Publicado em 4 de novembro de 2021 às 08:48
Numa vitória apertada do governo, a Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (3), em primeiro turno, o texto-base da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, que permite a expansão de gastos públicos e viabiliza a ampliação do Auxílio Brasil prometido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em ano eleitoral.>
O placar foi de 312 votos a favor da proposta, 144 contrários e 57 deputados não votaram. Eram necessários 308 votos para que a PEC recebesse o aval da Casa. >
A PEC é a principal aposta do governo para viabilizar o programa social Auxílio Brasil — anunciado pelo governo para suceder o Bolsa Família. A proposta adia o pagamento de precatórios (dívidas do governo já reconhecidas pela Justiça), a fim de viabilizar a concessão de pelo menos R$ 400 mensais aos beneficiários do novo programa no ano eleitoral de 2022.>
O plenário ainda precisa analisar os destaques, que são tentativas de mudança em pontos do texto. Segundo o presidente da Câmara, Arthur Lira (pp-AL), deve haver uma reunião na manhã desta quinta para decidir sobre o tema, mas o mais provável é que a votação dos destaques e do segundo turno fique para terça (9). >
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A proposta também passará por votação em segundo turno na Câmara. Depois, o texto seguirá para o Senado, onde precisa do apoio de 49 dos 81 senadores em dois turnos. >
Para aprovar a proposta que dribla o teto de gastos (regra que limita as despesas públicas), o governo teve de ceder à pressão de partidos políticos, modificar o texto, e chegou a ameaçar retaliar as emendas de deputados que votassem contra o plano do Palácio do Planalto. >
Aliado do governo, Lira flexibilizou algumas regras e editou um ato para permitir que deputados que estão em viagem autorizada pela Câmara pudessem votar remotamente. Isso beneficiou o plano patrocinado por Bolsonaro. >
A oposição se dividiu na votação. O PDT trocou de lado e passou a apoiar a PEC nesta quinta. Com 15 votos a favor e seis contra, o partido de Ciro Gomes foi decisivo para que a proposta fosse aprovada na Câmara.>
Na manhã desta quinta-feira, Ciro até então anunciado como nome da sigla para concorrer à Presidência em 2022, informou a suspensão de sua pré-candidatura.>
Em nota divulgada nesta manhã, Ciro afirmou que a posição da bancada de seu partido o deixou com apenas um caminho a seguir: deixar sua pré-candidatura em suspenso até que o PDT reavalie sua posição a favor da PEC. >
"Há momentos em que a vida nos traz surpresas fortemente negativas e nos coloca graves desafios", declarou o ex-governador do Ceará. >
"É o que sinto, neste momento, ao deparar-me com a decisão de parte substantiva da bancada do PDT de apoiar a famigerada PEC dos Precatórios." >
De acordo com Ciro, no entanto, o partido ainda tem um "instrumento definitivo nas mãos" em relação à votação da PEC em segundo turno, para reverter a decisão e "voltarmos ao rumo certo". "Não podemos compactuar com a farsa e os erros bolsonaristas", destacou o vice-presidente do PDT. >
"Justiça social e defesa dos mais pobres não podem ser confundidas com corrupção, clientelismo grosseiro, erros administrativos graves, desvios de verbas, calotes, quebra de contratos e com abalos ao arcabouço constitucional", declarou.>
Bolsonaro determinou, em outubro, o aumento do Auxílio Brasil para R$ 400, deflagrando uma crise entre as alas política e econômica do governo. >
A solução para atender à demanda do presidente foi driblar o teto de gastos, propondo alteração no cálculo da regra fiscal na PEC dos Precatórios. >
Essa PEC, que já estava na Câmara, prevê um limite para pagamento de precatórios (dívidas da União reconhecidas pela Justiça), o que libera mais espaço no Orçamento. >
As duas mudanças previstas na PEC -envolvendo o teto de gastos e os precatórios- têm potencial de abrir uma folga superior a R$ 90 bilhões no próximo ano, garantindo recursos para o Auxílio Brasil e um auxílio para caminhoneiros e compensar o aumento de despesas vinculadas à alta da inflação. >
O aumento de gastos na área social é uma aposta de Bolsonaro e aliados para tentar fortalecer o presidente na disputa à reeleição de 2022. >
Um dos pontos de divergência tratava da garantia do pagamento de dívidas de repasses do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério). Há cerca de R$ 15,6 bilhões em precatórios desse tema para Bahia, Pernambuco, Ceará e Amazonas. >
Diante da resistência, inclusive em partidos de centro e da base do governo, Lira e o relator da proposta, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), costuraram um acordo contestado por parlamentares contrários à PEC. >
Motta apresentou uma nova versão do projeto às vésperas da votação no plenário. A mudança prevê que os precatórios ligados à área da educação sejam parcelados em três anos. >
Com isso, as dívidas da União vinculadas ao Fundef seriam pagas da seguinte forma: 40% no primeiro ano, 30% no segundo ano e outros 30% no ano seguinte. >
O parcelamento foi visto por integrantes da bancada de educação como um avanço na negociação, pois antes não havia uma perspectiva de quando os recursos seriam pagos. >
A quitação desses débitos, segundo o texto, fica dentro do teto de gastos. A equipe econômica apoiou a modificação na versão da PEC. >
No entanto, a estratégia costurada por Lira foi chamada de manobra pela oposição e deputados contrários à proposta, como o partido Novo. >
Críticos do acordo argumentaram que a mudança no texto da PEC só poderia ser feita se houvesse alguma emenda (sugestão apresentada por parlamentares) com o mesmo teor. "Não tem emenda a ser aglutinada", disse a deputada Adriana Ventura (Novo-SP). >
Vice-líder da minoria, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) afirmou que o ato do relator foi ilegal. "Não existe essa emenda anterior. Se a PEC for aprovada pelo Congresso, vamos recorrer ao Supremo [Tribunal Federal]". >
Lira negou irregularidade na alteração feita de última hora na PEC. A mesma estratégia já foi usada em demais votações apertadas na Câmara. >
O governo sofreu um revés na semana passada, quando teve que adiar por três dias a votação da proposta. Sem acordo e por falta de votos, o Palácio do Planalto precisou de mais tempo para negociar a aprovação da PEC. >
"Irresponsabilidade fiscal é vocês ficarem preocupados com a reeleição do presidente Bolsonaro, e não com o bem estar do mais humilde brasileiro", disse o deputado Luiz Lima (PSL-RJ), ex-aliado de Bolsonaro. >
Motta rejeitou as críticas. "Estamos fazendo um trabalho que procura ser justo com quem mais precisa, que precisa ser fiscalmente responsável, e ele está sendo, porque estamos tendo aqui a manutenção do teto de gastos", afirmou o relator. >
Apesar de trabalhar com um "plano B" de prorrogar o auxílio emergencial, o plano principal do governo é concluir a aprovação da PEC. O gasto com precatórios passou de R$ 54 bilhões neste ano para R$ 89 bilhões no ano que vem. >
O ministro Paulo Guedes (Economia) classificou o comportamento da despesa como um meteoro. O cálculo do limite para pagamento de sentenças judiciais dentro do teto usa como base o montante pago em sentenças judiciais em 2016 (ano de criação do teto) e o corrige pela inflação. >
No caso da flexibilização do teto, a contabilidade do limite das despesas é retroativa a 2016. Isso autoriza uma ampliação do valor máximo a ser usado pelo governo. >
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