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Reeleição de Maia e Alcolumbre é vetada, mas na Assembleia do ES continua

Reeleição de Maia e Alcolumbre é vetada, mas na Assembleia do ES continua

No Legislativo Estadual pode haver reeleição na mesma legislatura em fevereiro, se o deputado Erick Musso for o escolhido. Decisão do STF sobre Câmara e Senado não é diretamente aplicada ao legislativo estadual

Publicado em 7 de dezembro de 2020 às 22:38

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Presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, Erick Musso
Presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, Erick Musso (Republicanos) deve disputar a reeleição para o próximo biênio. (Tati Beling/Ales)

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) não vão poder concorrer à reeleição para continuar presidindo as Casas legislativas no Congresso. Foi o que decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), neste domingo (06). Mas essa decisão não é estendida automaticamente aos Estados e municípios, segundo especialistas, e portanto, não significa um impedimento para o presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, Erick Musso (Republicanos), tentar se reeleger na próxima eleição da Mesa Diretora, em fevereiro.

O que foi decidido pelo STF para o caso das duas Casas do Congresso Nacional não tem efeito direto e imediato no Poder Legislativo capixaba. No entanto, juristas destacam que as normas locais deveriam estar de acordo com a Constituição Federal, desde sua criação. 

O professor de Direito Constitucional da FDV e doutorando na área, Caleb Salomão explica que o texto do acórdão – decisão final – é que vai definir qual é o alcance da regra constitucional que veda a reeleição nas Casas Legislativas. Com votos com conclusões diferentes dentro da corrente vencedora, é possível que a discussão da tese seja levada a plenário.

"A redação da Constituição Federal é muito clara e impede a reeleição na mesma legislatura e pronto. Mas muitos Estados resolveram não adotar a redação e ser mais permissivos. A decisão [do STF] foi focada no Senado e Câmara", assinala. Salomão detalha que é no relatório final e no acórdão que o STF pode determinar a "modulação dos efeitos", ou seja, como essa decisão deverá ser aplicada.

O Espírito Santo é um dos Estados que possuem, em suas Constituições Estaduais, normas mais "permissivas", que autorizam a reeleição do presidente do Poder Legislativo. A Assembleia frisou, em nota, que o mesmo é feito em outros locais. "A Constituição Estadual e o regimento interno da Assembleia Legislativa do Estado do Espirito Santo permitem a reeleição dos presidentes, sem um limite expresso de mandatos, assim como em outras 20 casas legislativas estaduais", declarou.

A Assembleia Legislativa também destacou que "os votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ratificam a possibilidade de os Estados legislarem diversamente em suas Constituições". Questionada, a Casa explicou que se apoia em decisões anteriores do próprio STF para sustentar que a decisão sobre a Câmara e o Senado não vai afetar o que determina o regimento interno e a Constituição Estadual do Espírito Santo.

Os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber, analisaram, em seus votos, a possibilidade de reflexos desta decisão do STF para outros locais. Weber pontuou, por exemplo, que "apenas a Câmara dos Deputados e o Senado Federal estão expostos àquela restrição, porque é exatamente isso o que regra estipula, e nada mais. A imposição obrigatória desse modelo aos demais entes federados somente seria possível se veiculasse, seu conteúdo, comando de natureza materialmente constitucional, o que não é o caso".

Barroso também assinalou em seu voto que já existem decisões anteriores que tiveram o entendimento de que o que diz a Constituição Federal não se aplica, necessariamente, aos Estados.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DEVE NORTEAR AS DEMAIS, DIZEM ESPECIALISTAS

Mesmo com a interpretação de que outras Casas Legislativas poderiam definir outras normas sobre a reeleição para a presidência, não significa, no entanto, que a Constituição Federal deve ser ignorada. O Direito não é uma ciência exata e, por isso, alguns especialistas divergem ao avaliar o tema. O professor de Direito Constitucional da Ufes, Ricardo Gueiros, explica que existem normas da Constituição Federal que são consideradas "de reprodução obrigatória". Ou seja, aquelas que as Constituições Estaduais precisam estar de acordo, ao legislar sobre temas afins.

É o caso, por exemplo, da divisão dos três poderes. "Assim como na Constituição Federal está escrito que 'são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, Executivo e Judiciário', as Constituições Estaduais não podem dizer outra coisa", exemplifica.

Ao considerar que a norma que proíbe a reeleição dos chefes do Congresso, dentro de uma mesma legislatura, é uma das que são de reprodução obrigatória, o efeito poderia ser estendido ao Estado. É como enxerga o professor Gueiros. "Se no âmbito do Legislativo Federal, na eleição do presidente, não pode haver reeleição, as Constituições dos Estados deveriam seguir a mesma diretriz, o mesmo raciocínio lógico", argumenta. 

