Biótipos das mulheres agora podem definir tamanhos de roupas
Biótipos das mulheres agora podem definir tamanhos de roupas. Crédito: Geraldo Neto/Ilustração

Os novos tamanhos de roupas que prometem respeitar o corpo da mulher

Há quase uma década, o Brasil está no limbo quando se trata de medidas para definir o tamanho das roupas das mulheres e cada varejista passou a usar uma forma própria de medição. Nova norma da ABNT busca reduzir distorções

Tempo de leitura: 6min
Vitória
Publicado em 09/01/2022 às 13h18

Experimenta uma peça de roupa e descarta porque não vestiu bem na cintura. Veste outra e não passa nas coxas. Tenta mais uma e não fica legal no busto. Encontrar uma mulher que nunca tenha passado por situação semelhante é tarefa quase impossível. Isso porque embora as roupas femininas sigam numerações específicas, os corpos não são padronizados.

Neste contexto, presentear uma mulher com roupas — hábito bastante comum na época de Natal — não é nada fácil, e muitas vezes quem recebe as peças de presente precisa trocá-las porque não serviram ou porque o caimento não ficou legal.

Há algumas explicações para isso. Desde 2012, o Brasil está no limbo quando se trata de medidas para definir o tamanho das roupas das mulheres. Naquele ano, foi revogada a norma anterior da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), de 1995, a NBR 13377, que tratava de maneira genérica de medidas referenciais do corpo humano.

Em 2009, foi criada a NBR 15800, com medidas infantis, e em 2012 foi lançada a NBR 16060, de medidas referenciais masculinas. Mas, como não se chegou a um consenso, não foi estabelecida nova referência para os modelos femininos.

Com isso, cada varejista passou a usar uma forma própria de medição. É o motivo, por exemplo, pelo qual uma mesma mulher pode vestir tamanhos diferentes de roupa, dependendo das marcas adquiridas.

No início de dezembro de 2021, entretanto, a ABNT aprovou a NBR 16933, norma que visa a evitar essas disparidades e nortear os tamanhos e medidas de roupas femininas no país. Uma das novidades, conforme explica a superintendente do Comitê Brasileiro Têxtil e Vestuário da ABNT, Maria Adelina Pereira, é a instituição da centimetragem nas etiquetas.

“É mais ou menos o que a gente já viu no e-commerce, que é uma numeração mais metrológica, não codificar as pessoas com ‘você é um P, um M, G ou GG, ou 40, 42, 44’. Isso não serve mais. Se perdeu no tempo. E as empresas foram usando isso até para fazer marketing, como: ‘aqui você entra no 40, no concorrente não’. E isso não funciona mais. É como dizer que um apartamento tem três quartos. Ok, mas qual a metragem? Podem ser três quartos nos quais mal cabe uma poltrona.”

Outra mudança é o sistema de indicação de medidas para biótipos, em especial os tipos retângulo e colher, que representam 80% da população feminina, segundo pesquisas levantadas para o estabelecimento da norma.

Maria Adelina Pereira

Maria Adelina Pereira

Superintendente do Comitê Brasileiro Têxtil e Vestuário da ABNT

"Nosso sonho é que, no futuro, não se use mais essa codificação cheia de variáveis, como: 'esse é um corpo GG', ou 'um corpo 44', mas sim 'isso aqui é um quadril com tantos centímetros'. Não haverá dúvidas sobre a numeração. Será o que a fita métrica mostra"

A NBR 16933 é fruto de um estudo conduzido com apoio de representantes do setor, como o Senai CETIQT (Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil), modelistas, entidades como a Associação Brasileira do Plus Size (ABPS) e de redes varejistas.

A coordenadora de Serviços de Consultoria de Confecção do Senai CETIQT, Patrícia Dinis, explica que foram identificados cinco biótipos femininos principais no Brasil. São eles:

  • ampulheta (busto e quadril similares e cintura fina);
  • ampulheta inferior ou colher (quadril um pouco mais largo que o busto e arredondado);
  • retângulo (busto e quadril similares e cintura mais larga);
  • triângulo (busto menor que o quadril e cintura larga);
  • triângulo invertido (busto maior que o quadril).

O que define a diferença entre os biótipos é a relação matemática entre as medidas de circunferências de busto, cintura, quadril e quadril médio.

