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Publicado em 23 de agosto de 2021 às 19:57
Além de ter sido condenado à aposentadoria compulsória pelo envolvimento com uma mulher acusada de tráfico de drogas que respondia a processo na Vara da qual era titular, a 4ªCriminal da Serra, Vanderlei Ramalho Marques, também foi punido, no mesmo Processo Administrativo Disciplinar (PAD), por outras irregularidades. >
Em um dos episódios, ele mandou soltar quatro presos em uma operação contra o tráfico na Serra em que a polícia apreendeu, em 2015, três toneladas de maconha. Um dos réus admitiu que pagou R$ 50 mil pela decisão favorável.>
O relator do PAD no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), desembargador Fernando Bravin, narrou ao votar, na última quinta-feira (19), que no dia 14 de setembro de 2015 Marques negou a soltura dos presos. Três meses depois, no entanto, acolheu o pedido da defesa. >
Em depoimento no âmbito do PAD, um dos réus que ganhou a liberdade na ocasião afirmou que um advogado fez a proposta. "Que eram quatro pessoas, que tinha um acerto com o juiz, que ia soltar a gente. Eu nem conhecia esse juiz e o advogado conheci ali na hora", contou o réu.>
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O advogado, ainda de acordo com o preso, ofereceu a proposta de R$ 200 mil, R$ 50 mil para cada réu pagar. E o réu que prestou depoimento no PAD disse que repassou os R$ 50 mil para o advogado entregar ao juiz. >
"Ele narra insistência do advogado, de que o dinheiro serviria para a soltura dos presos", ressaltou Bravin. E foram soltos. >
Fernando Bravin
Desembargador do TJESHá depoimentos de outros réus, relativos a outros processos, relatando expedientes similares, embora em nem todos eles o pagamento tenha se concretizado.>
"A defesa (do juiz) alega que todo esse arcabouço de três, quatro presos de processos diferentes, é uma montagem para causar nulidade (a anulação das ações a que respondem)", lembrou Bravin.>
O desembargador, no entanto, não se convenceu. Para ele, os relatos demonstram que o magistrado se aproveitava de ações para barganhar benefícios em favor de réus em troca de pagamento.>
Vanderlei Ramalho Marques apresentou faturas de cartão de crédito para se defender. "Faturas de agosto de 2015, setembro de 2015, outubro de 2015, novembro de 2015 e janeiro de 2016 revelam pagamentos de parte dos débitos em dinheiro. Somados, são R$ 23,3 mil. Não há lastro em contas bancárias. Houve acréscimo de pagamento em dinheiro sem saques correspondentes", registrou o relator, no voto. >
Bravin considerou que isso é compatível com recursos de origem ilícita. Em 2014, ainda de acordo com o desembargador, Marques declarou à Receita Federal ter R$ 150 mil em espécie, "talvez guardados no colchão", ironizou o relator. >
Ele afirmou, ainda, que a renda oficial do juiz contrasta com o padrão de vida, considerando que Marques sustenta esposa e três filhos.>
Diante de "infrações gravíssimas" que "prejudicam a imagem do Judiciário", o relator votou pela pena de aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, que é a punição máxima na esfera administrativa, de acordo com a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).>
Bravin foi seguido pelos demais desembargadores. A decisão foi unânime. >
Marques já está aposentado porque foi punido em outro PAD, em dezembro de 2020, com a pena de aposentadoria. Daquela vez o motivo foi o assédio sexual cometido contra mulheres no Fórum da Serra. >
O juiz ingressou na magistratura em 2000 e já respondeu a outros PADs, em que recebeu penas mais brandas: advertência e censura.>
O fato de ter duas condenações à aposentadoria compulsória não reduz os valores a serem recebidos mensalmente pelo juiz. Na prática, o que ocorre é que, se ele conseguir reverter uma das penas, recorrendo ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ainda assim vai restar a outra condenação, mantendo-o na inatividade.>
A defesa do magistrado, exercida pelos advogados Marco Antônio Gama Barreto e Henrique Zumak, já afirmou, em nota, que vai recorrer: "Há provas nos autos que demonstram a inocência do magistrado e que, infelizmente, não foram cotejadas no julgamento".>
Um juiz pode, sim, perder o cargo. Mas não por meio de processo administrativo. Isso somente ocorre se houver sentença judicial transitada em julgado, quando já não é mais possível recorrer da decisão.>
E Vanderlei Ramalho Marques responde, também, a processos criminais, ainda em tramitação. Normalmente, o trâmite administrativo é mais célere do que o judicial.>
O Portal da Transparência do TJES mostra que Marques já consta como inativo. Por enquanto, ele recebe o subsídio integral: R$ 33.689,11. >
Em julho, contou também com R$ 2.100,70 em indenizações (auxílios). Descontados o Imposto de Renda e a contribuição previdenciária, foram R$ 24.628,22 líquidos.>
O Tribunal de Justiça informou, por meio de nota, que "assim que o ato de aposentadoria foi publicado no e-diário, o processo foi encaminhado ao Instituto de Previdência dos Servidores do Estado do Espírito Santo – IPAJM, gestor único de previdência do Estado do Espírito Santo e responsável pelo cálculo e fixação dos proventos de aposentadoria e ainda não retornou a este Tribunal de Justiça".>
A reportagem demandou o IPAJM que, nesta segunda (23), informou que o processo chegou ao instituto este mês e "está sendo analisado pela área técnica".>
Os advogados Marco Antônio Gama Barreto e Henrique Zumak, que fazem a defesa de Vanderlei Ramalho Marques, afirmam, por nota, "seu respeito à decisão do Egrégio Tribunal de Justiça, mas exercerão seu direito de recurso junto ao Conselho Nacional de Justiça, na medida em que há provas nos autos que demonstram a inocência do Magistrado e que, infelizmente, não foram cotejadas no julgamento". >
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