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Publicado em 14 de dezembro de 2023 às 07:50
Um ano depois das prisões ordenadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no Espírito Santo, nenhum dos alvos foi ouvido. Até o momento, os pedidos de liberdade feitos pelas defesas do jornalista Jackson Rangel, do vereador de Vitória Armandinho Fontoura, do pastor Fabiano Oliveira e do radialista Maxcione Pitangui foram negados. >
O deputado estadual Capitão Assumção e o ex-parlamentar Carlos Von também seguem usando tornozeleira eletrônica e proibidos de usar redes sociais. >
Em 15 de dezembro de 2022, quando a Polícia Federal cumpriu mandados de prisão no Estado, também foram cumpridos mandados de busca e apreensão em diversos endereços, inclusive nos gabinetes dos parlamentares na Câmara e na Assembleia Legislativa do Espírito Santo. >
Investigações feitas no âmbito estadual foram anexadas ao 'Inquérito das Fake News', que apura ataques às instituições democráticas e aos ministros do Supremo. >
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A suspeita, apresentada pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) diretamente ao gabinete de Moraes, é de que os alvos formariam uma milícia digital para propagar fake news e que teriam promovido ataques às instituições democráticas, notadamente o STF, através de postagens nas redes sociais. >
As medidas decretadas por Alexandre de Moraes naquela ocasião ainda estão valendo. Até hoje nenhum deles foi formalmente acusado ou julgado e, por se tratar de uma prisão preventiva e de medidas cautelares (tornozeleira), não há duração máxima. >
As defesas de alguns dos acusados alegam que há abuso de autoridade e violação de direitos nas prisões e afirmam que o procedimento que levou à decisão de Moraes é inconstitucional. Isso porque a petição direta da Procuradora-Geral de Justiça do MPES ao ministro Alexandre de Moraes usurpa a competência da Procuradoria-Geral da República (veja detalhes do que diz cada defesa no fim da matéria). >
O MPES protocolou em 2022 três petições no STF que envolvem, no total, 14 pessoas e uma empresa. As petições foram incorporadas ao inquérito 4.781, conhecido como 'Inquérito das Fake News', aberto em 2019 no STF e relatado por Moraes.>
O ministro, na decisão de dezembro de 2022, alegou que os indícios que o Ministério Público estadual havia apresentado tinha semelhança àqueles investigados na Suprema Corte no âmbito do inquérito das Fake News e também no dos atos antidemocráticos. >
Ao acatar os pedidos do Ministério Público Estadual, o ministro afirmou que há evidências de que eles possam integrar uma organização criminosa para “desestabilizar as instituições republicanas”, principalmente o Supremo. Disse ainda que, no caso de Jackson, Armandinho, Max e Fabiano, há indícios de que eles tenham cometido crimes de injúria, calúnia, difamação, incitação ao crime e milícia privada. >
O ministro ressaltou ainda que a lei não permite a utilização da “liberdade de expressão” como escudo para a prática de discursos de ódio, antidemocráticos, ameaças, agressões, e todo o tipo de atividades ilegais. >
O advogado Gabriel Coimbra representa atualmente o jornalista Jackson Rangel e o ex-deputado federal Carlos Von. Coimbra também foi um dos alvos de busca e apreensão em 15 de dezembro determinada por Alexandre de Moraes. >
Segundo ele, disputas políticas estaduais foram “enxertadas” no inquérito dos atos antidemocráticos por ação da procuradora-geral do Espírito Santo, Luciana Andrade, que, na opinião do advogado, teria usado o inquérito para atingir alvos políticos dela. >
Luciana teria ainda desrespeitado, disse a defesa, o Ministério Público Federal ao sugerir a ação diretamente ao gabinete do ministro visto que, segundo a lei, cabe à Procuradoria-Geral da República exercer as funções do Ministério Público junto ao STF. >
“Após 12 meses de prisão, sem nem sequer serem ouvidos, tem-se manifesta violação de direito humanos e ao devido processo legal do estado democrático de direito, injustificável sob qualquer pretexto jurídico ou político”, disse o advogado em nota enviada para A Gazeta.>
Coimbra destacou ainda que Jackson Rangel tem sérias comorbidades, como diabetes e pressão alta. >
