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Publicado em 20 de fevereiro de 2025 às 16:45
- Atualizado há 10 meses
O Tribunal de Justiça negou um pedido da defesa do falso médico Leonardo Luz Moreira para desaforar — ou seja, transferir de comarca, fórum — o julgamento marcado para as 8h do dia 27 de fevereiro, em São Mateus, no Norte do Espírito Santo. >
A defesa citou que a cidade seria "pequena" para o júri (veja mais abaixo). O réu responde pelo crime de homicídio pela morte de Ana Luisa Ferreira Marcelino da Silva, de 10 anos, ocorrida em janeiro de 2021, após atendimento realizado por ele no Hospital Estadual Roberto Silvares. Ele é acusado de homicídio qualificado, exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica. >
A reportagem apurou que o juiz Felipe Rocha Silveira, da 1ª Vara Criminal de São Mateus, já havia negado um primeiro pedido de desaforamento, decisão mantida pelo Tribunal de Justiça (TJES). >
A defesa argumentou que "não há na pequena cidade de São Mateus situação ideal para que o júri ocorra em cenário imparcial" e sugeriu que o julgamento fosse realizado na Capital. Sobre isso, o juiz Felipe Silveira rebateu: "Cumpre ressaltar que, segundo os dados catalogados pelo IBGE através do Censo Demográfico, São Mateus chegou à população de 123.752 habitantes, não se tratando de uma cidade pequena", pontuou. >
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Após a negativa na 1ª instância, o pedido foi enviado ao Tribunal de Justiça (TJES). Em decisão do dia 13 de fevereiro, o desembargador Pedro Valls Feu Rosa manteve a realização do júri em São Mateus e determinou que a Procuradoria-Geral do Estado se manifeste antes de uma nova análise do pedido, conforme estabelece o Código de Processo Penal. >
O magistrado não acolheu o argumento da defesa de que o caso teria mobilizado lideranças locais e que teria tido "grande repercussão" na imprensa, o que, segundo a defesa, poderia influenciar a decisão dos jurados. Segundo Pedro Valls Feu Rosa, não há elementos que comprovem essa alegada influência.>
Entenda o que é desaforamento
Desaforamento é o deslocamento do julgamento cidade de origem, onde, em regra, deveria ser realizado, para outra comarca/fórum, ou seja, outra cidade próxima. É um meio legal que busca garantir a idoneidade do julgamento popular, bem como assegurar o interesse público e a segurança do acusado.
Leonardo foi preso em dezembro de 2024, após a Justiça atender a um pedido do Ministério Público pela prisão preventiva. Segundo o MPES, ele foi detido pela Polícia Militar do Paraná, onde dizia residir, depois que investigações apontaram que cursava Medicina presencialmente em uma universidade no Paraguai. Dessa forma, descumpria a ordem judicial de não deixar o país sem autorização, representando risco à aplicação da lei penal e à ordem pública.>
Após a prisão, conforme o MPES, o réu contratou uma banca de advogados do Paraná para realizar sua defesa no julgamento ( no dia 27 de fevereiro). >
Leonardo já havia sido preso em 18 de agosto de 2021 pela Polícia Federal em operação voltada ao combate de prática ilegal de Medicina.>
Em 2021, logo após a morte da menina de 10 anos, as investigações da Polícia Civil e da Polícia Federal apontaram que Leonardo Luz Moreira, se matriculou em uma faculdade de Medicina na Bolívia, onde estudou por um semestre. Em seguida, solicitou transferência para uma faculdade brasileira e teria adulterado os registros para computarem, ao invés de seis meses, quatro anos de estudo. >
Ainda conforme as investigações, o falso médico foi contratado por diversas prefeituras do Norte capixaba e também pelo governo do Estado.>
Pelos serviços de falsificação, segundo a Polícia Federal, o falso médico cobrava entre R$ 20 mil e R$ 40 mil. "O acusado foi o primeiro a fazer esse esquema. >
Logo após virem a pública as denúncias contra o falso médico, a professora Alessandra Ferreira Marcelino relatou à reportagem de A Gazeta, na época, que a filha dela, Ana Luisa, de 10 anos, morreu pouco tempo após receber prescrição médica do suposto médico. “Ele matou a minha filha”, afirmou.>
