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Setores dizem que fim da desoneração vai impedir retomada econômica

Setores dizem que fim da desoneração vai impedir retomada econômica

Congresso começa a discutir possível derrubada do veto e negocia também o envio pelo governo federal de novo projeto com redução de encargos para contemplar todos os segmentos

Publicado em 8 de julho de 2020 às 09:46

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Carteira de Trabalho e Previdência Social do Ministério do Trabalho
Especialistas avaliam que novas contratações vão ficar mais difíceis com as empresas tendo que pagar mais impostos. (Carlos Alberto Silva)

O veto do presidente Jair Bolsonaro à prorrogação da desoneração da folha salarial deve atrapalhar a retomada da economia, segundo avaliam especialistas na área tributária e representantes do setor produtivo. A prorrogação da desoneração da folha era esperada por representantes de 17 setores que teriam o direito de pagar menos impostos sobre os salários dos empregados.

Os setores econômicos agora estão na expectativa e aguardam a derrubada do veto ou mesmo a aprovação de um outro projeto pelo Legislativo que contemple mais empresas. O Senado já negocia com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o envio de uma nova matéria que seja mais abrangente e que possa contribuir para a volta das contratações na crise provocada pelo novo coronavírus.

A redução dos encargos na folha de pagamento é uma das maneiras que as empresas enxergam para suportar a recessão trazida pela nova doença, que paralisou as atividades produtivas, derrubou o consumo interno e internacional.

O veto da prorrogação da desoneração da folha salarial veio junto com a sanção das medidas que preveem a suspensão dos contratos de trabalho e a redução do salário dos trabalhadores – ambos assuntos abordados na lei que institui o programa emergencial de manutenção do emprego e da renda, antiga Medida Provisória 936.

Os setores que seriam beneficiados pela prorrogação da desoneração somam 85 mil trabalhadores somente no Espírito Santo. Estes setores são: calçados; call center; comunicação; confecção/vestuário; construção civil; empresas de construção e obras de infraestrutura; couro; fabricação de veículos e carrocerias; máquinas e equipamentos; proteína animal; têxtil; tecnologia de informação (TI); tecnologia de comunicação (TIC); projetos de circuitos integrados; transporte metroferroviário de passageiros; transporte rodoviário coletivo; e transporte rodoviário de cargas.

O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Espírito Santo (Sinduscon-ES), Paulo Baraona, avalia que a desoneração seria importante para manter o equilíbrio das contas das empresas – sobretudo num momento em que a indústria está devagar.

“Não prorrogar a desoneração gera mais custo e pode ter impacto nas atividades. É difícil dizer de imediato se vai haver demissão, mas novas contratações ficarão mais difíceis. Esse veto dificulta a recuperação”, pondera Baraona.

Segundo o Ministério da Economia, o objetivo do governo é fazer uma reforma tributária para beneficiar empresas de todos os setores – não só dos 17 que teriam vantagem caso a desoneração fosse prorrogada. O problema, no entanto, segundo advogados, é que as discussões sobre tal reforma podem levar muito tempo.

Segundo o especialista em Direito Tributário, Luiz Cláudop Allemand, é temerário confiar na aprovação das mudanças tributárias para decidir não prorrogar algo de grande impacto no mercado.  Ele afirma que até a votação das reformas é possível que muitas empresas e empregos possam ser extintos.

Segundo o advogado tributarista Samir Nemer, as empresas estão na expectativa de que o Congresso derrube o veto do presidente, já que o mecanismo vinha ajudando as companhias a se recuperarem dos efeitos ainda da crise fiscal iniciada em 2015. No entanto, a retomada foi frustrada com a chegada do novo coronavírus e seus impactos severos na economia.

O próprio relator do projeto na Câmara dos Deputados, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) classificou o veto como “grave erro” e disse que o Congresso deveria derrubar o veto presidencial. Segundo Nemer, o Congresso tem o prazo de 30 dias corridos para derrubar o veto em sessão conjunta com senadores e deputados.

“Os efeitos econômicos da pandemia se agravam a cada dia. O desemprego cresce. E o governo vai aumentar o ônus para setores da economia que empregam mais de 6 milhões de brasileiros”, afirmou Orlando Silva ao jornal Folha de S.Paulo.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que o Congresso vai ainda avaliar outros vetos do presidente e que pode derrubar esse da desoneração se discordar da decisão presidencial.

“Acho que dois anos [de prorrogação] era um prazo longo, que era a proposta inicial dos setores. Mas um ano ficou uma coisa equilibrada”, disse. “No início da retomada, você garantir que aqueles setores tenham algum estímulo para não demitir, que acho que era uma ideia boa... infelizmente o governo decidiu pelo veto, apesar de eu não ser a favor daquele projeto de desoneração.”

COMO FUNCIONA A DESONERAÇÃO

A desoneração da folha salarial está em vigor desde o governo Dilma Rousseff e vem seguindo a redução do número de setores beneficiados. Quando começou, ela valia para cerca de 50 setores, todos que empregam muitas pessoas. Com o passar do tempo, conforme o previsto, ela foi reduzindo e hoje vale para 17 setores.

Essas empresas podem contribuir à Previdência com um percentual que varia de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Sem essa medida, a empresa seria obrigada a recolher 20% sobre a folha de pagamento, o que eleva os gastos para determinadas companhias. Essa diferença no recolhimento dos impostos é que faz a desoneração ser vantajosa para as empresas.

O benefício está previsto para terminar em 31 de dezembro de 2020. Em seu parecer sobre a MP 936, Orlando Silva havia prorrogado a desoneração inicialmente até 31 de dezembro de 2022, mas, diante da pressão do governo, encurtou o prazo e decidiu estender o programa até 31 de dezembro de 2021 –o que Bolsonaro vetou.

Relator da matéria no Senado, Vanderlan Cardoso (PSD-GO) acredita que o veto nem será votado no Congresso. Segundo ele, a ideia do governo é encaminhar um novo projeto, a fim de aumentar os setores beneficiados pela desoneração da folha. “Eu acredito que vai ser ampliado (desoneração) e de forma rápida. Nem deve votar veto”, afirmou.

A presidente da CCJ do Senado, senadora Simone Tebet (MDB-MS), já manteve conversas com Guedes a respeito do encaminhamento de uma nova proposta ao Congresso. Segundo ela, a ideia do governo é ampliar a gama de setores beneficiados, por um período que pode se estender a quatro anos.

"Pela conversa com o Guedes, ele é a favor da desoneração da folha. Mas como esse é um pulo do gato para avançar em alguma tributação, ele precisa desonerar sem abrir mão desse recurso".

Embora ainda não haja acordo, a intenção do governo, segundo Tebet, é negociar com o Parlamento onde poderia haver a implementação de uma nova taxação, uma vez que para haver desoneração é preciso que haja compensação nos cofres públicos. A taxação sobre lucros e dividendos é uma das opções.

"É mais estratégico no momento mandar um novo projeto. Ao continuar com desoneração sem nova fonte, ele (governo) mata a galinha dos ovos de ouro. O que ele tem para convencer o Congresso é criar a taxação sobre lucros e dividendos", analisa a senadora.

Procurada, a assessoria do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não informou quando os vetos serão analisados pelo Congresso.

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Com informações da Folha Press.

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