A distração sistêmica na sociedade atual é uma anestesia de grande alcance e longa duração. A educação carrega em si mesma um contexto de solidariedade, que carrega em si a inclusão. Quando se fala de Educação Financeira, naturalmente fala-se da primeira etapa da Cidadania Financeira, que é a Inclusão Financeira. De acordo com a definição oficial do Banco Central do Brasil, a Cidadania Financeira “é o exercício de direitos e deveres que permite ao cidadão gerenciar bem seus recursos financeiros”.
E continua com o desenvolvimento desse conceito em seu site: “O desenvolvimento da cidadania financeira se dá por meio de um contexto de inclusão financeira, de educação financeira, de proteção ao consumidor de serviços financeiros e de participação no diálogo sobre o sistema financeiro.”
A Educação Financeira precisa ser inserida em todos os contextos e em todas as camadas da sociedade, porque possibilita ampliar a capacidade pensante e o poder decisório com qualidade de todos os indivíduos em relação ao seu dinheiro. Ora, se para ser cidadão financeiro é preciso o exercício de direitos e de deveres, é preciso primeiro aprender quais são esses direitos e deveres. E quem vai ensinar? A família? A escola fundamental? O ensino médio? A universidade? O trabalho? O governo? Quem? Como? Quando?

A maioria dos cidadãos, até pouco anos atrás, fazia sua identidade e seu CPF para tirar sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), geralmente entre os 16 e 18 anos. Hoje, as crianças já são registradas no cartório e saem com o número do CPF. Será que daqui a alguns anos já sairão também com uma conta bancária ativa? Parece exagero, mas muitos pais de classes mais abastadas, assim que os filhos nascem, correm para fazer uma previdência privada para cada um de seus herdeiros.
Para ser cidadão financeiro, o primeiro passo é a inclusão financeira, saber direitos e deveres e ser incluído no sistema financeiro. Durante a pandemia, descobriu-se que muitos eram desbancarizados e alguns, sequer, tinham CPF. Planejar um futuro financeiro para uma nação, educar uma nação, requer a educação de cada indivíduo e de todas as classes e esferas sociais. Isso é muita coisa, e precisa sair do papel. Precisa extrapolar as paredes do lindíssimo prédio do Banco Central de Brasil e chegar a cada escola e família desse país.
Ademais, dar um salto na vida financeira depende não só de trabalho, mas de estudo. Pena que muitos descobrem isso tarde, na vida adulta. Se isso fosse ensinado na escola, muitos nunca parariam de estudar, principalmente, na parte pertinente a juros compostos. Essa parte vital da matemática precisa ultrapassar os meandros das folhas A4 das provas, precisa aparecer em todas as matérias, com aplicabilidade e casos reais.
Equilibrar a vida profissional, a vida pessoal e as finanças não deve ocorrer em pratos separados; todas essas áreas precisam estar juntas. Dissociar é um mal do Ocidente, do mundo moderno. Com as ferramentas certas, com organização e reaprendizado é possível ter resultados sensacionais nesta e na próxima geração. O objetivo da Cidadania Financeira é ir além dos esforços de um único órgão, no caso o Banco Central; é fazer jorrar conhecimento financeiro pelos poros de todos, fazer o Brasil transbordar conhecimento macro e microeconômico.
Até aí, não seria um problema, se não fosse o tamanho e a diversidade do Brasil. Integrar é de fato um desafio hercúleo. Mas o que se pode aprender com grandes empresas multinacionais de sucesso e longevas é que delegar para as pessoas certas, comprometidas com a causa e engajadas com a missão e a visão da empresa é o melhor caminho possível para manter uma unicidade, mesmo na diferença.
Portanto, de Norte a Sul do Brasil há de ser feito um trabalho de Educação Financeira fantástico a ponto de, em um médio prazo, resolvermos, em grande parte, a triste história da inadimplência das famílias que só fazem o país sangrar. Com educadores comprometidos, formados, capacitados e com alto comprometimento com a austeridade fiscal, financeira, monetária, etc. Não importa o nome dado, é possível espalhar a Cidadania Financeira por todo o território brasileiro.
