Operação Naufrágio corre o risco de naufragar se a Justiça ficar à deriva

O que vai determinar se a força-tarefa que trouxe à tona um dos maiores escândalos do Judiciário brasileiro terá sido completamente inócua é a agilidade ou não da Justiça

Publicado em 14/12/2021 às 02h00
Tribunal de Justiça do Espírito Santo
Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Crédito: Fernando Madeira

Quando a Polícia Federal e o Ministério Público Federal resolveram, em 2008, batizar de "Naufrágio" a operação que inundou o Judiciário capixaba com suspeitas de venda de sentenças, loteamento de cartórios e fraude em concursos, ninguém poderia prever que, mais de uma década depois, uma ironia poderia atingir em cheio essa escolha. Com a leniência da Justiça em colocar no banco dos réus os investigados (o que só ocorreu no último dia 1º de dezembro) e a expectativa de que o julgamento demore a ser realizado, é a própria operação que corre o risco de afundar.

O que vai determinar se a força-tarefa que trouxe à tona um dos maiores escândalos do Judiciário brasileiro terá sido completamente inócua é a agilidade ou não da Justiça nesta etapa. Tempo e justiça estão de mãos dadas, em qualquer circunstância. Mas, sobretudo quando são os próprios magistrados que estão sob escrutínio, a Justiça brasileira ainda parece incapaz de dar uma resposta rápida à sociedade, com o rigor que mostre que não há impunidade para aqueles que não honram a toga ou o exercício do Direito. As perspectivas, contudo, são pessimistas.

Com 15 réus, o processo deve se arrastar por alguns anos, na visão de especialistas. E até a instância de julgamento, no Superior Tribunal de Justiça, pode contribuir para a demora. Para o professor de Direito Raphael Pereira, isso deve ocorrer porque órgãos colegiados costumam demorar mais a julgar processos do que juízes em 1ª instância.

O tempo também é o que determina a prescrição dos crimes. Vale lembrar que os 11 anos que a Justiça levou para apreciar a denúncia impediu o julgamento de 11 denunciados: cinco deles morreram e outros seis cujos crimes prescreveram. O alerta de advogados e professores de Direito é que, se o julgamento não ocorrer nos próximos três anos, a maior parte dos 15 réus pode se beneficiar da prescrição dos crimes quando sair uma sentença. O tempo, quando se estende a esse ponto, é parceiro da impunidade.

Quando esteve em Vitória no início do mês, Luís Roberto Barroso comentou o caso pelo viés do mau funcionamento do sistema penal brasileiro. "Nada que leve 11 anos pode ser considerado normal", afirmou o ministro do STF, sobre a denúncia da Operação Naufrágio. Barroso se expressou sobre um mundo ideal, no qual tanto tempo para se apreciar uma denúncia deveria ser a exceção, não a regra. 

No Brasil, o problema é que essa demora está, sim, naturalizada a ponto de ser considerada normal. Mesmo que represente o próprio fracasso das instâncias judiciais. Roubando a expressão que marcou o início da pandemia, a Justiça brasileira depende de um novo normal. A sociedade deve estar atenta para evitar que os resultados da Operação Naufrágio não causem nada mais do que frustração. Ao mesmo tempo, é o próprio Judiciário brasileiro que sairá fortalecido se encarar esse processo como uma prioridade.

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