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Integração de comarcas no ES vira polêmica para além do Judiciário

Integração de comarcas no ES vira polêmica para além do Judiciário

TJES poderia economizar recursos com a medida. OAB-ES e lideranças políticas são contrárias; políticos aproveitam debate para acenar às bases eleitorais e agradá-las

Publicado em 20 de dezembro de 2019 às 19:41

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Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). (Reprodução/TV Gazeta)

integração de comarcas, em estudo pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), vai além de um debate jurídico ou quanto às finanças do Poder Judiciário. O componente político está em toda parte. 

Nesta quinta-feira (19), a Assembleia Legislativa publicou a criação de uma comissão especial a ser formada por três deputados para debater o tema. No mesmo dia, 23 prefeitos reuniram-se com a Ordem dos Advogados do Brasil - seccional Espírito Santo (OAB-ES). A Ordem é contra a integração e políticos agem na tentativa de "ganhar crédito" com o eleitorado.

O Estado tem 78 municípios e 69 comarcas. Cada uma demanda estrutura, um juiz, servidores (nem todas têm um juiz com atuação exclusiva, há defasagem no número de magistrados). O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que, para economizar dinheiro, o Tribunal estude a possibilidade de juntar comarcas a depender do número de moradores da comarca e do número de processos em tramitação. 

Mas há resistência de lideranças políticas, que apontam um possível prejuízo à população de cidades do interior, que teriam que ir a outro município para serem atendidas pela Justiça se uma determinada comarca for integrada a outra e deixar de funcionar no atual espaço. 

E é no contexto dessas críticas que deputados agem para acenar às bases eleitorais. O ex-líder do governo Casagrande na Assembleia, Enivaldo dos Anjos (PSD), já disse, em discurso no último dia 25, que "nós, deputados do interior, não vamos aceitar isso. Eles (o TJES) gastam muito, não se adequam à LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e agora querem punir as comarcas". Enivaldo é de Barra de São Francisco, Noroeste do Espírito Santo.

O deputado estadual Eustáquio de Freitas (PSB), novo líder do governo e também quem propôs a criação da comissão especial na Assembleia, quer entender se a economia pretendida pelo Tribunal valeria a pena. "Precisamos compreender o desgaste que dará para os municípios que perdem e para os que recebem as comarcas, qual é o número de processos, conhecer a economia alcançada com essa unificação. Parece que não chega a 2% a economia do total do orçamento do TJES", afirma.

"Pedro Canário, por exemplo, tem 6 mil processos e está a 50 km da comarca proposta para unificação, que é Conceição da Barra. E entre elas não tem transporte coletivo regular. Os mais pobres pagariam um preço muito alto. Vale a pena?", questiona. Freitas é de São Mateus.

Não há um levantamento definitivo, no entanto, sobre quais comarcas seriam integradas. Uma comissão formada por juízes, desembargadores e advogados trabalha justamente nisso.  E o Pleno do TJES é que vai decidir a questão.  Não há nada definido.

Enquanto isso, prefeitos estão preocupados. "A gente entende as dificuldades do Tribunal de Justiça, realmente tem que diminuir os gastos. Mas temos que pensar nas famílias que não têm condições de se deslocar de uma cidade para outra, há locais que nem linha de ônibus tem. Acredito que o Tribunal teria que ter mais diálogo, debater melhor esse assunto e apresentar outras alternativas que não seja integrar comarcas", diz o prefeito de Boa Esperança, Lauro Vieira (sem partido), que esteve na OAB-ES nesta quinta.

OAB-ES É CONTRA UNIR COMARCAS

O secretário geral da Ordem, Marcos Felipe Botelho Pereira, diz que, para as lideranças políticas, a  "impressão é que o município perde importância. Sairia também o Ministério Público, haveria dificuldade do cidadão para o acesso aos fóruns, teria que ir a outra comarca", reforça.

"O que a OAB disse aos prefeitos é que o estudo é provisório e que estamos aguardando o estudo final. A OAB é contra essa integração até que seja comprovado que essa seria a única forma de o Tribunal de Justiça atingir a economia pretendida", pontua. 

"BRASIL NÃO CONSEGUE PAGAR ESSA CONTA"

O ex-presidente do TJES, desembargador Sérgio Gama já disse para A Gazeta que compreende as preocupações dos prefeitos e que o Judiciário pretende conversar com outros Poderes e instituições sobre o assunto. Mas frisou: "O Brasil não consegue pagar essa conta".

"Tem a determinação do CNJ (para estudar a integração de comarcas) e também o país não tem como pagar essa conta. Quando eu fui promotor em Guaçuí, a comarca de Guaçuí abrangia Dores do Rio Preto e Divino de São Lourenço. Hoje Dores também é comarca. A comarca tem um juiz, um promotor e diversos serventuários. O Brasil não consegue pagar essa conta. Isso está sendo identificado também a nível federal, creio que isso vai ter que ser realizado e no futuro vamos ter a integração de comarcas."

Desembargador Sérgio Gama, ex-presidente do TJES, em entrevista para A Gazeta no último dia 11, prestes a despedir-se do cargo. (Letícia Gonçalves)

"Quando uma cidade passa ser comarca, essa cidade passa a ter um juiz, um promotor e servidores. Os moradores da cidade sentem mais segurança e não querem perder essa comarca, consideram uma conquista. Mas é inconcebível você pensar que, por exemplo, Água Doce do Norte (cuja população é de 11 mil habitantes) tem uma comarca.  É preciso estudar com calma e fazer a junção. Com a tecnologia, a implementação do PJE (processo judicial eletrônico) vai melhorar, não vamos precisar de tanta mão de obra."

NOVO PRESIDENTE FALA EM MUDANÇA PROVISÓRIA

Desembargador Ronaldo Gonçalves Sousa é o novo presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Tomou posse no último dia 12. (Vitor Jubini)

Já o novo presidente do TJES, Ronaldo Gonçalves de Sousa, disse que a mudança seria provisória

"A ideia da integração de comarcas não é extinção, é uma ideia para fazer-se provisoriamente para equilibrar as contas do Judiciário. Tem como pano de fundo a economia. Mas como eu disse, se isso acontecer é uma coisa provisória. Definitivo seria a extinção da comarca", sustenta o desembargador. 

"Os estudos continuam sendo realizados. Vou apreciar. Se houver necessidade de enxugamento financeiro do nosso Judiciário, vou ter que lançar mão desta medida", avisa Sousa.

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