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Coronavírus: entenda o termo de autorização para tratamento com cloroquina

Coronavírus: entenda o termo de autorização para tratamento com cloroquina

A reportagem de A Gazeta conversou sobre o assunto com dois juristas para compreender o termo; quais são os direitos do paciente e quais seriam os deveres do médico?

Publicado em 28 de maio de 2020 às 19:38

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A cloroquina é um medicamento usado no tratamento da malária
A cloroquina é um medicamento usado no tratamento da malária e que vem sendo testado contra a Covid-19. (Freepik)

Apesar de não haver, até o momento, comprovação científica dos benefícios da utilização da cloroquina no tratamento da Covid-19, o que vem dividindo opiniões quanto à aplicação do medicamento, a substância foi permitida no Brasil desde o último dia 20, até mesmo para utilização em casos mais leves do novo coronavírus. No entanto, a medicação foi alvo de suspensão de testes pela Organização Mundial da Saúde (OMS), anunciada nessa segunda-feira (25), para avaliar a segurança da aplicação. Para a administração pelos médicos no país, pacientes e/ou familiares devem assinar um termo de consentimento, no qual afirmam conhecer os riscos trazidos pelo tratamento experimental, tais como possíveis efeitos colaterais severos.

Dentre os efeitos adversos da cloroquina, são apontados o maior risco de arritmia e morte, quando se compara com pacientes que não usaram o medicamento. Um estudo da Escola de Medicina de Harvard, realizado com mais de 96 mil pacientes e publicado no dia 22, inclusive concluiu que não foi possível observar benefício em caso de pacientes internados com a Covid-19 que usaram a substância.

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Termo de Ciência e Consentimento para uso da cloroquina em tratamentos da Covid-19

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A reportagem de A Gazeta conversou sobre o assunto com dois juristas para compreender o termo e de que modo ele poderia ser desconsiderado no caso de um paciente ter o quadro agravado mesmo diante da utilização do medicamento. Ou seja: quais são os direitos do paciente e quais seriam os deveres do médico?

De acordo com a advogada Paula Tardin de Castro, especialista em Direito do Consumidor, a assinatura de um termo de consentimento para o uso de medicamentos, está ligada ao dever de informação. "Este dever está previsto no artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que o consumidor tem o direito de obter informações adequadas e claras sobre os diferentes produtos e serviços, que inclui também os medicamentos, com a especificação correta sobre quantidades, características, composição e principalmente, sobre os riscos", iniciou.

Portanto, segundo a jurista, o termo de autorização deve conter informações detalhadas, que permita ao paciente ter conhecimento de todos os riscos que decorrem do uso da medicação e aceitar ou não que a cloroquina seja administrada.

RESPONSABILIDADE DO MÉDICO

Para Daniel Lima, advogado especialista em Direito Médico, neste momento em que há desinformação, em se tratando de um novo contexto de pandemia, a melhor prova que os profissionais da saúde têm para se respaldarem quanto ao uso de um medicamento como a cloroquina é de fato o termo de consentimento. "Procedimentos oferecem riscos, cada organismo reage de uma forma. O médico deve apresentar ao paciente o termo e explicá-lo. Se possível, pode filmar o momento em que lê e explica ao paciente, mostrando que houve de fato consentimento", afirmou.

Aspas de citação

O termo, sozinho, não evita processo, mas garante a defesa do médico. A cloroquina pode ser usada e cabe ao médico, no ambiente hospitalar, indicar e controlar a dose. Acredito que é pouco provável que gere uma perda para o médico, já que ele é o único capaz de indicar o tratamento. O termo demonstra que o médico informou, apesar de não haver como prometer resultado. Não se traduz em erro médico alguém vir a falecer

Daniel Lima
Advogado especialista em Direito Médico
Aspas de citação

No mesmo sentido, Castro afirma que caso ocorra alguma reação que cause complicações ao paciente, e desde que previstas no termo de consentimento, não há dever de indenizar. "Neste caso não houve a prática de nenhum ato ilícito. Assim, não é possível o acionamento judicial do profissional da saúde ou dos hospitais. É importante destacar que os profissionais da saúde, que atuam no atendimento de pacientes com Covid-19, possuem a chamada 'obrigação de meio'. Isto é, devem atuar de forma a buscar a cura do paciente, mas não podem garanti-la, fatalidades acontecem", esclareceu.

TERMO COM INFORMAÇÕES INCORRETAS

Já no caso de não haver a assinatura do termo, ou, havendo, contenha informações incorretas que gerem complicações ao paciente, Paula Tardin de Castro explica que será possível haver responsabilização do médico. "Neste caso a responsabilidade do médico é subjetiva, ou seja, o paciente deve demonstrar que o profissional agiu com negligência, imprudência ou imperícia", disse.

Já o hospital particular, neste caso, segundo a advogada, responde de forma objetiva, ou seja, independentemente da existência de culpa, por danos decorrentes de defeitos na prestação de serviço, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Já os hospitais públicos, que são geridos por municípios, Estados ou União, também respondem objetivamente, com base no artigo 37, parágrafo 6º da Constituição Federal.

Para Lima, a dosagem administrada da cloroquina pode ser uma discussão judicial. "O termo de consentimento, na forma como está escrito, deve provar que não foi administrado de forma errada. No caso de erro médico, pode haver até responsabilidade solidária entre o médico e o hospital, que é o que se observa em quase 95% dos processos de erro médico. Mas o paciente pode entrar na Justiça contra o médico apenas. No caso de um médico do SUS, este é considerado um agente público, e há juiz que entenda que este médico pode responder junto ao Estado e que o Estado teria direito de cobrar do médico, o que não é comum na prática", concluiu.

O QUE DIZ O TERMO DE CONSENTIMENTO

No texto do termo de consentimento divulgado pelo Ministério da Saúde, devem ser apresentados os riscos aos pacientes de que não há garantia de resultados positivos no uso da cloroquina para o tratamento da Covid-19, bem como da possibilidade de efeitos colaterais. Além disso, deve ser informada a utilização em conjunto com outra droga e orientar o doente para demais riscos decorrentes desta associação de medicamentos.

Ciente dos riscos, o paciente também deve ser informado da persistência do tratamento padrão, que pode incluir medidas de suporte da respiração e oxigenação, ventilação mecânica, drogas para sustentar a pressão e fortalecer o coração, hemodiálise e antibióticos, entre outras terapias oferecidas a pacientes que estão criticamente doentes.

Orientado sobre os detalhes do tratamento, o termo traz o espaço para assinatura do paciente, deixando claro que esta deve ser feita "por livre iniciativa", autorizando determinados médicos a administrarem a substância referida. O documento traz ainda uma ressalva de que o paciente poderá desistir da autorização, caso o tratamento ainda não tenha sido iniciado.

Como último item do documento, o médico responsável assina uma declaração de que informou detalhadamente ao paciente e familiares sobre o objetivo, benefícios, riscos e alternativas ao tratamento.

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