A agropecuária ainda figura no imaginário brasileiro como uma atividade manual, familiar e geradora de insumos para o setor de alimentos. No entanto, as atividades de transformação têm alterado essa realidade e deixado o campo do Espírito Santo mais industrial.
Além de investir em novas tecnologias para acelerar a produtividade e garantir bons resultados para as culturas, o agro capixaba quer apostar ainda mais no trabalho das agroindústrias. Isso porque esses negócios têm o poder de aumentar o valor agregado das mercadorias, incrementando, assim, a renda de empreendimentos de diversos portes.
“Os pequenos produtores rurais entenderam que ser apenas fornecedor de matéria-prima e vender para uma indústria é abrir mão de uma boa parte do lucro. Então, eles começaram a buscar meios de agregar mais valor à produção, processando o insumo para ganhar mais”, explica o médico-veterinário Arivald Santos Ribeiro, responsável pelas agroindústrias no Sistema Unificado Estadual de Sanidade Agroindustrial Familiar de Pequeno Porte (Susaf/ES), em Guarapari.
Essa busca por diversificar e inovar aquece a economia como um todo. Outra vantagem é que a renda familiar disponível para o consumo se alarga e novos empregos são criados. Como explica a economista Adriana Rigoni Gasparini, professora na Universidade Vila Velha (UVV), a industrialização do agronegócio está ligada ao desenvolvimento econômico do Estado e tem um impacto social.
“É uma cadeia completa que vai desde a oferta de empregos no campo, diretamente envolvidos com o plantio (ou criação), até as embalagens, a seleção dos produtos para categorização por qualidade e, depois, o transporte”, diz a economista.
Para dar mais eficiência à fabricação, principalmente de alimentos, o investimento em tecnologia tem sido crucial para as agroindústrias. Contrariando um receio que surge quando inovações são implementadas nas empresas, Gasparini defende que a modernização não vai substituir a mão de obra, mas sim qualificá-la. Segundo a economista, a necessidade de alimentos e insumos sendo produzidos continua e pode até aumentar, à medida que mais pessoas se envolvem no setor.
Dados do Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2017, mostram que as pequenas agroindústrias capixabas movimentam R$ 75 milhões por ano e empregam diretamente 16 mil pessoas. Além disso, para 48,3% das famílias produtoras, a atividade é a principal fonte de renda, segundo o Diagnóstico da Agroindústria Familiar no Espírito Santo, realizado pelo Incaper em 2018.
Além dos resultados financeiros, outro fator que estimula a expansão do setor agroindustrial, de acordo com Ribeiro, é a criação do Susaf. Tocado com apoio do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf), o sistema tem como objetivo harmonizar serviços de registro, inspeção e fiscalização das agroindústrias animais.
“Os produtores que obtêm essa equivalência podem comercializar o produto no Estado inteiro, então isso alavanca bastante o surgimento de agroindústrias no Espírito Santo”, explica o médico-veterinário, que ainda pontua a presença dos jovens nesses espaços de produção agrícola e pecuária. “Essas agroindústrias de pequeno porte estão nas mãos de jovens que antes saíam para a cidade, mas agora retornam para a propriedade rural da família e implementam a mecanização.”
É o caso da família Marques, proprietária do Laticínios Marques, em Guarapari. Hoje comandado pelos três irmãos engenheiros – de produção, química e de alimentos –, o negócio começou de forma artesanal: a mãe produzia queijos para o consumo da própria família.
Luiza Marques conta que, após concluírem os estudos, os irmãos voltaram para a zona rural e investiram no negócio, que começou com a venda da matéria-prima – o leite – na feira da cidade. “Na época, começou com apenas 30 litros de leite e a produção só do queijo fresco. Com o tempo, aprendemos a fazer o meia-cura. A demanda começou a aumentar, porque o produto era bom.”
Com a procura por mais opções de lácteos processados, os três decidiram registrar o laticínio e fazer as adaptações necessárias para viabilizar a produção maior e mais diversificada. “Hoje, estamos com 30 produtos. Temos uma linha de queijos especiais, ricotas e também uma linha de iogurtes.”
A produtora também pontua que todos os insumos necessários para viabilizar o negócio são comprados de outros produtores da região. “O leite que nós produzimos não é suficiente, então compramos de mais dois produtores das redondezas. Para conseguir o leite e valorizar a produção, nós pagamos um valor acima da média, o que também aumenta o preço final do que vendemos. Você não tem que conquistar o cliente pelo preço, e sim pela qualidade. Porque quem compra pelo preço deixa de comprar quando encontra outro mais barato”, opina Luiza.
Aumentar a qualidade do produto para agregar mais valor a ele também foi o objetivo principal que motivou os fundadores da startup Olho do Dono a desenvolver um software de inteligência artificial voltado para a pecuária.
A partir de mais de 1,5 milhão de imagens 3D de bois, uma rede foi treinada para identificar o peso dos animais, sem a necessidade de locomoção do rebanho. O processo tradicional, além de demorado, também pode resultar na perda de peso do gado, gerando prejuízos. Por isso, o CEO da empresa, Pedro Mannato, conta que a aplicação da tecnologia no campo para pesar os animais promove o aumento da produtividade e lucratividade.
“O equipamento proporciona agilidade e frequência maior da pesagem. Com isso, é possível tomar decisões mais rapidamente, para que o gado ganhe peso mais rapidamente. Isso é importante porque a pecuária está com margens cada vez mais apertadas”, argumenta Mannato.
Para o CEO da startup, tornar as produções mais tecnológicas melhora a gestão e, consequentemente, o aproveitamento. Conseguir acompanhar a criação bovina com base em dados e indicadores proporciona o aumento da produção sem a necessidade de mais equipamentos ou terras, o que contribui para uma agropecuária mais sustentável e com menor impacto ambiental.
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