> >
Famílias de Vila Esperança ameaçam novos protestos em Vitória; entenda

Famílias de Vila Esperança ameaçam novos protestos em Vitória; entenda

Justiça determinou a saída das famílias de área em Vila Velha até a próxima semana; manifestantes pedem alternativa habitacional e prometem novos atos caso não haja acordo

João Barbosa

Repórter / [email protected]

Publicado em 3 de setembro de 2025 às 13:41

Eles manifestam contra a decisão da Justiça de desocupação da área em que vivem mais de mil pessoas

As famílias de Vila Esperança, em Vila Velha, que protestaram no Centro de Vitória na manhã desta quarta-feira (3), prometeram novas manifestações no entorno do Palácio Anchieta caso não haja um acordo com o poder público sobre a situação delas. Elas são contra a decisão da Justiça que determinou a desocupação da área em que vivem, situada entre os bairros Jabaeté e Normília da Cunha, na Grande Terra Vermelha, até a próxima semana.

A informação foi apurada pela repórter Priciele Venturini, da TV Gazeta, que esteve no local e conversou com manifestantes. O grupo está acampado em frente ao Palácio desde domingo (31). Nesta quarta-feira, eles fecharam as avenidas Jerônimo Monteiro e Getúlio Vargas, no Centro de Vitória, causando congestionamentos que afetaram até municípios vizinhos, como Cariacica e Vila Velha.

A líder comunitária Adriana Paranhos afirmou que representantes das famílias de Vila Esperança se reuniram com o governador Renato Casagrande na segunda-feira (1º). "Ele falou que pode aumentar o plano para 650 famílias e aumentar o valor, mas até agora nada foi concluído. Estamos aqui pedindo socorro para arrumar um lugar para colocar essas famílias. Essas pessoas não podem ser jogadas na rua de qualquer maneira", disem entrevista à TV Gazeta.

O plano citado trata-se do subsídio financeiro de R$ 2,2 mil, em parcela única, para 135 famílias identificadas como “em situação de desabrigo”, que, segundo a Prefeitura de Vila Velha, deve ser pago pela empresa proprietária do terreno.

Uma das manifestantes é a dona de casa Ellen Cristina. “Eu morava de aluguel, pagava 400 reais, deixava de comer para pagar porque não tenho renda. Não tenho quem cuide dos meus filhos para eu trabalhar. Uma igreja construiu minha casa e agora corro risco de ir para a rua com meus filhos. Moro lá há mais de cinco anos. Desde domingo, estou lutando pela minha casa”, relatou.

Famílias da ocupação Vila Esperança fazem protesto no Centro de Vitória por Ricardo Medeiros

O que diz o governo do Estado

A secretária de Estado de Direitos Humanos, Nara Borgo, explicou que o governo não faz parte da ação judicial, mas foi convocado pelas famílias. “Eles vieram receber nosso apoio, foram recebidos pelo governador e buscam melhores condições para sair da área ocupada. O que temos feito é dialogar com a prefeitura e o governo federal para que a desocupação ocorra respeitando os direitos da população envolvida.”

Segundo ela, é necessário um cadastro atualizado da prefeitura para identificar as famílias em vulnerabilidade. A partir disso, o governo do Estado estuda a possibilidade de algum aporte complementar.

O que diz a prefeitura

Em nota, a Prefeitura de Vila Velha disse que "elaborou um plano para que, durante a reintegração, seja garantida a proteção social de famílias e indivíduos em situação de pobreza, vulnerabilidade e risco social, com foco na dignidade humana. A desocupação será realizada pela Polícia Militar". 

A administração municipal ressaltou que vai montar na região um espaço para atendimento das famílias, que receberão orientação e apoio. O trabalho contará com profissionais das secretarias de Assistência Social, Saúde, Desenvolvimento Urbano, Educação e Meio Ambiente. Confira a nota completa no final da matéria.

Justiça determina desocupação

A decisão pela desocupação foi expedida pela 6ª Vara Cível de Vila Velha no dia 20 de agosto. A área, conhecida como “Fazendinha 13”, pertence à Fazenda Moendas Empreendimentos e Participações Ltda. e é alvo de disputa judicial desde 2019.

Em abril, uma decisão de reintegração de posse chegou a ser derrubada liminarmente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Agora, a nova decisão prevê o uso de força policial, arrombamentos e demolições caso as famílias não deixem os imóveis no prazo estabelecido.

O juiz Manoel Cruz Doval determinou o pagamento de R$ 2,2 mil para 135 famílias “em situação de desabrigo”, além de caminhões de mudança custeados pela empresa proprietária. No total, foram identificadas 690 famílias, mas apenas uma parte cumpre os critérios para receber o auxílio.

O material ainda mostra que deve ser prestado atendimento às famílias antes da data final para saída voluntária, com suporte das pastas municipais de assistência social, mobilidade e desenvolvimento urbano. Além disso, na reintegração, a ocupação deve contar com serviços de saúde, assistência e segurança.