Diante desse cenário, repetir que gastar menos do que ganha precisa ser um refrão chiclete, um jingle político. É um óbvio que precisa de dito e repetido. Mas por que ser dito e repetido não está dando certo? Porque, entre o medo e o desejo, há um ponto de decisão que só acontece quando há propósito. E esse só acontece quando há educação. Sem a educação, dificilmente serão alcançadas as austeridades financeiras individual e nacional.
Todavia, querer que esse processo seja rápido e certeiro é uma utopia, um verdadeiro sonho. Mas não o ter é muito negativo. É melhor ter o vigor da vontade de se alcançar 100% do que o receio de não chegar ao objetivo final. É preciso ter o cenário ideal na mente, para o quadro ficar quase perfeito. Não há como imaginar Claude Monet imaginando um jardim mais ou menos para pintar seus magníficos quadros. Ser esse grande artista, esse grande cidadão que conhece seus direitos e seus deveres precisa de técnica, precisa de aprendizado, precisa de um professor ou de um dom, precisa de um ambiente, precisa de material, precisa de paz, precisa de tempo, precisa de propósito, precisa de inteligência para combater as distrações. Monet não tinha a mídia o bombardeando com propagandas, não morava em um grande centro no qual os outdoors o chamassem para comprar o tempo.
Hoje há uma ciência chamada neuromarketing que bombardeia os cérebros de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos o tempo todo de forma segmentada e focada de acordo com classe social, poder aquisito, nicho, intenção de compra, visualizações de redes sociais, cliques na internet. Nossos cidadãos, que poderiam estar fazendo cursos gratuitos de Educação Financeira, estão aos montes sendo bombardeados pelo neuromarketing. E só tem uma forma de combater isso: ir além das planilhas. Combater o neuromarketing com a Economia Comportamental, a Psicologia Financeira e, melhor ainda, com a Neuroeconomia.
Por fim, conclui-se que não há escassez de métodos para obter uma organização orçamentária; “receitas de bolos” do que lançar como crédito e débito e em qual categoria enquadrar os gastos existem aos montes por aí. O que se torna cada vez mais validado é que a falta de adesão aos métodos existentes é por causa do comportamento humano. Alguns especialistas mais generalistas chamam de resistência, alguns mais entusiastas e que acreditam no poder de mudança do ser humano, como Daniel Kahneman, chamam de Economia Comportamental. E nessa, que esse texto se baseia, na crença de que a educação pode mudar tudo isso.
Se o marketing se apoderou disso e aplica todo esse conhecimento no neuromarketing para vender mais e melhor, é preciso que a neuroeconomia seja o antídoto que faça o cidadão ter o poder de entender o que está acontecendo no seu cérebro. Do porquê ele ficou motivado a comprar edredons em uma loja porque sentiu aquele cheiro especial, sendo que nem precisa de edredons. A partir daí o poder de passar o cartão de crédito ou fazer o Pix é dele, não do neuromarketing.
Entender o que motiva a compra é mais importante do que comprar e depois anotar na planilha, ver que extrapolou e prometer a si mesmo que não comprará mais. Escrever, anotar e analisar é importante. Mas analisar antes é muito melhor e isso só é possível com Educação Financeira, através de Finanças Comportamentais com método, muita leitura e acumulação de conhecimento.
E o que fazer com a Educação Financeira na família? Na escola? Na universidade? No trabalho? Bem, fica a provocação do artigo para que todos comecem essa matéria nesses ambientes. Cabe a cada um lutar por uma melhor saúde financeira que envolve saúde mental. Lutar pelo seu direito de saber lidar com o dinheiro é lutar por sua saúde mental. Questione? Peça Educação Financeira em qualquer ambiente que você estiver inserido.
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