Publicado em 11 de janeiro de 2021 às 07:52
- Atualizado Data inválida
No amplo galpão da fábrica na zona norte de Manaus, as máquinas operam 24 horas por dia com 100% da capacidade. >
As linhas de produção automatizadas garantem o mínimo contato entre os 400 colaboradores, que não tiveram redução de jornada durante a pandemia. Ao contrário: a demanda por insumos hospitalares aumentou 10%.>
Enquanto Estados e o governo federal travam uma corrida por seringas e agulhas para garantir a vacinação contra a Covid-19, a fábrica da SR (Saldanha Rodrigues) em Manaus, uma das quatro que produzem tais insumos no Brasil, opera a plena carga para abastecer o mercado nacional.>
Mas todo esse reforço na produção pode não ser suficiente para garantir a imunização dos brasileiros contra a Covid-19, ou seja, para a aplicação das duas doses da vacina em pelo menos 70% da população, sem risco de desabastecimento ao longo da campanha.>
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Isso porque o Ministério da Saúde restringiu a vacinação a apenas um modelo de seringa: a de 3 ml com o chamado "bico de rosca", limitando a produção nacional a 1,5 milhão por dia. A indústria pode não dar conta da demanda a tempo da chegada das doses em todos os Estados.>
"Quando o ministério escolhe apenas um modelo de seringa assim, em cima da hora, ele limita toda a capacidade de produção das empresas, porque as linhas de produção levam até um ano para serem adaptadas para um novo molde. Vai acontecer isso, de alguns Estados terem seringa de 3 ml e outros não para a vacina", afirma o o diretor-técnico da SR, Tomé da Silva.>
Para se ter uma ideia do impacto, nas duas fábricas da SR, em Manaus e Pedro Juan Cababallero, no Paraguai, a capacidade de produção é de 3,5 milhões de seringas por dia, de todos os modelos.>
Considerando apenas o modelo de 3 ml especificado pelo ministério, cai para 500 mil por dia.>
Já somando os quatro modelos usados pelo Plano Nacional de Imunização em vacinações anteriores, passa para 2 milhões por dia.>
Ele afirma que a produção diária do país poderia ser de 6 milhões de seringas por dia, caso a especificação técnica incluísse os modelos de 0,5 ml, 1 ml, 3 ml e 5 ml.>
As seringas seriam combinadas com modelos diferentes de bicos e agulhas para se adaptar a cada necessidade.>
"Isso ampliaria a produção para cerca de 100 milhões por mês. Em questão de três meses resolveríamos a demanda do país todo. Isso vai acelerar o processo de vacinação e evitar que haja um desabastecimento nos Estados", sugeriu.>
"Estávamos falando e o governo não estava ouvindo, a verdade é essa", completou.>
Os fabricantes de seringas dizem que o Brasil pode assegurar, sem depender de importações nem medidas comerciais restritivas, os insumos para a vacinação de 150 milhões de brasileiros, contando apenas com a produção interna.>
Segundo o diretor e presidente da SR, Luiz Antonio Saldanha Rodrigues, 74, a indústria nacional tem capacidade para produzir 1,2 bilhão de seringas e agulhas por ano nas quatro fábricas instaladas no país.>
Para ele, as medidas adotadas pelo governo federal para adquirir os insumos - que vão de restrições à exportação à requisição administrativa de 30 milhões de seringas e agulhas das indústrias brasileiras - são desnecessárias.>
"É [uma medida] inócua. É uma precaução do governo, mas a verdade é que não falta seringa no mercado. E as fábricas estão preparadas para suprir o aumento da demanda, mesmo porque ninguém vai tomar 300 milhões de doses num dia", justificou, ao lembrar que o calendário de vacinação do ministério se estende até 2022.>
Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos e Odontológicos (Abimo), entidade que representa as indústrias de equipamentos médicos, a capacidade produtiva das fábricas brasileiras é de 1,2 a 1,5 bilhão de seringas por ano.>
Desde agosto do ano passado, a Abimo alerta para a importância de um planejamento conjunto entre governos e fabricantes para a produção de seringas e agulhas para a vacinação contra a Covid-19, de forma a evitar a escassez e a disputa por insumos.>
Na última quinta (7), o governo federal anunciou a requisição administrativa de 30 milhões de kits de agulhas e seringas das três fabricantes brasileiras, alegando "iminente perigo público".>
No mesmo dia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou que as novas compras desses insumos estariam suspensas até que os preços voltassem "ao normal".>
Além da SR, as empresas Becton Dickinson Indústrias Cirúrgicas, com fábricas em Curitiba (PR) e Juiz de Fora (MG), e Injex, em Ourinhos (SP), têm até 30 de janeiro para entregar o estoque ao Ministério da Saúde, que vai pagar uma indenização.>
A medida, que pretende centralizar a compra de insumos e pode comprometer as entregas de compras já realizadas pelos Estados, foi adotada após um pregão conseguir comprar apenas 7,9 milhões dos 331 milhões de seringas e agulhas pretendidas.>
O preço cobrado pelas empresas, acima do esperado pelo governo, foi o principal empecilho para o sucesso do pregão.>
As empresas alegam que os preços foram elevados pelo aumento na demanda e pela alta do dólar, que elevou em até 50% o custo do polipropileno, um tipo de plástico que é o principal insumo na fabricação de seringas.>
O governo federal também restringiu as exportações de seringas e agulhas e zerou as taxas de importações desses insumos, "criando uma concorrência desleal" e uma "situação perigosa" para as empresas brasileiras, alerta Tomé da Silva, da SR.>
Segundo o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, o Brasil tem assegurados 60 milhões de kits de agulhas e seringas para a vacinação contra a Covid-19 e 354 milhões de doses da vacina.>
Outros 40 milhões de seringas e agulhas devem ser adquiridas por meio da Opas, braço para as Américas da OMS.>
Ainda segundo o ministério, o estoque dos Estados e municípios para iniciar a campanha de imunização contra a Covid-19 é satisfatório e novos processos licitatórios devem ser abertos para atender a demanda crescente.>
Na última quinta (7), o STF determinou que o ministério informe, em cinco dias, o estoque de seringas e agulhas para vacinação.>
Levantamento da Folha revelou que as secretarias estaduais têm cerca de 116 milhões de seringas e agulhas em estoque para iniciar a vacinação.>
A Frente Nacional de Prefeitos, por sua vez, já alertou que o estoque que os Estados possuem é destinado também a outras campanhas de vacinação, como a contra o sarampo, além do atendimento nas unidades de saúde.>
Caso esse estoque não seja reposto na mesma velocidade da demanda atual, pode haver falta de insumos ao longo da vacinação.>
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