Congelar salário no serviço público é o menor dos sacrifícios na crise

Enquanto as filas pelo auxílio emergencial se engrossam e trabalhadores do setor privado têm jornadas e salários reduzidos, proposta de Paulo Guedes  de não reajustar salários é bem mais branda

Publicado em 29/04/2020 às 06h00
Paulo Guedes e Jair Bolsonaro
Paulo Guedes e Jair Bolsonaro. Crédito: Marcos Corrêa/Fotos Públicas

Com a economia paralisada em muitos setores, o avanço do desemprego tornou-se inevitável. Pior do que isso, impossibilitou o próprio trabalho, no caso do exército de pessoas que sobrevive na informalidade. O pesadelo dos últimos cinco anos ficou ainda mais assustador com a pandemia e o impreterível distanciamento social, e todos os dias é possível testemunhar pelo noticiário as intermináveis filas nas quais se encontram aqueles que dependem do auxílio emergencial do governo para atravessar a crise. Estima-se que até 75 milhões de brasileiros devem fazer uso desses R$ 600, o que expõe a massa mais afetada pelas medidas drásticas que se impõem no Brasil e no mundo.

Quem está conseguindo manter o emprego, está tendo que se readequar à nova realidade. São cerca de 24,5 milhões de trabalhadores com carteira assinada no país que devem sofrer impactos da suspensão de contratos ou da redução de salários e jornadas amparadas pela MP 936. Na iniciativa privada, também o meio empresarial passa por suplício, tanto pela interrupção das atividades quanto pela queda abrupta de receitas.  Não há quem esteja tranquilo diante dos impactos da reviravolta socioeconômica provocada pelo novo coronavírus.

Mas, quando se observa o serviço público, a paisagem é outra, bem mais agradável. Obviamente, um caso que não se refere àqueles que estão na ponta do atendimento à sociedade, em destaque neste momento a maioria dos profissionais de saúde, sem salários altos ou benesses. O foco é a elite do funcionalismo, com seus proventos exorbitantes e os privilégios que se acumulam. São intocáveis. A pandemia tem mostrado que nem mesmo uma crise sanitária sem precedentes e com impactos econômicos tão graves é capaz de balançar a blindagem histórica das categorias que se encontram  no topo.

A reforma da Previdência, no ano passado, arrastou-se em grande parte pela força de grupos de pressão, intransigentes quanto ao compartilhamento dos sacrifícios para conter o rombo. Depois, a reforma administrativa, primeiramente anunciada para dezembro, não conseguiu sair do lugar pelos mesmos motivos.  Com os registros dos primeiros casos de Covid-19 no país, outras urgências ganharam corpo, mas mexer com as prerrogativas do serviço público continua sendo o maior tabu da República.

Tanto que ficou registrado nesta segunda-feira (28) o quanto o tema aterroriza quem está no poder. O presidente Jair Bolsonaro, na coletiva em que o ministro Paulo Guedes pediu que "o funcionalismo público mostre que está com o Brasil", não conseguiu disfarçar o incômodo quando, de uma forma direta, o chefe da pasta da Economia pediu aos servidores que não se mobilizem por reajustes neste momento tão crítico. Não falou em corte de salário, tampouco em fim de estabilidade. Congelamento de salário, hoje, é o menor dos sacrifícios. O constrangimento do presidente diante da fala, com as cutucadas que não conseguiram ser discretas, mostra como é difícil a adesão do setor público, ironicamente, a tudo que é de interesse público. Até mesmo diante da catástrofe.

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