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Defesa alega 'incompetência' da Justiça do ES para julgamento de falso médico

Defesa alega 'incompetência' da Justiça do ES para julgamento de falso médico

Defesa afirma que Leonardo Luz Moreira, acusado pela morte de Ana Luisa, de 10 anos, já responde às mesmas acusações na Justiça Federal da Bahia

Publicado em 25 de fevereiro de 2025 às 19:00

 - Atualizado há 10 meses

 Leonardo Luz Moreira é suspeito da morte de Ana Luisa Ferreira Marcelino da Silva, de 10 anos, atendida por ele
Leonardo Luz Moreira é réu pela morte de Ana Luisa Ferreira Marcelino da Silva, de 10 anos, atendida por ele Crédito: Montagem A Gazeta
Atualização
26/02/2025 - 09:29hrs
Após publicação desta matéria, a Justiça deu decisão indeferindo o pedido. O texto foi atualizado.

A defesa de Leonardo Luz Moreira, apontado pelo Ministério Público (MPES) como "falso médico" e que será julgado pelo Tribunal do Júri na quinta-feira (27) pela morte de Ana Luisa Ferreira Marcelino da Silva, de 10 anos, ocorrida no Hospital Roberto Silvares, em São Mateus, no Norte do Espírito Santo, informou nesta terça-feira (25) que ingressou com um pedido de declaração de incompetência da Justiça Estadual para julgar o caso. 

A defesa já havia solicitado à Justiça a transferência do julgamento para outra cidade, por meio de um pedido de desaforamento, mas a solicitação foi negada. O réu é acusado de homicídio qualificado, exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica. O julgamento está previsto para começar às 8h de quinta-feira (27), no Fórum do município.

Segundo a defesa de Leonardo, "o pedido de incompetência foi formulado pela defesa perante o juízo de São Mateus. O argumento principal da defesa é que já tem um processo em trâmite desde 2021 na Vara Federal da Bahia. Esse processo apura o crime do exercício irregular da medicina previsto no artigo 282 do Código Penal e a denúncia de São Mateus, ofertada pelo Ministério Público (MPES), também apura o crime do exercício irregular da medicina, sendo que essa denúncia foi oferecida em dezembro de 2023, sendo que a denúncia do Ministério Público Federal é de 2021, ou seja, é anterior", informou.

Esclareceram que "nesse caso, ele está sendo processado duas vezes pelo mesmo fato e considerando que a morte da Ana Luisa, em tese, foi praticada durante o exercício irregular da medicina, deve haver a transferência de competência, ou seja, deve ser analisado pelo juízo federal, já que o crime do artigo 282, o exercício irregular da medicina, é um crime que envolve o interesse das autarquias, que no caso é o CRM e o CFM". 

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Defesa alega 'incompetência' da Justiça do ES para julgamento de falso médico

A defesa de Leonardo acrescentou que ele "é um médico com diploma emitido pela Uningá, uma universidade de Maringá, no interior do Paraná. Até o momento, não há nenhuma decisão judicial que invalide seu diploma. A ação continua em trâmite, sem previsão de julgamento. Enquanto não houver uma sentença declarando a nulidade do diploma, não se pode afirmar que Leonardo atuou como falso médico". 

Ressaltou que, "durante toda a graduação, Leonardo sempre foi um bom aluno, obtendo excelentes notas. Além disso, durante a pandemia, atuou na linha de frente no combate à Covid-19 no hospital. Outro ponto relevante é que, durante a instrução processual, a equipe médica do hospital foi ouvida e relatou que sua conduta sempre foi exemplar, sem registros de reclamações por parte dos pacientes e com postura cooperativa junto à equipe. Sua atuação no dia dos fatos foi avaliada por uma junta médica do Hospital Roberto Silvares, que a classificou como correta, sem identificar qualquer irregularidade”, declarou.

O posicionamento conjunto é dos advogados paranaenses Bruna Mitsui Hara, Roberto Mitsuru Enuki Junior, Douglas Virgínio da Rocha, Mateus Henrique Lino da Silva e Victor Hudson Niquele Santos, dos escritórios Hara Lino Advocacia e Roberto Enuki Advocacia Criminal Especializada, responsáveis pela defesa de Leonardo Luz Moreira. 

Justiça rejeita 

Após publicação desta matéria, a Justiça rejeitou o pedido de declaração de incompetência da defesa. Conforme a decisão liminar do juiz Felipe Rocha Silveira, de terça-feira (25), como o caso aconteceu em um hospital estadual do município capixaba, o julgamento pela morte de Ana Luisa Ferreira Marcelino da Silva, de 10 anos, deve ser mantido nas datas e locais previstos. 

“Na hipótese vertente, o exercício da profissão se deu perante o Hospital Doutor Roberto Arnizaut Silvares, instituição estadual e não órgão da União, mediante contratação de serviço temporário diretamente com o Estado do Espírito Santo, sendo inafastável a competência da Justiça Estadual”, justificou o juiz.

A justiça capixaba entendeu também que os casos aos quais Leonardo responde não possuem relação. “Com a simples leitura de ambas as denúncias, que não se tratam dos mesmos fatos ou dos mesmos crimes, afastando-se, portanto, as alegações de incompetência do juízo e de conexão de crimes”, apontou na decisão.