O posicionamento converge com o do advogado constitucionalista Cláudio Colnago. Para ele, as Casas que legislaram de forma diferente estão em desconformidade com a regra presente na Constituição Federal, que tem peso maior do que o que é determinado pelas legislações estaduais. "A Constituição Federal permitiu a reeleição em situações específicas, como no caso de legislaturas diferentes. Ela não permitiu reeleição indeterminadas. Entendo que a Constituição Estadual precisa observar pelo menos as restrições da Federal", aponta.

Em outros Estados, as brechas jurídicas e as manobras políticas garantiram o comando das Assembleias a parlamentares por décadas. É o caso do deputado estadual Themístocles Filho (MDB), que completou 18 anos ininterruptos no cargo no Piauí, e do deputado estadual Jorge Picciani (MDB), que comandou a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro por 12 anos, até ser preso em novembro de 2017.

Apenas cinco estados impedem a reeleição de presidentes em assembleias legislativas: São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco.

Os especialistas esclareceram, no entanto, que para mudar a situação na Assembleia Legislativa seria necessário alterar a Constituição Estadual, por iniciativa dos próprios deputados, por meio de uma emenda.

Outra possibilidade é se houver uma ação na Justiça para questionar se o caso específico do Espírito Santo não fere a Constituição. Isso ocorreu em 2019 quando o deputado Erick Musso conseguiu aprovar uma emenda  à Constituição Estadual que permitia que o presidente da Mesa convocasse a eleição em qualquer data. Com a norma aprovada, ele tentou antecipar a eleição da Mesa Diretora para o biênio de 2021/2022 em mais de 400 dias. 

Na ocasião, houve uma eleição surpresa, realizada dois dias depois da aprovação da emenda à Constituição Estadual, e Musso foi reeleito para o biênio seguinte mais de um ano antes do previsto.  A Justiça foi acionada pela OAB-ES e a emenda foi considerada inconstitucional. Em uma última decisão sobre o caso, em julho, o Tribunal Regional Federal da 2ª região determinou que a eleição seja realizada no dia 1º de fevereiro de 2021, conforme determina a legislação. 

CONSTITUIÇÃO DO ESPÍRITO SANTO JÁ SOFREU SETE ALTERAÇÕES

A emenda que estabeleceu que o presidente da Mesa Diretora da Assembleia no Espírito Santo pode ser reeleito, sem limite de mandatos, é do ano de 2016, quando Theodorico Ferraço (DEM) era presidente da Casa. Ferraço, inclusive, ficou sete anos na cadeira. 

Antes disso, no entanto, outras seis alterações foram feitas no texto que fala sobre as eleições da presidência da Casa. As duas primeiras ainda em 1998, quando José Carlos Gratz era presidente da Assembleia. Assinada no dia 3 de dezembro daquele ano, a emenda adequava o texto à Constituição Federal, determinando que ficava "vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente". No mesmo mês, no entanto, no dia 14, uma nova emenda alterou a norma novamente, destacando que estava "permitida a recondução para o mesmo cargo no biênio imediatamente subsequente".

Depois, mais cinco alterações foram feitas. Veja quais foram.

  • Em julho de 2000, Gratz, ainda presidente da Casa, alterou o texto para que a eleição da Mesa Diretora para o segundo biênio da legislatura fosse realizada em 15 de dezembro, e não mais 1º de fevereiro. A permissão de reeleição foi mantida.
  • Em abril de 2003, já com Carlos Vereza (PT) dirigindo a Casa, o texto foi alterado para retirar o que havia sido alterado por Gratz e ficou proibida a reeleição, "inclusive na legislatura seguinte". 
  • Em dezembro de 2012, primeiro ano de Theodorico Ferraço na presidência da Casa, foi adicionado um inciso ao artigo 58, determinando que a proibição de reeleição não valeria para "mandato-tampão", ou seja, quando o "candidato que tenha exercido mandato de membro da Mesa Diretora no biênio anterior ao que está em disputa, tenha sido por período inferior a 365 dias". 
  • Em dezembro de 2014, ainda com Theodorico, uma nova emenda autorizou a reeleição, desde que não fosse dentro da mesma legislatura. Ou seja, "ficando permitida a recondução para o mesmo cargo no biênio imediatamente subsequente da legislatura seguinte".
  • E por fim, em 2016, a última emenda foi feita, estabelecendo que ao presidente da Casa ficava permitida a recondução ao cargo no biênio seguinte, sem limite de mandatos ou regras para reeleição.

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