Publicado em 22 de maio de 2021 às 11:37
A Polícia Federal aponta operações financeiras suspeitas de Ricardo Salles a partir do escritório de advocacia que ele tem em sociedade com a mãe. As operações ocorreram durante o período em que exerce o cargo de ministro do Meio Ambiente no governo de Jair Bolsonaro e em meio à suposta prática de crimes na exportação de madeira ilegal. >
A suspeita é descrita pela PF em relatórios que embasam a Operação Akuanduba, autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e deflagrada na última quarta-feira (19). Salles e o presidente do Ibama, Eduardo Bim, são investigados na operação.>
A PF em Brasília fez uso de relatórios de inteligência financeira produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). A decisão de Moraes cita esse material, mas sem detalhamento. Documentos da polícia trazem pormenores dos relatórios de inteligência financeira, chamados RIFs. >
Sobre o RIF relacionado a Salles, a PF diz existir um "conteúdo bastante interessante". O RIF "aponta para operações suspeitas, realizadas nos últimos dois anos, por intermédio do escritório de advocacia em que o ministro Ricardo Salles é sócio com sua genitora". >
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"Obviamente a obtenção dos respectivos anexos e dados mais completos dependerá da autorização judicial emitida por esse STF, mas cremos que a confirmação da simples existência de operações suspeitas a cargo do ministro Salles, no mesmo período dos fatos em apuração, com os demais elementos, permitem que sejam apreciados os pedidos", afirma a PF. >
Moraes autorizou a polícia a ter acesso à íntegra do RIF referente a Salles. Segundo as investigações, há "fortes indícios de envolvimento" do ministro em esquema de facilitação ao contrabando de madeira ao exterior. >
Em nota, o ministério afirmou que "não há como se defender de algo que não se conhece". "Até o momento, o ministro não teve acesso ao inquérito, e tampouco a reportagem indicou quais são os fatos a esclarecer." >
Advogado de Salles, Fernando Augusto Fernandes disse que há uma mistura de fatos anteriores com fatos que não são criminosos. "Há um claro propósito político para induzir o STF em erro." >
Segundo o advogado, as movimentações financeiras do escritório que integra já foram objeto de investigação anterior, com esclarecimentos ao Ministério Público (MP). >
Em São Paulo, a pedido do MP, a Justiça já havia determinado, no ano passado, a quebra do sigilo bancário do escritório de advocacia ligado ao ministro. A ordem judicial incluiu a mãe de Salles, sócia dele. >
A quebra ocorreu no âmbito de um inquérito civil aberto pela Promotoria para apurar a suspeita de enriquecimento ilícito e lavagem de dinheiro no período em que Salles comandou a Secretaria de Meio Ambiente do governo Geraldo Alckmin (PSDB). >
De acordo com o MP, Salles movimentou, entre 2012 e 2017, cerca de R$ 2,8 milhões da conta de seu escritório para sua conta pessoal. Os investigadores afirmaram no pedido enviado à Justiça haver discrepância entre a movimentação financeira e declarações de Imposto de Renda.>
Na Operação Akuanduba, a PF aponta operações financeiras suspeitas de outros cinco investigados, além de Salles. No caso de Olivaldi Alves Borges, que foi diretor de Proteção Ambiental no Ibama e secretário no ministério, houve registro de título com diferença entre o valor de venda de um bem, R$ 180 mil, e o valor venal, R$ 38,2 mil, conforme relatório da PF.>
Segundo a PF, Olivaldi participou de reuniões com o setor madeireiro para flexibilizar a fiscalização e ignorou irregularidades no envio de madeira ao exterior. "Nunca tive imóvel nenhum, portanto não há venda nenhuma", disse Olivaldi.>
Outras operações suspeitas, segundo relatório da PF, envolvem os analistas do Ibama João Riograndense Júnior e Artur Vallinoto. Quanto ao primeiro, é citada uma resistência a fornecer informações sobre operação financeira em 2017. Sobre o segundo, houve comunicado de depósito em espécie de R$ 50 mil. >
Riograndense participou de elaboração de nota técnica que permitiu a assinatura do despacho flexibilizando a fiscalização de exportações de madeira, conforme a PF. Vallinoto emitiu uma autorização de exportação de madeira de forma "flagrantemente ilegal", afirmou a PF, que quer saber se ele cumpriu ordens de superiores. >
"Não tenho nem ideia do que se trata. Estive na PF espontaneamente e não houve nenhum questionamento sobre qualquer operação suspeita em 2017, assim como nunca houve resistência da minha parte em responder sobre qualquer questão", disse Riograndense. >
Vallinoto afirmou: "Estive na PF espontaneamente para prestar todos os esclarecimentos. Tenho um processo movido contra prefeitura e a venda de carro devidamente documentado. Não há nada suspeito." >
No caso da Ebata Produtos Florestais, no Pará, foram oito comunicações de operações suspeitas desde 2019, envolvendo créditos de R$ 5,5 milhões. RIFs registram movimentação de recursos incompatível com o patrimônio e fragmentação de saques. A empresa teria participado de pressão ao Ibama para regularizar cargas de madeira. >
Em nota, a Ebata disse não ter tido acesso ao processo. "Todas as movimentações financeiras da empresa são devidamente registradas e regulares", afirmou. A origem da madeira da empresa é comprovadamente lícita e questões sobre autorização de exportação foram tratadas por associações de classe, não pela empresa, segundo a nota. >
Sobre a Tradelink Madeiras, houve cinco comunicações de operações suspeitas, segundo a PF. Os créditos envolvidos somam R$ 114,5 milhões desde 2019. São apontadas fragmentação de saques em espécie e movimentação de valores incompatível com o faturamento mensal, além de suspeitas em transferências internacionais. >
Contêineres da Tradelink, carregados com madeira brasileira, foram apreendidos nos EUA, sem autorização de exportação, segundo a PF. O mesmo teria ocorrido na Bélgica e na Dinamarca. Representantes da empresa passaram a pressionar o Ibama pela regularização, conforme a PF. >
A Tradelink disse, em nota, não ter sido oficiada da decisão do STF, nem ter tido acesso ao processo. Toda a movimentação de recursos está registrada no Banco Central, afirmou. A superintendência do Ibama no Pará e a presidência do órgão se manifestaram pela legalidade da carga apreendida nos EUA; na Europa, houve liberação após rigorosa auditoria, cita a nota. >
O STF autorizou buscas e apreensões nos endereços de 23 alvos, Salles e Bim entre eles. Também houve quebras de sigilo bancário e fiscal. Nove servidores da área ambiental foram afastados de suas funções por 90 dias, entre eles o presidente do Ibama. >
A PF investiga crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando por agentes públicos e empresários do ramo de madeira, extraída principalmente da Amazônia. >
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