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Cotidiano de engenheiro do ES com doença rara faz sucesso no TikTok

Cotidiano de engenheiro do ES com doença rara faz sucesso no TikTok

Matheus Tavares Emerich é morador de Pancas, no Noroeste do Espírito Santo. Ele descobriu a doença de Tay-Sachs quando tinha 16 anos, após ter tremores

Publicado em 24 de março de 2022 às 16:46

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Matheus Tavares Emerich se formou em engenharia civil no final de 2020
Matheus Tavares Emerich se formou em engenharia civil no final de 2020. (Lotus Formatura)

Até por volta dos 12 anos, Matheus Tavares Emerich era uma criança que tinha uma vida normal — mas, a partir dessa idade, ele começou a apresentar alguns tremores e passou a ter dificuldade para andar. Junto dos familiares e após várias idas a hospitais e consultórios, o jovem recebeu o diagnóstico: doença de Tay-Sachs.

Degenerativa, a doença ela compromete o sistema nervoso, afetando as habilidades motoras. Embora a notícia evidenciasse que o futuro não seria tão simples e pudesse desanimar qualquer pessoa, Matheus seguiu em frente e se tornou engenheiro. Agora, o jovem também faz sucesso no TikTok.

QUATRO ANOS ATRÁS DE UM DIAGNÓSTICO

Morador da cidade de Pancas, no interior do Espírito Santo, Matheus fez quase uma peregrinação, que durou quatro anos, até conseguir receber o diagnóstico correto e, enfim, saber qual era o problema que estava afetando o dia a dia dele — condição para a qual, atualmente, não há cura nem tratamento.

Matheus Tavares Emerich se desenvolveu normalmente até o início da adolescência; aos 16 anos, ele começou a usar muletas para conseguir andar
Matheus Tavares Emerich se desenvolveu normalmente até o início da adolescência; aos 16 anos, ele começou a usar muletas para conseguir andar. (Acervo pessoal | Montagem A Gazeta)

"O primeiro médico foi um cardiologista que pensou que era um problema de circulação e me passou um remédio. Tomei por dois anos, mas nunca melhorou. Depois, procuramos um neurologista, que fez vários exames, mas que não soube identificar o que era e me encaminhou para Vitória", conta.

Na Capital capixaba, a pergunta seguiu sem resposta. "Cheguei a receber diagnóstico de ELA (esclerose lateral amiotrófica), até que eu fui para Brasília (DF), onde conseguiram constatar a deficiência em uma enzima. Nisso, eu já tinha 16 anos e estava na faculdade", relembra Matheus.

Aspas de citação

A gente ficava apreensivo porque não sabia o que era e foi difícil de aceitar, pois eu era uma pessoa bem ativa e, do nada, comecei a sentir perda de locomoção e força

Matheus Tavares Emerich
Engenheiro
Aspas de citação

Atualmente com 23 anos, ele revela que chegou a sofrer algumas quedas e precisou usar muletas ainda no início da graduação. Apesar das dificuldades e de depender de alguém para levá-lo às aulas, ele se formou em engenharia civil em 2020 por uma universidade em Colatina, também no interior do Estado.

"O que eu não faço mais é me locomover sozinho. Andar é muito difícil. Para sair de casa, preciso de ajuda. Por isso, não estou trabalhando como engenheiro. Mas, em questão intelectual, não tenho nenhum problema", esclarece Matheus, que incluiu natação na rotina, há cerca de um mês.

DOENÇA COMO INSPIRAÇÃO PARA VÍDEOS

Sem a liberdade física que costumava ter, sem as aulas e em meio à pandemia, ele se viu em casa por mais tempo. Foi nesse contexto que o jovem nascido em Resplendor, Minas Gerais, decidiu criar, no meio do ano passado, um perfil no TikTok — rede social onde já tem mais de 20 mil seguidores.

"Começou como uma diversão. No início, postava vídeos como os das outras pessoas. Depois, comecei a fazer alguns mais informativos sobre a doença de Tay-Sachs, pouco conhecida. Os seguidores chegaram depois de um vídeo com mais de 200 mil visualizações. Foi uma surpresa", conta feliz.

Por meio das postagens, Matheus responde questões simples sobre a doença em geral, mas também relata a própria experiência, revelando que a casa em que ele mora precisou ser adaptada, por exemplo. Além de informar, outro objetivo fica claro por meio das legendas das publicações: #motivacao.

Ainda nas redes sociais, ele admite que nem sempre é fácil conviver com a doença, por isso, resolveu participar de uma pesquisa sobre um possível tratamento, realizada no Rio Grande do Sul. "Tenho esperança que esteja mudando algo internamente para frear a degeneração", afirma.

MÉDICO EXPLICA DOENÇA ULTRARRARA

Geneticista, o médico Roberto Giugliani explica que a doença de Tay-Sachs consiste em um defeito nos gangliosídeos, uma molécula que precisa ser produzida e degradada todo dia pelo organismo. Com a má formação, eles acabam sendo acumulados no corpo, afetando o sistema nervoso.

"É uma doença degenerativa. Na forma adulta (caso do Matheus), a pessoa apresenta problemas motores, falta de equilíbrio e a fala pode ficar afetada. Nesse nível, não necessariamente há uma redução da expectativa de vida do paciente, mas pode ser que a qualidade dela diminua", esclarece.

1 caso a cada 100 mil
É a estimativa da proporção de pessoas com ocorrência da doença de Tay-Sachs

De acordo com o especialista, há também a forma juvenil — similar à adulta, mas em que a doença se manifesta entre dois e cinco anos — e a infantil, considerada mais grave. "Nessa forma, a criança não tem força, não consegue ficar sentada ou firmar o pescoço e costuma morrer antes dos cinco anos", explica.

Devido à baixa frequência com que ocorre na população, a doença de Tay-Sachs é considerada ultrarrara (com menos de 1 caso a cada 50 mil pessoas). "Só na comunidade judaica que ela é mais frequente e é considerada rara", afirma Roberto. Atualmente, não há tratamento nem cura para ela.

ESPERANÇA: PESQUISA EM ANDAMENTO NO BRASIL

Além de médico geneticista, Roberto Giugliani é professor do Serviço de Genética Médica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, que conduz uma pesquisa que tem como principal objetivo estudar o efeito de um medicamento, que talvez possa diminuir o ritmo de progressão da doença.

"Os participantes fazem vários testes que medem a concentração de certas substâncias. Esses exames são feitos, em média, a cada dois meses. O remédio usado se chama Venglustat: é uma pílula de uso diário. Se ele conseguir retardar o avanço, já é algo bom. Se interromper, melhor ainda", diz.

Matheus Tavares Emerich, ao lado de um médico e uma enfermeira que o acompanham durante os exames feitos em Porto Alegre
Matheus Tavares Emerich, ao lado de um médico e uma enfermeira que o acompanham durante os exames feitos em Porto Alegre. (Acervo pessoal)

No Brasil, a pesquisa começou no início de 2021 e tem duração de dois anos, ou seja, está praticamente na metade. No entanto, o resultado vai demorar mais para ser divulgado, porque há estudos semelhantes em diversos países da Europa, América do Norte e Ásia que também precisam ser concluídos.

"Nós não podemos comentar a pesquisa enquanto ela está em andamento, por questões de sigilo, mas, mesmo que pudesse, 50% dos participantes estão tomando placebo e 50%, o remédio. Só sabemos quem está tomando o que no final. Não dá para adiantar o que a pesquisa vai apontar", explica Roberto.

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