Ela pontua, por exemplo, que, durante o estudo, foi identificado que cerca de 74% das mulheres têm o corpo retangular, muito embora, em termos de modelagem, seja o formato menos atendido pelo mercado, que prioriza o biótipo ampulheta, que representa algo próximo a 3% das brasileiras.

“Se uma empresa for atender a toda uma população feminina, precisaria ter uma quantidade absurda de peças e modelagens, gerando estoques altos de peças que não fossem vendidas. Neste caso, a forma mais racional de conduzir uma produção, é definir o público e corpo pretendido e desenvolver produtos padronizados (internamente pela empresa e fornecedores terceirizados ligados à marca), para atender a esse público. E fazendo isso, aplicar na etiqueta de seus produtos a indicação do tamanho e pelo menos uma medida corporal significativa utilizada”, pondera Patrícia.

Outra sugestão é disponibilizar a tabelas de medidas de corpo no site da marca para auxiliar o consumidor na escolha do melhor tamanho a atender e se o seu corpo é compatível com a marca.

Patrícia Dinis

Patrícia Dinis

Coordenadora de Serviços de Consultoria de Confecção do SENAI CETIQT

"Um 'pecado' praticado é a troca das nomenclaturas dos tamanhos, indicando um P para uma peça que veste um tamanho maior, dando a falsa sensação de que a pessoa usa um manequim que não é realmente o seu. E ainda, o foco da maioria das empresas de confecção de moda é trabalhar com um ideal de corpo que é diferente do real, além de não atender públicos, como o plus size (mulheres do 46 ou 48 em diante) e o petit (mulheres abaixo do 36)"

As normas propostas pela ABNT querem facilitar a vida das empresas, ajudando-as na confecção de produtos que atendam melhor ao público. Ainda assim, apesar agora haver referências para medidas de modelos de roupas femininas, não significa que a mudança será imediata, até porque as marcas não serão obrigadas a cumprir as normas.

Contudo, a existência da normativa abre o leque de possibilidades e possibilita que as marcas ampliem a oferta de peças além de variações atuais.

Empresário do setor de vestuário e confecção no Estado, José Carlos Bergamin não arrisca dizer se acredita que as indústrias tendem ou não a aderir, mas observa que se as empresas quiserem acertar mais, o ideal seria tentar seguir essas novas regras.

"Temos duas questões: a moda se transformou completamente para adequar aos gostos, e os biotipos, que variam de acordo com cada lugar. O que se busca agora é dar uma atenção maior a essa questão, e, com a popularização da venda pela internet, isso se tornou mais comum. Não é mais o cliente que vai à loja, é o produto que tem que ir aonde o cliente estiver, e dentro deste princípio, ele tem que ir certo. Para isso avançar, uma das primeiras necessidades têm que ser encontrar formas de informar bem ao cliente sobre o que ele está comprando, então, quem quiser acertar, tem que aderir."

A professora do curso de Design de Moda da Faesa, Julia Almeida, observa que sempre será difícil padronizar e que essa é uma luta antiga, embora, mais recentemente, algumas empresas venham movendo esforços para encontrar alternativa.

"As mulheres brasileiras têm biotipos bem diversificados. Há variações entre mulheres do Nordeste, do Sul, do Sudeste, temos miscigenação, algumas origens diversas, como europeias, africanas, indígenas, e temos a própria variação hereditária, de família. A ABNT já tentou padronizar isso antes, mas havia sempre muita confusão. Sem contar que muitos varejistas compram roupa de fora, com padrão europeu, que é diferente daqui."

Ela pontua que, mais recentemente, algumas empresas têm buscado se adequar. A Renner, por exemplo, tem investido em inovação e tecnologia 3D para desenvolver manequins físicos projetados a partir do escaneamento de corpos reais, para entregar aos consumidores peças mais fiéis ao seu biotipo. Outras magazines oferecem ajustes de graça, para adequar melhor as peças aos corpos das clientes.

“Hoje em dia também temos uma opção chamada ultra-fashion, que são marcas, principalmente, de designers independentes, que têm ganhado as redes sociais, e geralmente permitem escolher a peça de acordo com as medidas, sob demanda. Outra coisa é o público também. Se é uma mulher plus size, a pessoa que quer presentear pode recorrer direto a lojas para esse público específico.”

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