A advogada Valquíria Durães, que faz a defesa da Max Pitangui, afirmou que o procedimento contra o radialista é “completamente ilegal e inconstitucional”. Em nota, a defesa disse que Max só foi acrescentado às petições do MPES ao ministro Alexandre de Moraes após ter feito um vídeo em que citava a personagem infantil “Peppa Pig” ao fazer uma suposta denúncia contra a procuradora-geral de Justiça do Estado, Luciana Andrade. >
O conteúdo do vídeo foi considerado misógino e repudiado pelos membros da Associação Espírito-Santense do Ministério Público (AESMP). A procuradora processou Max por crime contra a honra e a Justiça estadual condenou o radialista a pagar R$ 7 mil em indenização por danos morais. >
“Percebe-se claramente que a procuradora, inconformada com os vídeos e após mover ações privadas contra Max Pitangui, simplesmente pinçou postagens em suas redes sociais com críticas e denúncias contra o governo atual, como fizeram milhões de pessoas no país, para criminalizá-lo e atingir seu objetivo de vingança pessoal, travestido cinicamente de combate a atos antidemocráticos”, escreveu a defesa. >
Pitangui está atualmente no presídio da Papuda, em Brasília, desde que foi preso pela Interpol em Cidade do Leste, no Paraguai, e entregue à Polícia Federal brasileira.>
A advogada ressaltou que o radialista tem três filhos, de 1,3 e 7 anos, e um deles que requer cuidados especiais e se alimenta por sonda gástrica. “ A dependência financeira e emocional do pai provedor de família, hoje preso, levou a um súbito estado de piora da saúde do filho especial.”>
A defesa de Capitão Assumção (PL) afirmou que já fez pelo menos quatro pedidos para a revogação das medidas cautelares, entre elas o uso de tornozeleira, e está aguardando posicionamento do STF. Nenhum dos pedidos foi apreciado pelo relator até o momento. >
Já a defesa do vereador Armandinho Fontoura afirmou que não foi autorizado pelo cliente a conceder entrevista e ressaltou que o processo é sigiloso. >
“Meu cliente permanece confiando no bom senso de justiça das autoridades em nosso país e que a verdade continuará sendo perseguida nos autos dos processos”, disse em nota.>
O advogado Marcelo Brasileiro, que defende o pastor Fabiano Oliveira, também alegou que houve ilegalidade na prisão de seu cliente. Ele disse que o mandado só foi apresentado ao pastor quando ele já estava preso, em Viana. >
Afirmou ainda que o pastor não tem foro e prerrogativa de função e, por isso, houve violação do princípio do promotor e do juiz natural. "Se, em tese, ele tivesse cometido algum crime, seria um promotor e não a procuradora-geral de Justiça a atuar. Seria um juiz de primeiro grau da Justiça Federal ou Estadual e não o STF. Tem várias nulidades na prisão do meu cliente". >
Ele alegou, como outros advogados, ter tido dificuldades em acessar os autos do processo. >
A Gazeta tentou contato com a procuradora-geral de Justiça por três semanas, mas ela não quis dar entrevista. Já o Ministério Público do Espírito Santo disse, em nota, que o procedimento tramita em segredo de Justiça no Supremo Tribunal Federal (STF) e que, por isso, não vai se pronunciar sobre o assunto.>
Luciana já havia se pronunciado sobre o assunto em entrevista à colunista Letícia Gonçalves, em julho de 2023. Na ocasião, ela disse que o MPES tem legitimidade para atuar na questão. "O próprio Supremo já estabeleceu precedentes nesse sentido, de que podemos atuar. É compreensível eventual crítica porque é uma estratégia de defesa. Mas se o Supremo recebeu petições (do MPES), analisou e deferiu medidas...">
Ela comentou ainda o caso do radialista Max Pitangui. A procuradora-geral de Justiça do Espírito Santo afirmou que tomou providências quanto às ofensas proferidas em vídeo publicado por ele, mas disse que os fatos que envolvem o Supremo são "outra seara". >
"O ministro da Suprema Corte não tomaria uma decisão com base em uma questão pessoal que envolve a procuradora Luciana. E as pessoas confundem, a Procuradoria Geral não é a procuradora-geral. Tem coisas que eu não necessariamente vou assinar, peticionar, tenho substitutos que têm autonomia e independência para atuar conforme o caso", disse. >
O STF e a PRG também afirmaram que não vão se pronunciar por conta do sigilo aplicado sobre os autos. >
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