Publicado em 19 de junho de 2020 às 14:57
Dono de uma retórica inflamada contra opositores do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o agora ex-ministro da Educação Abraham Weintraub é tido por amigos e ex-colegas do setor financeiro como cortês, educado e culto. >
Bolsonaro anunciou a demissão nesta quinta-feira (18). A saída ocorre em decorrência de um longo desgaste político do Weintraub com os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).>
Por ter diploma de economista e ter feito carreira no mercado financeiro, ele foi indicado pelo governo brasileiro ao posto de diretor-executivo do Banco Mundial para um grupo de países acionistas do qual o Brasil faz parte junto com Colômbia, Equador, Filipinas, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago.>
O salário anual previsto para o cargo é de US$ 258.570, o equivalente a R$ 115,8 mil mensais sem 13 º -cerca de R$ 1,3 milhão por ano. O valor é mais de três vezes o salário de ministro, de R$ 31 mil.>
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O Banco Mundial, com sede em Washington, é uma instituição afeta à exposição pública e polêmicas de qualquer espécie, ainda mais nas redes sociais, onde Weintraub se mostrou muito ativo. O Brasil já foi representado no organismo por Pedro Malan, Murilo Portugal e Otaviano Canuto, conhecidos pela discrição e diplomacia no trato privado e social.>
Questionado sobre o novo posto de Weintraub, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) ironizou a nomeação.>
"Porque não sabem [no Banco Mundial] que ele [Weintraub] trabalhou no Banco Votorantim, que quebrou em 2009, e ele era um dos economistas do banco".>
Segundo o advogado criminalista Fernando Castelo Branco, professor da PUC-SP, a nomeação de Weintraub e a sua consequente mudança para Washington pode atrasar o andamento dos inquéritos em que ele é investigado.>
Weintraub é alvo do inquérito das fake news, que tramita no Supremo, e também de uma investigação no tribunal por racismo por ter publicado um comentário sobre a China.>
Weintraub chegou a defender a prisão de ministros do Supremo, a quem chamou de vagabundos em reunião ministerial gravada em 22 de abril. O vídeo se tornou público por fazer parte do inquérito que apura denúncias do ex-ministro da Justiça Sergio Moro de que Bolsonaro tentava interferir na Polícia Federal.>
"A investigação por racismo deve passar à Justiça Federal comum. Por não ter restrição de saída do país imposta pela Justiça, ele pode assumir o novo posto, mas precisa comparecer em juízo quando solicitado. A mudança para o exterior torna o avanço do processo mais lento", diz.>
Economista formado pela USP, Weintraub fez carreira no Banco Vototantim (hoje BV). Ele ingressou como estagiário no grupo em 1994, mesmo ano em que se graduou, e permaneceu na companhia por quase 18 anos, até 2012.>
No grupo Votorantim, chegou a ser economista-chefe do banco e diretor-executivo da Votorantim Corretora no Brasil e da Votorantim Securities no Estados Unidos e na Inglaterra.>
Em seu currículo, Weintraub afirma ter sido diretor da corretora de março de 2004 até sua saída, em maio de 2012.>
Segundo ex-colegas e amigos, Weintraub foi homem de confiança de então presidente do banco Wilson Masao, que o nomeou diretor da corretora.>
Masao, hoje sócio da F2 Investimentos, passou mais de 30 anos no grupo Votorantim. Foi diretor financeiro do conglomerado e esteve à frente do banco entre 1993 e setembro de 2011, quando foi substituído, em meio a uma crise, pelo executivo João Roberto Teixeira.>
Ao assumir, Teixeira precisou fazer o que um advogado que assessorou o banco em operações financeiras classifica como faxina na gestão da instituição, e substituiu toda a diretoria paulatinamente. O Banco Votorantim chegou a encerrar 2011 com prejuízo de R$ 201 milhões. O resultado foi influenciado à época pela alta na inadimplência de financiamentos de veículos novos.>
Foi nesse cenário que Weintraub deixou o banco, em maio de 2012. Segundo advogados que atenderam a instituição na época, o ex-ministro era tido como um profissional bem relacionado que lidava pouco com o dia a dia operativo da empresa.>
Amigos e ex-colegas que conviveram com o ex-ministro nesse período afirmam que, embora ele sempre tenha sido reconhecidamente conservador, não tinha fama de polemista. Weintraub é tido como o idealizador das corretoras da Votorantim em Nova York e Londres e sua gestão é elogiada e tida como exemplar.>
A atual imagem do ministro, expoente da ala mais radical do governo, é novidade para um amigo do setor financeiro. O personagem de Weintraub, diz, não corresponde à pessoa, que costumava estabelecer relações cordiais por onde passava.>
Durante sua passagem pelo MEC, Weintraub foi criticado pelas recorrentes faltas ortográficas e gafes. No mercado financeiro, no entanto, ele era reconhecido por ser um profissional culto, segundo um colega que trabalhou na empresa com o ex-ministro por mais de dez anos.>
Entre as gafes do ex-ministro, está a cometida em audiência no Senado em junho do ano passado, quando Weintraub confundiu o sobrenome do escritor Franz Kafka com o prato de árabe kafta.>
Em outro episódio, em janeiro deste ano, então ministro chegou a grafar "imprecionante" em vez de impressionante em um tuíte que dizia ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) que não havia no MEC uma área de pesquisa sobre segurança pública antes de sua gestão.>
Após sair do Votorantim, Weintraub foi sócio entre 2013 e 2014 da gestora Quest Investimentos (hoje AZ Quest), fundada pelo ex-ministro das Comunicações e ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) Luiz Carlos Mendonça de Barros.>
Procurado pela reportagem, Mendonça de Barros diz não ter tido contato com Weintraub, que era, segundo ele, "muito júnior no departamento econômico" da gestora.>
Pouco antes de sair da Quest, Weintraub assumiu o cargo de professor do curto de Ciências Contábeis do campus da Unfesp (Universidade Federal de São Paulo) em Osasco, do qual está licenciado.>
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