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Produtos protagonistas desequilibram gangorra das exportações capixabas

Produtos protagonistas desequilibram gangorra das exportações capixabas

HHI, índice calculado pelo Connect Fecomércio, mostra que dependência de poucos produtos, como minério de ferro e café, exige diversificação para blindar a economia capixaba contra crises externas

Publicado em 2 de dezembro de 2025 às 06:00

Rebocadores fazem buzinaço e jogam jato de água para comemorar recorde de exportação no Porto de Vitória
Portos querem diversificar os produtos exportados pelo Espírito Santo Crédito: Vitor Jubini

Com seus portos estratégicos, graças à boa localização geográfica, o Espírito Santo é uma das principais portas de entrada do Brasil — trazendo desde carros elétricos de ponta até insumos vitais — e uma potência na exportação de commodities. No entanto, por trás dessa fachada robusta de comércio exterior, existe uma fragilidade perigosa: a alta concentração das vendas em poucos produtos e para poucos mercados.

Uma análise aprofundada do Connect Fecomércio, utilizando o Índice de Herfindahl-Hirschman (HHI), revela que, apesar de uma recente e tímida busca por variedades, o Estado caminha sobre uma corda bamba econômica. O levantamento é inédito.

O HHI é a bússola global da diversificação comercial: quanto mais perto de zero, maior a diversidade e menor o risco; quanto mais perto de 1, maior vulnerabilidade. Em 2024, o índice das exportações capixabas bateu em 0,3618, um nível que indica um cenário moderado, mas com um peso esmagador em cinco protagonistas.

Minério de ferro, petróleo, celulose, café e semiacabados de aço são os pilares da economia e os líderes das exportações.

Café é um dos principais produtos da pauta exportadora capixaba
Café é um dos principais produtos da pauta exportadora capixaba Crédito: Freepik

Em setembro de 2025: o minério de ferro e seus concentrados responderam por 22,14%; o café não torrado, por 17,10%; os produtos semiacabados de ferro ou aço, por 12,8%. No total, cinco produtos responderam por 67,65% de toda a pauta exportadora do Estado no período, incluindo máquinas para indústrias e outros equipamentos (bombas e centrífugas).

Para André Spalenza, coordenador do Observatório do Comércio Connect Fecomércio, o resultado é o termômetro da dependência.

Se o minério de ferro ou o café, por exemplo, enfrentam uma queda de preço ou tarifa, o impacto é sentido de forma brutal em toda a economia local. Setores fortemente ligados a mercados específicos, como o norte-americano, são os primeiros a sofrer o choque.

Historicamente, o cenário tem evoluído: entre 2006 e 2015, as exportações capixabas atingiram um pico de concentração, refletindo uma forte dependência das commodities. Contudo, no período entre 2016 e 2025, houve uma inversão de tendência, com a ampliação do portfólio de produtos aptos a entrar em outros países.

Enquanto as exportações se apoiam em mercadorias tradicionais, o lado das importações aponta para um futuro mais diversificado. O destaque, influenciado por antecipações tarifárias, é a alta nas compras de carros elétricos e produtos de transição energética.

Essa movimentação sinaliza que o Espírito Santo está se inserindo em novas cadeias de valor global, um passo essencial para a prometida resiliência. Apesar dos riscos atuais, a história recente mostra uma evolução. Idalberto Moro, presidente do Sistema Fecomércio-ES — Sesc e Senac, reforça o caminho.

Idalberto Luiz Moro
Presidente da Fecomércio
Idalberto Luiz Moro Presidente da Fecomércio Crédito: Fecomércio/ Divulgação

O Espírito Santo é vocacionado ao comércio exterior, com portos competitivos. Com a modernização da infraestrutura e o fortalecimento de corredores logísticos, ampliamos nossa capacidade de atrair investimentos, gerar empregos e agregar valor. É o caminho para reduzir a dependência e garantir um futuro mais sólido.

Idalberto Moro

Presidente da Fecomércio

Tarifaço

Com o grande peso das exportações em poucas commodities”, o tarifaço de 50% anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brasil, em julho, mostrou a necessidade de o Espírito Santo não apenas tirar “os ovos de uma mesma cesta”, mas também variar o “galinheiro”, ou seja, o seu mercado comprador.

Os EUA são o principal parceiro comercial do Estado. Em 2024, esse país respondeu como destino de 33% das exportações capixabas, o equivalente a US$ 3 bilhões (R$ 16 bilhões). Nos nove primeiros meses de 2025, foram R$ 2 bilhões vendidos para esse mercado, com foco principal no café, no minério, no aço, nas rochas ornamentais e na celulose.

Com o início da supertaxação, somente em setembro, as vendas capixabas para os nortes-americanos caíram 25%, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), com base nos dados do ComexStat, do Ministério do Desenvolvimento, da Indústria, do Comércio e de Serviços (Mdic). A retração representa uma perda de US$ 64 milhões (R$ 350 milhões).

Em novembro, Trump anunciou a retirada da tarifa de 40% cobrada do café, carne, banana, açaí e outros produtos agrícolas. No entanto, os impactos negativos produzidos pela medida nos quatro meses em que vigorou ainda continuarão sendo administrados pelos produtores.

Somente no café, o Espírito Santo acumulou mais de 33% de queda nas vendas entre agosto e outubro em comparação com os três meses anteriores (maio a junho), deixando de enviar para os Estados Unidos 2,6 mil toneladas do grão e seus derivados, conforme mostra o ComexStat. O impacto dessa retração é de US$ 19 milhões (R$ 100 milhões, aproximadamente).

Mapa das Exportações no Brasil
Mapa das Exportações no Brasil Crédito: Divulgação

Diversificar para se blindar das oscilações

Para garantir um futuro mais sólido, o Espírito Santo precisa fortalecer os espaços que já têm no cenário internacional e expandir seus contatos, na avaliação do coordenador do Connect, André Spalenza. 

André Spalenza
André Spalenza Crédito: Divulgação

O Estado ainda tem espaço para avançar, tanto na diversificação da pauta exportadora quanto no fortalecimento da sua presença nos mercados em que já atua. Enquanto o Brasil alcançou 219 nações com suas exportações, o Espírito Santo alcançou 106 economias em setembro de 2025. Da mesma forma, o Brasil exportou 290 produtos diferentes, e o Estado, 171.

André Spalenza

Coordenador do Observatório do Comércio Connect Fecomércio

A ampliação do alcance do comércio capixaba, diversificando mercados e parceiros comerciais, é fundamental para reduzir a vulnerabilidade externa. Mesmo sem a necessidade de abrir novos destinos imediatamente, consolidar a marca capixaba e ampliar o volume exportado em setores já existentes são passos importantes. O incentivo à participação em feiras internacionais de comércio é um dos caminhos para essa expansão.

O Sindicato do Comércio de Importação e Exportação do Espírito Santo (Sindiex) aponta alguns caminhos que podem ser promissores para o avanço na diversificação.

Segundo a entidade, a análise de setores indica que áreas ligadas à importação de máquinas/equipamentos, medicamentos, tecnologia e, especialmente, energias renováveis (como a fotovoltaica) demonstram potencial para o comércio exterior capixaba.

Investimentos nessas novas áreas, impulsionados por programas como o Invest-ES, o Fundap e o Compete, são cruciais, na avaliação do Sindiex. Com maiores aportes em outras áreas, a economia do Estado se torna mais consolidada e fortalecida, permitindo o desenvolvimento de novas áreas e competências no longo prazo.

O aumento da representatividade de produtos que não tendem a ter grande relevância tradicionalmente na pauta, como “bombas, centrífugas, compressores de ar, ventiladores, aparelhos de filtrar ou depurar e suas partes” e “outras máquinas e equipamentos especializados para determinadas indústrias e suas partes”, que ficaram entre os principais produtos em setembro de 2025, é um sinal de que a diversificação é possível.

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