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Constituição do ES é a 4ª com mais emendas do país

Constituição do ES é a 4ª com mais emendas do país

A maior legislação em nível estadual completou 30 anos e recebeu duas emendas polêmicas em seu texto nas últimas semanas de 2019

Publicado em 24 de dezembro de 2019 às 05:00

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Constituição do Estado do Espírito Santo já possui 114 emendas. Duas foram feitas em 2019. (Letícia Gonçalves)

As duas Propostas de Emenda à Constituição Estadual (PECs) aprovadas pela Assembleia Legislativa nas últimas semanas de 2019 estiveram no centro de um dos momentos de maior destaque dos trabalhos na Casa neste ano, tanto pela forma como a votação foi realizada quanto pelas alterações que trouxeram à legislação maior do Estado. E com elas, a Constituição Estadual se manteve no topo do ranking das mais emendadas do Brasil, registrando 114 alterações ao longo de seus 30 anos de elaboração, completados em 5 de outubro deste ano.

A Constituição do Espírito Santo é a 4ª com o maior número de emendas do país e possui, inclusive, mais alterações do que a Constituição Federal, que tem 105. Agora, está próxima de alcançar a do Amazonas, que possui 115 emendas, e a Lei Orgânica do Distrito Federal (que equivale a uma Constituição), com 117. A mais emendada é a de Rondônia, com 136 emendas, apesar de o Estado da Região Norte ser um dos mais jovens do país, reconhecido somente em 1981.

A Constituição do Estado de São Paulo, que possui a maior população do país, não teve nem a metade das emendas do Espírito Santo: foram 47 até hoje. As menos modificadas foram a da Bahia, com 25 emendas, e a do Rio Grande do Norte, com 17.

As duas últimas emendas à Constituição do Espírito Santo foram aprovadas no dia 25 de novembro e trataram de dois temas que frequentemente são mexidos na Carta: a Previdência Estadual e a eleição da Mesa Diretora da Assembleia. A emenda que alterou as regras das aposentadorias dos servidores do Estado foi a 8ª feita para tratar do tema e buscou adaptar o texto estadual à reforma da Previdência feita na Constituição Federal.

Já as regras para a eleição da Mesa Diretora tiveram a 7ª modificação. A primeira foi em 1998. Originalmente, o texto dizia que “A Assembleia Legislativa reunir-se-á, em sessão preparatória, a 1º de fevereiro, para, nos primeiro e terceiro anos da legislatura, eleger a Mesa, cujos membros terão um mandato de dois anos, proibida a recondução para o mesmo cargo no biênio imediatamente subsequente”.

Com esta última alteração, foi inserido um novo parágrafo, determinando que antes do início do terceiro ano de cada legislatura, a eleição seria realizada em data e hora previamente designadas pelo Presidente da Assembleia. Hoje, por força de decisão judicial, este dispositivo está suspenso e não pode produzir efeitos, após intensas polêmicas e críticas apresentadas por setores e entidades da sociedade organizada.

A votação das PECs que inseriram essas alterações foi atípica. Esses projetos precisam ser votados em dois turnos, com um intervalo de duas sessões entre eles, justamente por se tratar da legislação de maior hierarquia do Estado. No entanto, essas PECs foram votadas em primeiro e segundo turno em um mesmo dia, após uma sequência de seis sessões convocadas com poucas horas ou minutos de intervalo entre uma e outra.

Para ser aprovada, uma PEC precisa ser aprovada por três quintos dos membros da Assembleia, ou seja, 18 deputados. Em seguida, a emenda é promulgada pela Mesa Diretora, sem necessidade de sanção do Executivo.

Há hoje 30 PECs protocoladas no Legislativo. Entre elas, há algumas que tratam de normas internas da Assembleia, como a proposição de Hércules Silveira (MDB) para pôr fim ao recesso parlamentar de 17 de julho a 1º de agosto. Há também uma proposta de autoria de 11 deputados, para estabelecer a obrigatoriedade de elaboração de plano de carreira para o magistério, que equipare a remuneração dos professores com a dos demais profissionais com escolaridade equivalente. Já o deputado Carlos Von (Avante) propôs alterar uma das seções mais protegidas da Constituição, incluindo entre as “garantias fundamentais” o direito à liberdade econômica.

CONTEÚDO DAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS

Na maior parte do texto, a Constituição Estadual parece uma cópia da Constituição Federal. Por isso, algumas emendas trataram de assuntos que já constam na Constituição Federal. Um exemplo disso é que, em 2011, aprovou-se uma emenda de Gildevan Fernandes (então no MDB) permitindo a reeleição ao cargo de governador, sendo que desde 1997 uma emenda à Constituição Federal autorizou a medida.

Em 2012, houve uma outra emenda para estabelecer as datas que devem ocorrer as eleições de prefeito e vice, e a data de suas posses.

Por essa necessidade de adequações, alguns Estados realizaram uma repaginada geral em suas Constituições. Em novembro deste ano, a Assembleia da Paraíba fez uma reforma para corrigir a legislação, que tinha 156 dispositivos com erros de pontuação, de digitação, de grafia, redação ou técnica legislativa. Os deputados paraibanos defenderam, na justificativa da proposta, que “a revisão do texto constitucional mostrou-se necessária devido à evolução da linguística e à identificação de equívocos formais de redação.”

O Rio Grande do Norte também alterou mais de 20 artigos para fazer a compatibilização da Constituição Estadual com a Constituição Federal e deixá-lo de acordo com jurisprudências hoje vigentes.

O RISCOS DO EXCESSO DE EMENDAS

A possibilidade de alterar a Constituição decorre de uma concepção americana, de que "os mortos não podem permanentemente querer governar os vivos". Por isso, o papel principalmente do legislador é o de fazer atualizações nas constituições quando a situação cultural demandar, como explica o professor de Direito Constitucional da FDV, Caleb Salomão. No entanto, ele avalia que um “emendismo” excessivo faz com que a Constituição pareça uma verdadeira colcha de retalhos.

“A constante alteração no texto deixa-o instável e perde-se um pouco da previsibilidade que se espera do Direito. Também observamos um mau uso do poder constituinte para promover certos interesses. As emendas exigem um procedimento mais complexo justamente para dificultar a manipulação do conteúdo da norma pelos governantes de plantão, que revelam uma espécie de subdesenvolvimento cultural, de querer moldar as leis de acordo com a vontade dos grupos políticos”, analisa.

Outra causa para tantas emendas é por a Constituição tratar de muitos assuntos que poderiam estar na legislação comum, mas que vão para a Carta para serem mais difíceis de serem alterados. “Há assuntos que se não estivessem na Constituição, seriam mudados a cada governo. Mas mesmo com o rito mais complexo, parlamentares conseguem alterá-la sem dificuldades, inclusive em ritmo célere. Mas esses procedimentos muito corridos acabam alijando a opinião pública do debate. Toda vez que se aprova de forma muito rápida, por trás há uma grande força motora, ou com poder político ou econômico. E o destinatário da norma, que é o povo, sequer é ouvido”, critica.

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