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Publicado em 28 de agosto de 2025 às 18:40
Um diretor de cinema do Espírito Santo e a empresa da qual é sócio foram condenados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) a pagar R$ 1,6 milhão por deixar de prestar contas de gastos com a produção de um filme não concluído, que recebeu investimentos do governo federal, por meio de incentivos fiscais. O valor inclui R$ 1,2 milhão em devolução aos cofres públicos e outros R$ 440 mil em multas ao diretor Sérgio de Araújo Medeiros e à RMS Produções Cinematográficas.>
A obra alvo da decisão é o longa-metragem "Helena", uma adaptação do romance de mesmo nome de Machado de Assis. A produção teve cenas iniciais gravadas em 2019 no Palácio Anchieta, no Centro de Vitória, e contava com Nicette Bruno no elenco. A atriz global morreu em 2020 por complicações da Covid, sem ver o filme ser lançado. >
"Helena" seria o primeiro filme dirigido por Sérgio de Medeiros, como é conhecido o cineasta. Em suas redes sociais, ele se apresenta como diretor da empresa Travelling Cinematográfica, nome fantasia da RMS Produções Cinematográficas. A defesa de Sérgio foi procurada por A Gazeta, mas disse que não comentaria o caso.>
A devolução da verba e a aplicação das multas foram determinadas pela 1ª Câmara do TCU, em sessão colegiada realizada na última quarta-feira (26). O relator do caso, ministro Benjamin Zymler, foi acompanhado à unanimidade em seu voto pelos demais ministros.>
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Sérgio de Medeiros recebeu autorização para captar R$ 999.033,75 por meio da Lei do Audiovisual em 2013. O instrumento de incentivo fiscal permite que pessoas físicas e jurídicas abatam parte do Imposto de Renda devido ao patrocinarem obras como filmes, séries e documentários aprovados pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), órgão ligado ao Ministério da Cultura. >
Empresa e diretor chegaram a captar R$ 484 mil com patrocinadores entre 2016 e 2017, dos R$ 999.033,75 que poderiam receber. Após algumas prorrogações, o cineasta e a RMS tinham até 17 de novembro de 2022 para prestar conta sobre o uso dos recursos. No entanto, o prazo venceu sem que qualquer comprovação da aplicação regular da verba tenha sido enviada ao governo federal, segundo o acórdão. >
Com isso, a Ancine abriu uma Tomada de Contas Especial (TCE) em 2024 para apurar o caso. A TCE busca identificar possíveis responsáveis e reaver o prejuízo em casos de não comprovação de investimento de recursos públicos. >
Antes da instauração do processo administrativo, ainda em 2023, a Ancine havia dado prazo de 30 dias para finalização da obra. Empresa e cineasta também foram notificados por diversas vezes pela agência reguladora sobre a inadimplência e sobre a necessidade de apresentar documentação que comprovasse a regularidade na aplicação dos recursos, o que não foi cumprido, de acordo com o TCU. >
Ao ser cobrada sobre a ausência de informações, a produtora teria alegado dificuldades para a realização do projeto. O acórdão destaca, entretanto, que, apesar dessas alegações, não foram adotadas medidas objetivas visando à prestação de contas. >
Sem justificativas a diversas notificações, o caso acabou julgado à revelia (quando não há contestação por quem está sendo alvo da apuração). >
Ministro Benjamin Zymler, do TCU
Relator do acórdãoEm 2021, a empresa produtora informou pelo Instagram que o filme estava em fase de finalização. Em maio de 2023, depois dos prazos vencidos para prestação de contas na Ancine, a Travelling Cinematográfica lançou um novo comunicado, afirmando que 95% das cenas haviam sido filmados até o início da pandemia, quando as gravações foram suspensas. >
Os 5% restantes seriam da fase de Helena quando criança, no entanto, a atriz que interpretava o papel tornou-se adolescente no período. "Tivemos que selecionar nova atriz para o papel", dizia a nota oficial. Novamente, a produtora reforçou que a obra estava sendo finalizada e que estrearia em breve. >
Em discurso na Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales) a respeito do filme em dezembro de 2016, antes do início das gravações, Sérgio de Medeiros prometeu um grande elenco, com diversos atores nacionais e até uma participação internacional. A equipe técnica, segundo o cineasta, também contaria com especialistas estrangeiros em trilha sonora e produção musical, por exemplo, além de diretor de fotografia premiado nacionalmente. Dos nomes citados, apenas Nicette entrou na produção. >
“Quando se faz um trabalho de qualidade técnica e artística, com um elenco dessa envergadura, baseado no romance mais popular de Machado de Assis, que é o maior escritor brasileiro, há uma forte tendência de que esse projeto divulgue muito o turismo do Espírito Santo”, disse Sérgio de Medeiros, à época. >
O diretor e roteirista também afirmou, na mesma ocasião, que "Helena" havia recebido convite para ser lançado na Itália e em Honduras. Também estaria em negociações para ser exibido nos Estados Unidos. >
Cálculo da área técnica do TCU mostra que a dívida do cineasta e da produtora com os cofres públicos chega R$ 1.224.090,67, com valores atualizados até 5 de agosto deste ano. Os montantes que compõem a dívida são:>
Além de ter que devolver R$ 1.224.090,67 aos cofres públicos, Sérgio de Medeiros e a empresa RMS Produções Cinematográficas vão ter que pagar, cada um deles, R$ 220 mil em multa, somando R$ 440 mil em penalidades. >
Duas atrizes que participaram das gravações faleceram antes do lançamento do longa-metragem. Nicette Bruno, a eterna Dona Benta do "Sítio do Picapau Amarelo", da TV Globo, morreu no dia 20 de dezembro de 2020 no Rio de Janeiro, aos 87 anos, devido a complicações da Covid-19. A outra morte registrada no elenco foi de Lara Cavati, também em dezembro de 2020, aos 15 anos. >
Em entrevista para A Gazeta de maio de 2019, Nicette Bruno comentou as gravações no Palácio Anchieta, sede do governo estadual. Na trama, a atriz dava vida a Úrsula, tia de Estácio, interpretado pelo ítalo-brasileiro Vicenzo Richy ("As Aventuras de Poliana"). O romance trata do amor do rapaz por Helena, personagem que coube à atriz Giovanna Chaves, conhecida pela novela "Cúmplices de um Resgate" (SBT). >
"A história do livro se passa no século XIX, mas o filme foi adaptado para algo próximo dos anos 50. É uma história linda de amor, um romance daqueles de que a gente se lembra de quando era adolescente e lia aqueles livros com a potência literária desses grandes escritores", contou Nicette, à época das filmagens. >
Na ocasião, a atriz, que havia gravado apenas cinco cenas do longa-metragem, conciliava suas agendas no Rio de Janeiro, para as gravações da novela das 18h "Órfãos da Terra”, com as filmagens no Espírito Santo, aos finais de semana. À reportagem, contou que ficaria na ponte aérea Rio–Vitória até o fim daquele mês de maio. "Vamos ver se dá tempo", disse. >
O perfil no Instagram @filmehelenaoficial dedica-se a registrar os bastidores da produção e gravação do filme, com inúmeras fotos tendo o Palácio Anchieta como cenário. >
A primeira postagem na página ocorreu em maio de 2019 e a última em março de 2024, mas sem qualquer relação com a obra. É apenas um desejo de “Boa Páscoa” aos seguidores do perfil. Não há informações sobre a conclusão ou lançamento da produção. >
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