Preso em 2024

Leonardo foi preso em dezembro de 2024, após a Justiça atender a um pedido do Ministério Público pela prisão preventiva. Segundo o MPES, ele foi detido pela Polícia Militar do Paraná, onde dizia residir, depois que investigações apontaram que cursava Medicina presencialmente em uma universidade no Paraguai. Dessa forma, descumpria a ordem judicial de não deixar o país sem autorização, representando risco à aplicação da lei penal e à ordem pública.

Pedido negado

O Tribunal de Justiça negou um pedido da defesa do falso médico Leonardo Luz Moreira para desaforar — ou seja, transferir de comarca, fórum. A defesa citou que a cidade seria "pequena" para o júri (veja mais abaixo).

A reportagem apurou que o juiz Felipe Rocha Silveira, da 1ª Vara Criminal de São Mateus, já havia negado um primeiro pedido de desaforamento, decisão mantida pelo Tribunal de Justiça (TJES).

A defesa argumentou que "não há na pequena cidade de São Mateus situação ideal para que o júri ocorra em cenário imparcial" e sugeriu que o julgamento fosse realizado na Capital.

Sobre isso, o juiz Felipe Silveira rebateu: "Cumpre ressaltar que, segundo os dados catalogados pelo IBGE através do Censo Demográfico, São Mateus chegou à população de 123.752 habitantes, não se tratando de uma cidade pequena", pontuou.

Relembre o caso

Em 2021, logo após a morte da menina de 10 anos, as investigações da Polícia Civil e da Polícia Federal apontaram que Leonardo Luz Moreira, se matriculou em uma faculdade de Medicina na Bolívia, onde estudou por um semestre.

Em seguida, solicitou transferência para uma faculdade brasileira e teria adulterado os registros para computarem, ao invés de seis meses, quatro anos de estudo. Ainda conforme as investigações, o falso médico foi contratado por diversas prefeituras do Norte capixaba e também pelo governo do Estado. Pelos serviços de falsificação, segundo a Polícia Federal, o falso médico cobrava entre R$ 20 mil e R$ 40 mil. "O acusado foi o primeiro a fazer esse esquema.

Logo após virem a público as denúncias contra o falso médico, a professora Alessandra Ferreira Marcelino relatou à reportagem de A Gazeta, na época, que a filha dela, Ana Luisa, de 10 anos, morreu pouco tempo após receber prescrição médica do suposto médico. “Ele matou a minha filha”, afirmou.

Segundo a mãe, o falso médico disse que o caso se tratava de uma gastroenterite e que não adiantaria medicar a menina, pois a mucosa dela estava irritada. A mulher contou que ainda pediu uma receita médica ao homem e ele teria dito para ela continuar dando o medicamento que usou quando a menina começou a vomitar e que poderia dar até refrigerante, se ela pedisse, para não contrariá-la.

Após receber a prescrição médica do homem, a mãe afirma que ela e a filha foram para a sala de medicação, onde o quadro de saúde da filha começou a piorar.

“Na hora que a enfermeira pulsionou a veia dela, minha filha começou a ficar pálida. Quando aplicou a injeção de medicação, minha filha começou a gritar ‘mamãe, meu coração está doendo’, a enfermeira foi retirando tudo e minha filha começou a convulsionar na minha frente”, relata.

Neste momento, as enfermeiras começaram a tentar reanimar a menina e, segundo a mãe, o médico afirmou que a criança havia "voltado”. “Ele disse que minha filha era uma leoa, uma guerreira. Menos de cinco minutos depois, ele voltou e disse que ela havia falecido, já nas primeiras horas do dia 12 de janeiro”, contou à época.

Nota da defesa do réu (na íntegra)

A defesa do Sr. Leonardo Luz Moreira afirma que está confiante de que os fatos serão esclarecidos e que a verdade prevalecerá. O Sr. Leonardo Luz Moreira sempre colaborou com as autoridades e está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos necessários na sessão plenária designada para a próxima semana. A defesa reitera que o Sr. Leonardo confia no sistema de justiça. Ainda, buscamos demonstrar que os fatos não ocorreram conforme a denúncia do Ministério Público e que trabalhará para demonstrar como os fatos aconteceram verdadeiramente.

Quanto ao pedido de desaforamento formulado, esse se justifica pela pressão política exercida sobre os jurados da Comarca, uma vez que há um vídeo postado nas redes sociais onde aparece a Vereadora Valdirene Bernadino e a vice-prefeita Raquel Rocha convocando a população para uma manifestação no dia da sessão plenária.

Ainda, a decisão publicada se trata do indeferimento do pedido de suspensão da sessão plenária até o julgamento final do pedido de desaforamento, que ainda está em curso. 

O julgamento pelos jurados na sessão plenária deve ser imparcial e livre de pressão social ou política, sendo que no caso em voga não se observa. Agradecemos a compreensão da imprensa e da sociedade em geral neste momento delicado. Reiteramos nosso compromisso com a transparência e a ética em todo o processo.


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