Advogada diz que plano não é suficiente

Para a advogada Maria Elisa Quadros, que representa as famílias, o plano apresentado não garante a integridade dos moradores e desrespeita decisões recentes do STF. “Esse valor de R$ 2 mil é por família, não por pessoa. O governo federal já demonstrou disposição em destinar verbas para habitação, mas isso não avançou no Estado”, apontou.

Ela ainda destacou que levantamentos feitos pela prefeitura sobre os moradores estariam defasados e não seriam adequados para embasar as decisões judiciais em 2025.

Em uma manifestação expedida sobre a situação da ocupação, a advogada destacou que a Prefeitura de Vila Velha, nos primeiros anos da ocupação, chegou a realizar estudos prévios sobre as famílias, mas que inconsistências sobre os moradores levaram à produção de um novo levantamento em 2022. Este último estudo, porém, como aponta a advogada, também estaria defasado para embasar as decisões em 2025.

Quantas pessoas fazem parte da ocupação?

Existem divergências sobre o número real de pessoas que vivem no espaço. Em uma estimativa dos próprios ocupantes, são mais de cinco mil pessoas vivendo no local. Para a Prefeitura de Vila Velha, com base em dados de 2022, são 690 famílias. Já para a Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES), o assentamento tem 800 famílias. Não existem dados oficiais que comprovem os números.

Quem vive em Vila Esperança?

Em abril, após a primeira liminar que derrubou a reintegração de posse do terreno, A Gazeta visitou a comunidade. Na época, muitas famílias chegaram a deixar a ocupação, com medo de conflitos, já que a ação de reintegração previa — como na decisão atual — atuação policial e ação de oficiais de Justiça para cumprimento dos mandados de retomada da área.

Entre os ocupantes que ficaram no terreno estão famílias de diferentes perfis e realidades. No começo de abril, enquanto ainda reorganizavam suas casas pela então iminente necessidade de mudança, os moradores contaram sobre a chegada até a vila, o medo de perder a casa e também sobre as expectativas sobre um possível processo de regularização do que querem reconhecer como bairro. Confira:

Conheça os desafios do local e quais são os próximos passos para uma possível regularização

Nota da Prefeitura de Vila Velha na íntegra

"A Prefeitura de Vila Velha informa que o Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) determinou, no dia 20 de agosto de 2025, a retomada da reintegração de posse das áreas das comunidades conhecidas como Vila Esperança e Vale Conquista, em Jabaeté, reconhecendo que se tratam de terrenos particulares. As ações de reintegração de posse foram ajuizadas pelos proprietários em 2017 e 2019. 

Diante da decisão, as pessoas que ocupam a região deverão deixar o local, e a Prefeitura elaborou um plano para que, durante a reintegração, seja garantida a proteção social de famílias e indivíduos em situação de pobreza, vulnerabilidade e risco social, com foco na dignidade humana. A desocupação será realizada pela Polícia Militar. 

A área foi mapeada e congelada em 2022, com base em dados cruzados de mais de 25 fontes, para orientar ações seguras e humanizadas. Foram identificadas 690 famílias, sendo que 135 cumprem os critérios para recebimento do subsídio financeiro com finalidade habitacional, que será pago pela empresa autora da ação, no valor de R$ 2.222,00. 

A empresa deverá também disponibilizar veículos para transporte dos bens ao novo local de moradia do ocupante, com limitação territorial, compreendendo os municípios de Guarapari, Serra, Cariacica, Vitória e Vila Velha, ou ao local destinado à guarda provisória dos bens. 

A empresa deverá disponibilizar um local para guarda de móveis, que guarnecem as residências, entre os quais não estão incluídos: portas, janelas, madeiras, materiais de obras e afins, mantendo-os sob sua responsabilidade, por 21 (vinte e um dia) dias a contar da data da conclusão do processo de desocupação. Não serão guardados materiais perecíveis. 

Também caberá à empresa comunicar às pessoas do local, por meio de placas na região mais próximo da ocupação, informações contendo os nomes das famílias e carros de som e telefone de contato de WhatsApp, meio pelo qual as famílias poderão entrar em contato. 

Município 

Cabe à Prefeitura de Vila Velha montar na região um espaço para atendimento das famílias, que receberão orientação e apoio. O trabalho contará com profissionais das secretarias de Assistência Social, Saúde, Desenvolvimento Urbano, Educação e Meio Ambiente. 

Dentro deste espaço, haverá atendimento psicossocial no dia da ação, realizado por equipe específica, para orientações e encaminhamentos conforme normativas em vigor. 

Atendimento às famílias com crianças e adolescentes em idade escolar, para fins de informações sobre transferência para outra unidade escolar, se necessário. 

Recolhimento adequado de animais doentes e animais em situação de maus-tratos. Em caso de animais abandonados, o município dará destinação conforme legislação em vigor, após análise da secretaria competente. Caso o ocupante demonstre interesse, poderá assinar Termo de Doação, com cláusula de irrevogabilidade, para que o município possa dar a destinação ao animal, após análise os técnicos."

Este vídeo pode te interessar

  • Viu algum erro?
  • Fale com a redação

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais