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MPES instaura inquérito para apurar fechamento de escolas em Cariacica

MPES instaura inquérito para apurar fechamento de escolas em Cariacica

Familiares relatam que escolas onde estudantes deverão se matricular ficam distantes e veem filhos desmotivados a seguir estudando em 2024

Publicado em 4 de dezembro de 2023 às 18:42

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CMEI
CMEI Larissa Pereira Batista, em Bela Aurora, Cariacica, deixará de existir em 2024. (Carlos Alberto Silva)

Ministério Público do Espírito Santo (MPES) instaurou um inquérito civil para apurar uma reorganização escolar promovida pela Prefeitura de Cariacica. Os pais alegam que cinco escolas e uma creche estão sendo desativadas e os filhos terão de andar de 20 a 30 minutos até outros colégios. O município, no entanto, diz que essas escolas serão "nucleadas", termo usado quando estudantes de uma unidade são transferidos para outra. 

As escolas municipais que terão seus prédios fechados são: General Tibúrcio, em Porto de Santana; Adalberto Queiroz, em Moxuara; Wellington Ferreira Borges, em Antônio Ferreira Borges; Olivino Rocha, em São João Batista; Jones dos Santos Neves, em Boa Sorte, além do Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei) Larissa Pereira Batista, em Bela Aurora.

A Secretaria Municipal de Educação (Seme) nega o fechamento de escolas. Conforme informações do órgão, será realizado um processo de nucleação, isto é, pequenas unidades de ensino que contam com um número reduzido de alunos e não apresentam condições adequadas para o desenvolvimento das atividades pedagógicas propostas vão ser agrupadas.

"Diante disso, é feita uma avaliação dentro da rede em busca de outra escola no mesmo perímetro e que disponha de capacidade e estrutura para absorver os alunos e promover uma educação de melhor qualidade", ressalta. 

MPES instaura inquérito para apurar fechamento de escolas em Cariacica

A pasta citou que o objetivo é aumentar o número de novas vagas para o ano letivo de 2024 em 4 mil para o ensino fundamental, sendo 2,5 mil para tempo parcial e 1,5 mil para tempo integral. Confira o posicionamento na íntegra no fim da matéria.

O que é escola "nucleada"

A doutora em Educação e professora Cleonara Maria Schwartz, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), explica que o conceito de nucleação na história da educação se referia à organização do ensino no meio rural por meio de escolas-núcleo, que se diferenciavam da organização das escolas multisseriadas. "Eles usavam o termo para dizer que os estudantes das escolas multisseriadas que eram extintas seriam 'nucleados' em escolas localizadas nas áreas urbanas", disse. 

No entanto, em relação à reorganização de Cariacica, ela acredita que o contexto é outro. "Parece-me que estão utilizando o termo nucleação para se referir à transferência de estudantes para outras unidades de ensino para fins de construção de novos prédios escolares e também para encerrar escolas", observa. 

Para onde vão os estudantes? 

  • CMEI Tarcílio Montanari (recebe alunos do CMEI Larissa Pereira Batista, em Bela Aurora);
  • EMEF Maria Guilhermina de Castro (recebe alunos da EMEF Adalberto Queiroz, no bairro Bubu);
  • EMEF João Pedro da Silva (recebe alunos da EMEF General Tibúrcio, em Porto de Santana) ;
  • EMEF Amenóphis de Assis (recebe alunos da EMEF Jones Santos Neves, em Boa Sorte);
  • EEEFM Augusto Luciano (recebe alunos da EMEF Olivino Rocha, em Cariacica-Sede);
  • EMEF Valdici Alves Baier (recebe alunos da EMEF Wellington Ferreira Borges, no bairro Antônio Ferreira Borges)

O fechamento da General Tibúrcio, em Porto de Santana, foi alvo de manifestação de famílias de crianças que estudam no colégio no último dia 17 de novembro. Sobre essa unidade, o município explicou que houve uma reunião com a comunidade e foi esclarecido que o prédio não tem mais condições físicas para receber os alunos.

