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Empresas criam kit Covid-19 e dão até ivermectina para funcionários

Empresas criam kit Covid-19 e dão até ivermectina para funcionários

Além do medicamento, farmácias de manipulação registraram pedidos de vitamina C e D e zinco por companhias do ES; iniciativa é tida como reforço da imunidade do trabalhador

Publicado em 16 de julho de 2020 às 06:00

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Empresas criam kit Covid-19 e dão até ivermectina para funcionários
Empresas criam kit Covid-19 e dão até ivermectina para funcionários. (Amarildo)

Com a flexibilização do isolamento social, muitas empresas já estão retomando suas atividades presenciais. Além de máscaras e álcool em gel, algumas organizações no Espírito Santo estão adotando como estratégia reforçar a imunidade de seus funcionários e criando uma espécie de kit Covid. Além de oferecerem vitaminas D e C, zinco e outros suplementos, as companhias estão dando até ivermectina para os empregados.

A procura por esses produtos, inclusive, disparou as vendas nas farmácias de manipulação que têm atendido principalmente aos clientes corporativos. A compra dos medicamentos precisa ter receita médica, o que significa que as empresas estão com pareceres médicos para conseguir manipular os compostos e entregá-los aos seus colaboradores.

A farmacêutica e proprietária da Globo Fórmula, Luiza Scardua, ressalta que a venda da ivermectina cresceu 23.000% somente nos primeiros meses do ano. A comercialização do medicamento foi para empresas, cliente final e também prefeituras. Segundo ela, foram mais de 14 mil comprimidos vendidos para empresas e 12 mil para prefeituras. Ela lembra que a maioria das organizações tem médicos do trabalho para prescrever os remédios.

“Além da venda no balcão para clientes finais, vendemos uma grande quantidade para empresas grandes que distribuíram esses manipulados para os seus colaboradores. Acredito que a compra desses medicamentos por parte das companhias servem como profilaxia no combate ao coronavírus, embora ainda não haja comprovação científica da eficácia desses medicamentos no combate à doença. Estudos como este demoram cerca de dois anos para serem concluídos. Além das empresas, prefeituras também fazem cotação para distribuir entre os hospitais”, comenta.

A ivermectina é um medicamento antigo, muito usado em crianças para combate de piolho. A indústria farmacêutica também utiliza o componente em remédios de combate à pulga de animais. O produto já está em falta nas drogarias convencionais.

“É importante lembrar que não é permitida a manipulação de medicamentos sem a prescrição médica. Para fazer o pedido individualmente, é preciso ter o nome completo, CPF e a receita médica. No caso das empresas, a produção dos remédios ocorre com a prescrição dos médicos de trabalho”, explica a farmacêutica.

Outros medicamentos que tiveram aumento de venda estão relacionados a alguns protocolos de aumento de imunidade como sulfato de zinco (aumento de 215%), vitamina D3 (aumento de 10%) e vitamina C, que, em seis meses deste ano, vendeu a mesma quantidade de todo o ano de 2019.

Luíza Scárdua destaca ainda que as vendas da hidroxicloroquina também aumentaram nos últimos meses, neste caso, para clientes individuais. O medicamento, o segundo mais vendido na farmácia, é utilizado para o tratamento de doença autoimune. A alta foi de 223%.

A farmacêutica e diretora da Rede Alquimia, Raigna Vasconcelos, também afirma que teve aumento nas vendas de medicamentos como ivermectina, inclusive para empresas. Segundo ela, as encomendas contam ainda com zinco, vitamina D e C, além de nitazoxanida (utilizado como antiparasitário).

“Recebemos pedidos de várias empresas, nos mais diferentes ramos de atuação. Todas elas orientadas por um médico, responsável por fazer a prescrição. As organizações nos procuram para comprar os medicamentos, mas não sabemos como é feita essa distribuição. Até igreja já fez pedido conosco”, ressalta Raigna.

Somente da ivermectina, foram vendidas mais de 500 mil cápsulas. “Não há uma comprovação final da eficácia desses medicamentos, mas é bom lembrar que eles podem ter efeitos colaterais em determinadas pessoas”, avalia.

A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia já se manifestou sobre o assunto e esclareceu que “não existem evidências científicas de que quaisquer das medicações disponíveis no Brasil, tais como ivermectina, cloroquina ou hidroxicloroquina, isoladas ou associadamente, sejam capazes de evitar a instalação da doença em indivíduos não infectados. Isso também é verdade para vitaminas, como, por exemplo, a C e D, e suplementos alimentares contendo zinco ou outros nutrientes”.

O especialista em assessoria jurídica a empresas nas áreas de direito do trabalho e civil Márcio Dell'Santo, do escritório Genelhu Advogados, ressalta que o trabalhador não é obrigado a tomar o medicamento e que a iniciativa das empresas em oferecer os remédios passa como uma estratégia de boa intenção. A organização não pode obrigar o trabalhador a fazer uso da medicação.

“Como ele não está obrigado a acatar a recomendação do empregador, penso que nenhuma medida administrativa disciplinar poderá ser adotada (advertência e suspensão, por exemplo). O empregado poderá afastar-se do trabalho à vista da apresentação de atestado médico”, observa Dell'Santo.

Ele ainda afirma que caso o funcionário fique doente por tomar os medicamentos fornecidos pelas empresas, as empresas poderão ser responsabilizadas pelos danos causados à saúde do empregado.

“Não é recomendado a utilização de medicação sem prescrição médica. Na situação colocada em discussão, o empregado estará fazendo uso de medicação 'prescrita' pelo empregador, sem qualquer comprovação quanto à sua eficácia. O fato de a manipulação da medicação ter sido feita a partir de prescrição médica não é suficiente para afastar a responsabilidade do empregador, uma vez que, ao que tudo indica, ela – prescrição – não é dirigida a cada empregado”, diz o advogado.

O assessor jurídico da Associação Brasileira de Recursos Humanos seccional Espírito Santo (ABRH-ES) Caio Kuster concorda que as empresas não podem obrigar o colaborador a tomar o medicamento.

“Isso vale como no caso das vacinas, cada funcionário toma se quiser, pois não é uma coisa imposta. A obrigação da empresa é oferecer condições adequadas para o retorno das atividades, seguindo as normas estabelecidas pelas autoridades. Ou seja, manter em home office quem puder, separar quem faz parte do grupo de risco e orientar sobre a importância do uso de máscaras e álcool em gel”, salienta Kuster.

Para Vânia Goulart, diretora da Selecta, as empresas precisam alertar sobre a importância do funcionário se cuidar, usar máscaras e disponibilizar o álcool em gel para todos. “As organizações devem ter ações de engajamento no combate à doença, mas é arriscado oferecer um medicamento. O ideal é que isso seja feito pelo médico do paciente”, finaliza.

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