrar a participação do Presidente no esquema."

Por fim, conclui o advogado, "os indícios são fortes, a suspeita é grande, mas ainda assim, depende-se prova concreta, pois ele é presumidamente inocente até que se demonstre o contrário, mesmo que ele mesmo não seja um defensor da presunção da inocência".

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