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Publicado em 22 de dezembro de 2025 às 17:55
- Atualizado há 11 horas
Em um momento em que o Brasil está debruçado sobre a pauta da segurança pública, após ações da Polícia Federal contra organizações criminosas e a megaoperação que resultou na morte de 121 pessoas no Rio de Janeiro (RJ), o Espírito Santo tem se apresentado como um Estado que vem conseguindo diminuir os índices de homicídios dolosos ao longo da última década. Outro dado que ajuda a compreender a redução das mortes violentas é o de tentativas de assassinatos, que também caíram e atingiram o menor patamar em sete anos.>
Um levantamento feito por A Gazeta a partir de informações obtidas via Lei de Acesso à Informação (LAI) mostra que, entre janeiro e novembro de 2025, o Espírito Santo registrou 2.122 casos de tentativas de homicídio, resultando em uma redução de 7% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Dezembro não foi incluído no cálculo, uma vez que os dados referentes ao mês ainda estão sendo fechados.>
O resultado de 2025 é o melhor para o Estado em sete anos (veja tabela abaixo) e quebra uma trajetória de crescimento nas tentativas iniciada ao longo dos meses de 2024, conforme publicado em junho deste ano, com base em indicadores do Mapa de Segurança Pública, do Ministério da Justiça e Segurança Pública.>
Assim como o índice de tentativas, o de homicídios também apresenta redução. Uma avaliação do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) apontou que o Espírito Santo caminha para encerrar o ano com uma nova queda histórica de mortes violentas, com menos de 800 casos.>
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Dados de tentativas de homicídio, em alta ou em queda, podem ser indicadores importantes para medir se, de fato, o Estado tem conseguido reduzir os índices de violência.>
Se os índices de tentativas estiverem crescendo e, ainda assim, os homicídios dolosos apresentarem queda, isso pode significar que a criminalidade continua elevada, mas que algum fator, como, por exemplo, a hospitalização mais rápida, esteja evitando que uma pessoa baleada evolua para o óbito.>
No entanto, no Espírito Santo, não é possível fazer uma correlação direta entre esses fatores, uma vez que a própria Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) reconhece que os dados de tentativas de homicídio são baseados nos registros dos boletins de ocorrência formalizados pelas forças policiais no momento do fato.>
Isso significa que todos os 2.122 registros de tentativas de homicídios de 2025 correspondem ao entendimento do policial ao chegar ao local da ocorrência. Posteriormente, o delegado pode avaliar, ao instaurar um inquérito, que o fato se trata de outro tipo de crime, sem que essa reclassificação altere o boletim de ocorrência.>
De acordo com a Sesp, o boletim de ocorrência reflete a informação disponível no primeiro atendimento policial e, por esse motivo, não é modificado posteriormente, mesmo nos casos em que a vítima venha a óbito após atendimento hospitalar e quando a investigação policial reclassifica o fato.>
Nessas situações (óbito posterior da vítima), embora o registro inicial (boletim de ocorrência) permaneça como tentativa de homicídio, o caso também é contabilizado estatisticamente como homicídio doloso, a partir da confirmação do óbito e da apuração conduzida pela Polícia Judiciária.>
Na avaliação do coronel reformado e ex-secretário nacional da segurança pública, José Vicente da Silva Filho, o Espírito Santo, de fato, tem conseguido reduzir os homicídios, mas ainda tem um longo caminho pela frente.>
“O índice, pelo que avalio, deve fechar este ano em torno de 18 mortes por cem mil habitantes. É um índice razoável, mas está longe ainda de São Paulo e Santa Catarina, que têm um terço do indicador do Espírito Santo”, ressalta.>
Para o especialista, é necessário que o Estado faça um trabalho mais preciso de monitoramento dos casos de tentativas de homicídio. Ele também concorda que um eventual aumento nesse índice não significa, necessariamente, que as pessoas estejam tentando mais matar e não conseguindo.>
José Vicente avalia que, se o homicídio cai, a tentativa também deveria cair. No entanto, quando isso não ocorre, segundo ele, podem estar ocorrendo mudanças no critério de classificação de crimes. “Muitas vezes, são crimes de lesão corporal grave, mas o delegado, ao fazer a estatística ou o inquérito, transforma isso em tentativa de homicídio”, sugere.>
“A nossa legislação entende que agressões, brigas de maneira geral, não têm a mesma intenção de matar, ainda que alguém possa morrer, eventualmente. Já a tentativa de homicídio ocorre em um contexto em que o sujeito só não conseguiu matar porque a vítima sobreviveu ou alguma pessoa impediu o crime. O mais provável nesses casos é um erro no critério de classificar a tentativa”, completa o ex-secretário.>
O ex-secretário avalia que reduzir os homicídios é importante, mas destaca a necessidade de seguir trabalhando para diminuir outros índices de crimes. >
“Você tem um Estado com algo entre 400 e 500 homicídios, em uma população de cerca de 4 milhões de habitantes. Mas o homicídio não é o que incomoda as pessoas em termos de sensação de segurança. Existem os crimes do dia a dia, que são os crimes de rua, os chamados 'street crimes', como roubo de celular, de objetos e de veículos”, afirma.>
“É preciso conhecer, portanto, os indicadores: o dia, a hora, o local de maior preferência; locais de maior intensidade, para aplicar o policiamento; fazer todo o trabalho para evitar que aconteça. Trabalhar com as prefeituras é muito importante, porque os locais onde os crimes acontecem não se distribuem aleatoriamente; eles têm pontos de concentração, e há tecnologia para identificar isso. Imagino que o Espírito Santo também esteja fazendo isso, para a polícia dedicar mais esforços nesses locais. Muitos trabalhos precisam ser feitos com as prefeituras para ajudar no processo de prevenção.”>
Procurada por A Gazeta, a Sesp reforçou que não há, necessariamente, uma relação direta e automática entre a queda dos homicídios e a redução das tentativas de homicídio. “Tecnicamente é possível que os dois indicadores apresentem comportamentos distintos.”>
A pasta diz, ainda, que reconhece que o aumento das tentativas pode estar relacionado à forma inicial de registro e afirma que acompanha, do início ao fim, as estatísticas de tentativas de homicídio, atualizando a situação quando uma pessoa vai a óbito.>
Na avaliação da Sesp, o boletim de ocorrência não deve ser modificado, justamente para preservar a fidedignidade do registro original. Contudo, o Estado está em processo de aperfeiçoamento metodológico e, a partir de 2026, informará ao Ministério da Justiça, para fins estatísticos, os casos de tentativas de homicídio validados pela Polícia Judiciária e não somente o registro inicial feito pelas guarnições que atenderam a ocorrência, o que permitirá maior precisão na contagem desses eventos.>
“Há casos em que o fato é inicialmente registrado como tentativa de homicídio, mas, após a análise técnica da autoridade policial, recebe outra tipificação penal no momento da instauração ou da conclusão do inquérito. Esse descompasso entre o registro inicial (boletim de ocorrência) e a tipificação final (inquérito policial) pode inflacionar os números de tentativas quando considerados apenas os boletins de ocorrência, reforçando a necessidade da revisão metodológica atualmente em curso, informando ao Ministério da Justiça os casos de tentativas de homicídio validados pela Polícia Judiciária, tal como já realizado por outros Estados”, afirma a pasta.>
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