Na semana passada, no mesmo dia em que deputados bolsonaristas ocupavam a Mesa da Câmara, em um motim contra a decretação da prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, o influenciador Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca, publicava o vídeo com denúncias sobre a adultificação de crianças nas redes sociais que rapidamente seria um fenômeno de visualizações.
O que ninguém poderia prever era que não demoraria muito para um evento se cruzar com o outro. Diante da repercussão e da gravidade do que foi mostrado pelo influenciador, sobretudo as engrenagens dos algoritmos que beneficiam o consumo de conteúdo infantil pelas redes de pedofilia, as ideologias foram momentaneamente abandonadas, e os posicionamentos de deputados e senadores de campos rivais soaram uníssonos. De Érika Hilton a Nikolas Ferreira. Todo mundo do mesmo lado.
A bem da verdade, quem em sã consciência se colocaria de outra forma diante da denúncia de abusos explícitos cometidos contra crianças para aumentar visualizações e curtidas e, consequentemente, encher os bolsos? A omissão das big techs acelera a urgência de atribuir a elas a responsabilização pelo que permitem ser divulgado. Na Câmara, foram pelo menos sete projetos recebidos após a publicação do vídeo. "Queremos dar resposta imediata à 'adultização' de crianças com o projeto que veio do Senado", disse nesta quinta-feira (14) o presidente da Casa, Hugo Motta.
Não dá ainda para prever se dessas proposições saírão leis com efetividade, tampouco se esse esforço legislativo de fato será concretizado. Não é a primeira vez que o Congresso se mexe após comoção pública. A Lei Carolina Dieckmann, criada em 2012, é um desses casos específicos em que deputados e senadores respondem aos clamores da opinião pública. No ano anterior, a atriz teve o computador invadido e fotos íntimas roubadas e divulgadas sem autorização.
É importante que a casa das leis dê respostas rápidas às demandas do momento, mas deveria serguir esse exemplo também em outras agendas prioritárias para o país. Como foi dito neste espaço nesta quarta-feira (14), estamos diante de uma necessária atualização legistiva para combater as organizações criminosas que se espalham pelo território nacional. Há uma proposta de emenda constitucional da Segurança Pública, proposta pelo governo federal, em tramitação. É um tema de primeira hora.
Assim como é urgente para a saúde financeira do país o encaminhamento de uma reforma administrativa que, entre tantas coisas, coloque fim aos supersalários do funcionalismo. Sabe-se que é uma mudanças que encontra resistências, diante de um lobby histórico. Mas, assim como o abuso de crianças denunciado por Felca, é uma pauta que provoca indignação popular, que precisa ser mais bem canalizada para fazer mais barulho. A reforma administrativa pode sim "furar a bolha" e começar a transformar o serviço público, e o Congresso pode fazer história se começar a se empenhar nesse sentido.
LEIA MAIS EDITORIAIS
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.