Segundo a mãe, o falso médico disse que o caso se tratava de uma gastroenterite e que não adiantaria medicar a menina, pois a mucosa dela estava irritada. A mulher contou que ainda pediu uma receita médica ao homem e ele teria dito para ela continuar dando o medicamento que usou quando a menina começou a vomitar e que poderia dar até refrigerante, se ela pedisse, para não contrariá-la. >
Após receber a prescrição médica do homem, a mãe afirma que ela e a filha foram para a sala de medicação, onde o quadro de saúde da filha começou a piorar.>
“Na hora que a enfermeira pulsionou a veia dela, minha filha começou a ficar pálida. Quando aplicou a injeção de medicação, minha filha começou a gritar ‘mamãe, meu coração está doendo’, a enfermeira foi retirando tudo e minha filha começou a convulsionar na minha frente”, relata.>
Neste momento, as enfermeiras começaram a tentar reanimar a menina e, segundo a mãe, o médico afirmou que a criança havia "voltado”. “Ele disse que minha filha era uma leoa, uma guerreira. Menos de cinco minutos depois, ele voltou e disse que ela havia falecido, já nas primeiras horas do dia 12 de janeiro”, contou à época.>
Em nota assinada pelos advogados paranaenses Bruna Mitsui Hara, Roberto Mitsuru Enuki Junior, Mateus Henrique Lino da Silva e Victor Hudson Niquele Santos, dos escritórios Hara Lino Advocacia e Roberto Enuki Advocacia Criminal Especializada, responsáveis pela defesa de Leonardo Luz Moreira, a equipe jurídica afirmou estar confiante de que "os fatos serão esclarecidos". Destacaram ainda que Leonardo "sempre colaborou com as autoridades" e que ele está "à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos necessários na sessão plenária designada para a próxima semana".>
A defesa acrescentou acreditar na justiça e que vai buscar demonstrar que "os fatos não ocorreram conforme a denúncia do Ministério Público". Sobre o pedido de desaforamento, a defesa argumento que o pedido "se justifica pela pressão política exercida sobre os jurados da Comarca, uma vez que há um vídeo postado nas redes sociais onde aparece a Vereadora Valdirene Bernadino e a vice-prefeita Raquel Rocha convocando a população para uma manifestação no dia da sessão plenária".>
Por fim, disseram que, de fato, houve a negativa do pedido formulado, porém, que aguardam "o julgamento final do pedido de desaforamento, ainda em curso".>
Nota da defesa do falso médico (na íntegra)
A defesa do Sr. Leonardo Luz Moreira afirma que está confiante de que os fatos serão esclarecidos e que a verdade prevalecerá. O Sr. Leonardo Luz Moreira sempre colaborou com as autoridades e está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos necessários na sessão plenária designada para a próxima semana.
A defesa reitera que o Sr. Leonardo confia no sistema de justiça. Ainda, buscamos demonstrar que os fatos não ocorreram conforme a denúncia do Ministério Público e que trabalhará para demonstrar como os fatos aconteceram verdadeiramente.
Quanto ao pedido de desaforamento formulado, esse se justifica pela pressão política exercida sobre os jurados da Comarca, uma vez que há um vídeo postado nas redes sociais onde aparece a Vereadora Valdirene Bernadino e a vice-prefeita Raquel Rocha convocando a população para uma manifestação no dia da sessão plenária.
Ainda, a decisão publicada se trata do indeferimento do pedido de suspensão da sessão plenária até o julgamento final do pedido de desaforamento, que ainda está em curso.
O julgamento pelos jurados na sessão plenária deve ser imparcial e livre de pressão social ou política, sendo que no caso em voga não se observa.
Agradecemos a compreensão da imprensa e da sociedade em geral neste momento delicado. Reiteramos nosso compromisso com a transparência e a ética em todo o processo.
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