No bairro Bela Aurora, a prefeitura anunciou a nucleação do CMEI Larissa Pereira Batista com a justificativa de que o espaço atual é inadequado. "Tanto o prédio da General Tibúrcio quanto o do Larissa Batista Pereira serão destinados futuramente para outra finalidade", afirma a prefeitura.

Sobre as outras unidades, a prefeitura diz que os prédios serão avaliados pela administração e aqueles que tiverem condições de receber outro equipamento público passarão por adequações necessárias para a oferta de outro serviço à população.

A prefeitura garante ainda que "todas essas escolas têm condições de absorver os alunos e apresentam infraestrutura totalmente adequada, seguindo rigorosamente as legislações vigentes, que determinam 25 alunos por sala nos 1º, 2º e 3º anos do ensino fundamental e 30 alunos por sala nos 4º e 5º anos do ensino fundamental."

Escola
Escola General Tibúrcio, em Porto de Santana, Cariacica, também não terá aulas em 2024 e estudantes serão encaminhados para a Escola João Pedro da Silva . (Carlos Alberto Silva)

Famílias preocupadas

Em conversa com a reportagem de A Gazeta, a irmã de uma criança de 14 anos disse que os estudantes da General Tibúrcio estão sendo enviados para a João Pedro Silva, a seis minutos de distância da escola que será fechada. Mas há crianças da João Pedro Silva sendo orientadas a estudar em Porto Novo, a 20 minutos de onde moram.  

"Estão colocando alguns estudantes da João Pedro da Silva em outras unidades mais longe, é a própria Secretaria de Educação que tem feito o remanejamento sem consultar os pais. Meu irmão tem 14 anos e estuda desde muito pequeno ali, querem mandar ele para Porto Novo e dizem que, se não fizer assim, ele vai ficar sem estudar", reclama.

Essa é a mesma reclamação da mãe de outro estudante, manifestada em uma entrevista para TV Gazeta. "Eu ainda moro um pouco mais próximo, a 4km, mas tem gente aqui que vai a 10km. Como virão essas crianças de 9, 10 anos nesse sol quente, nesse calor, a pé? Ônibus tem que pagar, topic é R$ 200,00. Como faz para manter?", questiona Rita de Cássia. 

Rita de Cássia, mãe de estudante, reclama do fechamento de escolas em Cariacica
Rita de Cássia, mãe de estudante, reclama do fechamento de escolas em Cariacica. (Wagner Martins)

Mudanças sem diálogo, diz mãe 

O mesmo ocorre com a recuperadora de crédito Alessandra Aparecida Pereira, de 38 anos. "Os meus filhos são os mais afetados, estudam no João Pedro da Silva. A General Tibúrcio está sendo fechada e a secretaria de educação está alegando que ela não tem estrutura para receber mais as crianças, mas ela tem 53 anos no bairro e sempre atendeu Porto de Santana", ressalta. 

"No início de novembro, a direção da João Pedro recebeu um comunicado que a General fecharia e as crianças dessa escola iriam para a João Pedro, mas essa não comporta todos os alunos. Meu filho vai ter que estudar em Itacibá. Imagina um pai ter que levar os filhos para o bairro Aparecida ou para Porto Novo", afirma Alessandra. Nesse caso, a distância entre a General Tibúrcio (Porto de Santana) e Itacibá é de meia hora a pé.

Diferentemente do que a prefeitura alega, Alessandra diz que não houve diálogo com a comunidade. 

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Antes de fechar as escolas tinham que conhecer a realidade das escolas, do bairro

Alessandra Aparecida Pereira
Recuperadora de crédito
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"A General precisa de uma reforma, mas não está caindo aos pedaços. Não sei por que estão alegando que ela não tem condições de ter aula. Todos da região gostam, todos estão lutando para manter as aulas nela. Eu não sei como vou fazer para levar meu filho em Itacibá, não sei como vai ser, saio para trabalhar 6h da manhã e chego 6h da tarde", desabafa.

