Felipe Storch Damasceno é economista com mestrado e doutorado em Administração e Contabilidade. É professor de Economia e pesquisador dos impactos sociais e econômicos de políticas públicas. Também é consultor, palestrante e comentarista na CBN Vitória

A crise do Banco Master e as lições para o sistema financeiro brasileiro

Episódio expõe falhas de supervisão, governança e transparência, além de reforça a urgência de preparar o país para modernizar  um sistema bancário em transformação

Publicado em 26/11/2025 às 08h08

A crise do Banco Master expõe um ponto de inflexão para o sistema financeiro brasileiro. Não se trata apenas da liquidação de uma instituição relevante, mas de um episódio que ilumina fragilidades de supervisão, deficiências de governança e a necessidade urgente de modernização dos mecanismos de auditoria e fiscalização. Episódios dessa natureza revelam que, em um ambiente econômico cada vez mais volátil, depender apenas de controles tradicionais é insuficiente para proteger investidores, evitar riscos sistêmicos e garantir a estabilidade do crédito.

Os indícios já divulgados apontam para manipulação de balanços, ocultação de passivos e distorção deliberada da posição financeira da instituição. A discrepância entre o que era reportado e o que se verificou posteriormente demonstra falhas internas, mas também limitações na identificação precoce de riscos. Não se trata de um caso isolado de gestão imprudente. É um fracasso sistêmico que exige uma resposta institucional ampla.

Banco Master
Banco Master. Crédito: Banco Master/Divulgação

Nesse contexto, é cada vez mais importante incorporar análises de cenários econômicos aos processos de fiscalização. Em um ambiente marcado por juros elevados, desaceleração global e maior inadimplência, ativos e fluxos de caixa tornam-se mais sensíveis a choques. Testes tradicionais de estresse, quando aplicados de forma genérica, não captam a deterioração rápida que pode ocorrer em carteiras específicas. Um modelo de supervisão moderna precisa olhar para frente, avaliar riscos condicionais, estimar impactos de choques e antecipar vulnerabilidades, em vez de apenas certificar informações anteriores.

A crise também reforça a necessidade de fortalecer governança, transparência e mecanismos de auditoria independente. A auditoria financeira tradicional é limitada na identificação de riscos econômicos estruturais, especialmente em instituições com operações complexas. Por isso, compliance não pode ser mera formalidade, mas um elemento cultural que oriente decisões, controles internos e divulgação de informações.

É igualmente essencial destacar o papel decisivo da autonomia do Banco Central. Mesmo diante de pressões políticas e resistências de grupos interessados, a autoridade monetária conseguiu investigar, identificar inconsistências e expor a fraude do Master. Foi essa autonomia que garantiu a ação técnica necessária para proteger o sistema financeiro e evitar danos maiores. Fragilizar a independência do Banco Central seria um retrocesso institucional com elevado custo econômico.

Os impactos econômicos da liquidação ainda estão sendo mensurados, mas já se observam efeitos significativos. Fundos de pensão, empresas e investidores com exposição à instituição enfrentam incerteza sobre prazos de recuperação de valores. A confiança nos bancos médios pode ser temporariamente abalada, encarecendo a captação e reduzindo o apetite ao crédito. Produtos complexos, como securitizações e emissões estruturadas, tendem a ser examinados com mais rigor. A crise do Master não é apenas um episódio financeiro. Ela levanta questões estruturais sobre o preparo do país para supervisionar um sistema bancário em transformação.

Esse episódio precisa servir de catalisador para reformas. Supervisão baseada em cenários, auditoria independente mais robusta, governança transparente e autonomia regulatória plena devem ser tratados como pilares essenciais. A estabilidade financeira é um ativo público, e eventos como o do Banco Master lembram que seu cuidado exige instituições fortes, vigilância contínua e capacidade de antecipação. Só assim o Brasil poderá fortalecer seu sistema financeiro e reduzir riscos que afetam não apenas investidores, mas toda a economia.

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