Brasil precisa recuperar tempo perdido para garantir vacinação

Primeira reunião do Comitê de Crise, comandado por Jair Bolsonaro, só teve sua primeira reunião na semana passada, quase 400 dias após o primeiro caso de coronavírus no país. Falta de coordenação nacional tem cobrado preço alto

Publicado em 05/04/2021 às 02h00
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, em primeira reunião do Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento da Pandemia
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, em primeira reunião do Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento da Pandemia. Crédito: Tony Winston/MS

Em um novo ajuste de cálculo, o Ministério da Saúde informou que a previsão é de receber em abril pouco mais da metade das vacinas contra a Covid-19 anteriormente programadas. Das 47,3 milhões de doses esperadas, apenas 25,5 milhões serão distribuídas. É o terceiro mês consecutivo que a pasta reduz o cronograma de vacinação, deixando Estados e municípios, responsáveis por executar o Plano Nacional de Imunização, em meio a uma nuvem de incertezas.

Com a saúde em colapso e recordes frequentes de mortes, o Brasil registrou em março o mês mais letal da pandemia. Ultrapassou os 66 mil óbitos, mais do que o dobro do contabilizado em julho de 2020, pior mês até então. No Espírito Santo, o aumento das mortes pelo Sars-Cov-2 em março dobrou em relação a fevereiro. Esse cenário, somado à circulação de variantes mais transmissíveis e ao risco de falta de insumos para atendimento aos pacientes, tem elevado o nível de cobrança para que o governo federal acelere o ritmo da vacinação, única saída para a crise.

Em contratos, o Brasil já tem doses suficientes para imunizar toda a população até o final de 2021. Mas há um abismo entre os acordos e a realidade, e especialistas apontam que, se for mantido o mesmo passo, o controle efetivo da doença só seria possível em três anos. Com 37 mil salas de vacinação, o país poderia vacinar até 2,4 milhões de pessoas por dia. No entanto, desde o início da campanha, em janeiro, apenas no dia 31 de março conseguiu superar a marca de um milhão de aplicações em 24h.

Do total de doses recebidas até o momento, pouco mais de 60% já foram efetivamente aplicadas. Essa baixa porcentagem fez com parte das críticas à lentidão da vacinação no país fosse direcionada a Estados e municípios, que estão na ponta do processo, mas o fato é que a morosidade recai sobre o Ministério da Saúde, devido à aquisição parca e à distribuição irregular de imunizantes. O novo ministro, Marcelo Queiroga, admitiu que o problema é a falta de vacina.

Duas são as causas da escassez: o Brasil ignorou por meses os produtos de farmacêuticas importantes, como a Pfizer e a Janssen, e agora está no final da fila para o recebimento. Outras, como a indiana Covaxin e a russa Sputnik V, nem sequer receberam ainda autorização para uso emergencial. O Espírito Santo recebeu na última semana mais 168.950 doses de vacinas, sendo 13.750 da Astrazeneca e 155.200 da Coronavac. É uma excelente notícia, mas mesmo os imunizantes com envase nacional vem encontrando dificuldades para encontrar insumos no saturado mercado internacional.

Além dos problemas de compra e logística, que já eram apontados desde o ano passado com a demora do governo federal em negociar com fabricantes e elaborar um PNI robusto, e não uma mera carta de intenções, o Brasil ainda enfrenta toda sorte de vicissitudes. São doses perdidas por erro em armazenamento, roubos de imunizantes à mão armada, supostas vacinações clandestinas e tentativas de golpes milionários em prefeituras e até no próprio Ministério da Saúde. É um caos que amplia a tragédia.

A tragédia só não é maior devido à mobilização de Estados e municípios, que buscam a negociação direta com farmacêuticas, e até mesmo pela sociedade civil. A iniciativa Unidos pela Vacina, comandada pela empresária Luiza Trajano, por exemplo, já angariou aviões e caminhões para o transporte de doses, frigoríficos para armazenamento, pátios, aparelhos de ar-condicionado e mão de obra para a vacinação. Deve concluir em breve um levantamento que seria obrigação do Ministério da Saúde: um mapa completo da estrutura dos 5.568 municípios brasileiros, de geladeiras a seringas.

A incompetência do governo federal na gestão da crise já ficou provada em mais de uma ocasião. A mais recente e flagrante é ver que o Comitê de Crise, comandado pelo Planalto, só teve sua primeira reunião 399 dias após o primeiro caso de coronavírus no Brasil, na semana passada. Em vez do alinhamento esperado, Jair Bolsonaro saiu do encontro, no qual ficou maior parte do tempo sem máscara, criticando as quarentenas decretadas por governadores e prefeitos. Um ano depois da pandemia, mostra que pouco aprendeu com a ciência e a experiência. Resta ao país torcer para que, apesar do presidente e graças aos gestores de bom senso, as vacinas cheguem aos braços da população.

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