Alessandra afirma que os filhos estão desmotivados. "Vão para uma escola onde não conhecem ninguém, nem professor, nem diretor, os amigos. Tem criança que está chorando na porta da escola, de desespero, porque têm bairros que são perigosos, com guerra de tráfico. Como vamos deixar nossos filhos em uma escola dessa? Pensei que talvez eu tenha que parar de trabalhar para cuidar dos meus filhos."

Na avaliação da professora Cleonara Maria Schwartz, a reorganização de escolas ou quaisquer outras alterações que afetam a vida dos estudantes, familiares e profissionais da educação deveriam obedecer ao princípio constitucional da gestão democrática. "Deveriam ser discutidos com as comunidades escolares para que não houvesse impasses e incômodos", ressalta. 

"Toda gestão educacional, quando é dialógica, estabelece canais de participação de todos os segmentos da comunidade escolar, ganha no sentido de eliminar impasses para a efetivação de suas proposições por possibilitarem definições conjuntas." 

Ministério Público apura fechamento 

Os familiares ouvidos pela reportagem acionaram o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) para apurar o fechamento das escolas. Procurado por A Gazeta, o órgão confirmou o acionamento e disse que já foi instaurado inquérito civil para apuração dos fatos referentes à reorganização da rede municipal de ensino de Cariacica, para a posterior adoção das medidas cabíveis.

Em paralelo, uma equipe técnica do Centro de Apoio Operacional de Implantação das Políticas de Educação (Caope) do MPES iniciou, na quinta-feira (30), uma inspeção nas escolas municipais, para obter informações preliminares a respeito das unidades de ensino referenciadas.

Posicionamento da prefeitura

"A Secretaria de Educação de Cariacica informa que não haverá fechamento de escolas no município. Ao contrário, a rede de ensino está sendo reorganizada para o ano letivo de 2024 com o objetivo de garantir mais qualidade na educação oferecida na cidade, além de promover uma ampliação significativa no número de vagas: 4 mil para o ensino fundamental, sendo 2,5 mil para tempo parcial e 1,5 mil para tempo integral. Com essa reorganização da rede, todos os direitos dos profissionais de educação e dos nossos mais de 50 mil alunos estão garantidos.

Como parte dessa reorganização, seis escolas estão sendo nucleadas e quatro municipalizadas para um melhor atendimento aos alunos. As escolas que serão nucleadas são: CMEI Larissa Pereira Batista; EMEF Adalberto Queiroz; EMEF General Tibúrcio; EMEF Jones dos Santos Neves; EMEF Olivino Rocha; e EMEF Wellington Ferreira Borges. Não haverá nenhuma modificação no CMEI Elisa Leal Bezerra.

Já as quatro escolas estratégicas do Estado que serão municipalizadas são: EEFM Teotônio Brandão Vilela; EEFM Rosa Maria Reis; EEFM Prof. Augusto Luciano; e EEFM Nossa Senhora Aparecida. Todas essas escolas têm condições de absorver os alunos e apresentam infraestrutura totalmente adequada, seguindo rigorosamente as legislações vigentes, que determinam 25 alunos por sala nos 1º, 2º e 3º anos do ensino fundamental e 30 alunos por sala nos 4º e 5º anos do ensino fundamental.

Ainda dentro do processo de reorganização, outra novidade é a construção do novo prédio da EMEF Nilton Gomes, que funciona no bairro Cruzeiro do Sul e que terá 10 salas, com capacidade para 600 novas matrículas. A EMEF Nilton Gomes atual será demolida e no mesmo terreno será construída uma nova escola com espaços adequados, para aulas de educação física e prática de esportes, com ambientação e climatização adequados, dentro dos padrões necessários para o atendimento da demanda de alunos de 1º a 9º anos do ensino fundamental. É uma obra aguardada há muitos anos por toda a comunidade escolar e que será realizada a partir de 2024, assim que for concluído o processo de licitação. A obra será realizada com recursos do Fundo Estadual de Apoio à Ampliação e Melhoria das Condições de Oferta da Educação Infantil e Ensino Fundamental no Espírito Santo (Funpaes), uma vez que o município foi contemplado pelo edital nº 002/2022."

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