Publicado em 23 de abril de 2020 às 07:50
Ao afirmar que o Brasil é um dos países com melhor desempenho contra a Covid-19, o ministro da Saúde, Nelson Teich, ignorou a larga subnotificação de casos da doença no país. >
"O Brasil hoje é um dos países que melhor performa em relação a Covid. Se você analisar mortos por milhão de pessoas, o número do Brasil é de 8.17. A Alemanha tem 15. A Itália 135. Espanha 255. Reino unido 90 e EUA 29", disse Teich nesta quarta-feira (22), em sua primeira entrevista à imprensa no cargo. >
A fala desagradou gestores da saúde e técnicos do ministério ouvidos pela reportagem. Reservadamente, eles dizem que a comparação é incorreta, pois a falta de testes não permite afirmar quantos casos e mortes o país tem de fato. >
Segundo boletim do Ministério da Saúde de segunda-feira (20), o Brasil registrou 366% mais hospitalizações por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) em 2020 do que em 2019. O dado sugere um largo número de pacientes da Covid-19 sem diagnóstico.>
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A diferença de hospitalizações nas últimas semanas é gritante, comparada ao mesmo intervalo do ano anterior. Na "semana epidemiológica 13", que se encerra no fim de março, foram 11.797 internações em 2020 contra 1.123 em 2019. Cerca de 9 mil casos desta semana ainda estavam investigação até segunda-feira. >
"Os nossos números são um dos melhores. Qual o problema da covid? Ela assusta porque acomete muito rápido o sistema. E os sistemas de saúde não são feitos para ter ociosidade. Você tem de trabalhar com eficiência máxima. Saúde é muito caro. Não dá para trabalhar com ociosidade. Os hospitais trabalham no limite. Quando tem algo que sobrecarrega o sistema, é quase impossível você conseguir se adaptar na velocidade necessária", disse Teich. >
Para o médico Julival Ribeiro, porta-voz da Sociedade Brasileira de Infectologia, comparar a performance do Brasil com outros países no combate a Covid-19 exige mais testes e mais dados. O ministério promete ter em mãos 46,2 milhões de testes na crise, mas só entregou 2,5 milhões até agora aos Estados. Destes, apenas 524,3 mil são do tipo RT-PCR, usado para um diagnóstico definitivo da doença. >
"Nos Estados com isolamento social a gente postergou um pouco (o crescimento de casos). Eles não vêm ocorrendo ao mesmo tempo. Mas a gente nunca viu tanta pneumonia. Será que não é Covid? Mas não temos testes de diagnóstico?", disse Ribeiro. >
Ao elogiar dados do Brasil, Teich também deixou de lado a taxa de letalidade do País. Ainda que distorcido, também por causa da subnotificação, o percentual do Brasil é de 6,3% de mortes sob o total de casos. Na Alemanha, citada pelo ministro, a taxa cai para cerca de 3%. Os vizinhos Argentina (4,8%), Paraguai (3,8%) e Chile (1,4%) também mostram indicadores melhores que o do Brasil. Os dados são da universidade Johns Hopkins, também usados pelo ministério. >
"A gente não tem dados. Só em São Paulo havia milhares de testes para serem analisados. Só isso já era um furo. Não temos teste RT-PCR, que diagnostica o vírus", afirma o infectologista Ribeiro.>
Procurado, o Ministério da Saúde não se manifestou.>
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