Repórter / [email protected]
Publicado em 18 de setembro de 2021 às 08:13
Dados do Observatório da Segurança Pública do Espírito Santo, divulgados pelo governo do Estado, apontam que o número de feminicídios registrados de janeiro a julho deste ano corresponde a 80,7% dos casos contabilizados durante os 12 meses de 2020. >
Feminicídio é o assassinato de uma mulher cometido em razão do gênero. Com base nesta característica, nos sete primeiros meses de 2021, a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) classificou 21 ocorrências.>
No mesmo período do ano passado, foram 16. No entanto, entre janeiro e dezembro de 2020, 26 mulheres foram vítimas a partir dessa tipificação de crime. Por isso, os dados deste ano representam 80,7% dos últimos 12 meses.>
A técnica em enfermagem Leidiane Erqui Tonetti Andreão, de 36 anos, está nesta lista da violência. Ela foi assassinada a tiros na frente da filha, em Aracuí, interior de Castelo, no Sul do Estado, em maio deste ano. O marido dela, o empresário Wellington Denadai Andreão, de 41 anos, foi preso por suspeita do crime. >
>
No mês anterior, quem teve os sonhos interrompidos foi Raissa da Silva Souza, de 15 anos. A adolescente foi assassinada dentro de casa com um tiro na cabeça no bairro Flexal, em Cariacica, no último dia 24 de abril. Um ex-namorado é o principal suspeito.>
Na última quarta-feira (15), Charlene de Lemes Gonçalves, de 40 anos, e a filha dela, Ysaquiely Junia Gonçalves de Araújo, de 11 anos, foram mortas a facadas no bairro Filemon Tenório, em Marataízes, litoral Sul do Espírito Santo.>
O ex-companheiro de Charlene, Michael Prates Garcia, de 31 anos, foi preso em flagrante por suspeita de ter praticado o crime. O crime é um dos atos violentos contra as mulheres que devem ser registrados como feminicídio pela Polícia Civil.>
Quando comparados os homicídios dolosos contra as mulheres, os indicadores mostram que 75 capixabas tiveram a vida interrompida no Estado. De janeiro a julho deste ano foram registrados 38 assassinatos. No mesmo período do ano passado, 42.>
Na avaliação da professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Celina Lima, os casos de feminicídio aumentaram no Brasil em função da vulnerabilidade das mulheres e da impunidade. Ela atua no Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da instituição. >
"O feminicídio é um crime que ocorre no contexto familiar. Apesar da Lei Maria da Penha, as mulheres são assassinadas e os homens não são punidos com rigor, não são punidos na hora.">
Celina Lima
Professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) ePara proteger as mulheres, Lima defende a criação ou fortalecimento de políticas públicas eficazes. "Falta a formação de uma rede de apoio consistente para que a mulher saiba onde poderá recorrer para buscar assistência, seja ela qual for", ressalta.>
Analisando os dados do Observatório, Henrique Herkenhoff, professor do Mestrado de Segurança Pública da UVV, somou os dados gerais disponibilizados. Contando os homicídios dolosos e feminicídios, foram 58 em 2020 contra 59 em 2021.>
"O total de homicídios tendo a mulher como vítima permaneceu estável, indicando que não houve crescimento da violência doméstica, mas um entendimento mais 'feminista' por parte da Polícia Civil, que passou a categorizar como feminicídio crimes que antes seriam relatados como homicídio comum", destaca Herkenhoff.>
A Sesp foi questionada sobre quais fatores contribuíram para o aumento de casos de feminicídio neste mesmo intervalo de sete meses, de um ano para outro. A delegada Michelle Meira, coordenadora da Gerência de Proteção à Mulher (GPM) da secretaria, explicou que esse tipo de crime acontece devido a situações ligadas diretamente ao comportamento da sociedade, principalmente, dos homens.>
"É uma pergunta bem complicada de se responder porque o feminicídio é um crime de extrema proximidade. Infelizmente, acontece devido a algumas situações que estão ligadas diretamente ao comportamento da nossa sociedade e, principalmente, dos homens como a cultura do machismo e o sentimento de posse em relação às mulheres", avalia.>
A delegada ressalta que o Estado dispõe de serviços em que a mulher pode buscar apoio, em casos de violência. A Divisão Especializada da Mulher abarca todas as vias de atendimento de forma integrada às Delegacias de Atendimento à Mulher (Deams).>
Na Grande Vitória, há ainda o Plantão Especializado da Mulher (PEM) e a Delegacia de Homicídios e Proteção à Mulher (DHPM), responsável pela apuração dos homicídios e feminicídios.>
No Estado, há 14 delegacias especializadas para atender mulheres vítimas de violência. Na delegacia, a mulher pode solicitar a medida protetiva para afastamento do agressor. >
A decisão, no entanto, cabe à Justiça, mas é a partir desse registro junto à Polícia Civil que são feitos os encaminhamentos. O pedido de proteção pode incluir a Patrulha Maria da Penha, serviço oferecido pela Polícia Militar. >
Michelle conta que os policiais militares da Patrulha realizam as chamadas visitas tranquilizadoras, que não têm frequência, nem quantidade preestabelecida; o atendimento varia conforme cada caso. >
"Esses conflitos acontecem dentro do seio familiar e devido ao comportamento do homem não aceitar, muitas vezes, o fim do relacionamento, em ter a mulher como sua propriedade. Infelizmente, enquanto a gente não conseguir virar a chave e mudar esse tipo de postura na sociedade, esses atos vão continuar acontecendo", destaca. >
Não é qualquer assassinato de mulher que se enquadra como feminicídio. Se ela for morta em um assalto, por exemplo, o crime será o de latrocínio. Mas se ela morreu pelas mãos do ex-parceiro ou por causa do rompimento da relação, por exemplo, esse crime pode ser considerado feminicídio. >
O Código Penal estabelece pena de reclusão de 12 a 30 anos para o homicídio contra a mulher por razões da condição de sexo feminino (feminicídio). A punição se equipara à aplicada em caso de homicídio qualificado. >
Conheça as principais situações que levam a polícia a enquadrar uma ocorrência como feminicídio: >
Violência doméstica ou familiar
Algumas mulheres vítimas de violência doméstica acabam assassinadas dentro de casa pelos maridos, companheiros ou outros familiares durante os episódios de agressão. A motivação, em geral, é o machismo.
Sentimento de posse por ex
Algumas mulheres, após terminar namoros ou casamentos, acabam sendo ameaçadas até que são mortas pelos ex-parceiros. Geralmente esse tipo de crime ocorre porque o autor tem o sentimento de propriedade (se considera 'dono' da vítima), quer se vingar após uma rejeição ou por ciúmes. É um assassinato motivado pelo ódio contra essa mulher.
Misoginia e discriminação
Há também o assassinato pela discriminação de gênero e misoginia. Isso ocorre quando o assassino tem aversão às mulheres. Esse sentimento alimenta o desejo de ser cruel com o sexo feminino. Em alguns casos envolve também violência sexual. São cometidos, algumas vezes, por desconhecidos ou por pessoas que a vítima até tem contato, mas apenas como amigo, na vizinhança ou por causa de uma relação profissional.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta