Publicado em 6 de abril de 2021 às 06:06
O empresário, músico, escritor Carlos Fernando Monteiro Lindenberg Filho, o Cariê, morreu nesta terça-feira (06), em Vitória, aos 85 anos, após complicações de uma pneumonia. Responsável pelo surgimento da maior rede de comunicação do Espírito Santo, fundador da TV Gazeta e do site Gazeta Online hoje A Gazeta -, ele presidia o Conselho de Administração da Rede Gazeta. Em decorrência da pandemia do novo coronavírus, o velório e o enterro vão ser restritos à família.>
Cariê deixa três filhos: Carlos Fernando (Café), Letícia e Beatriz; e cinco netos - Eduardo, Mariana, Carlos Fernando, Carolina e Antônio. Apaixonado pelo campo, ele tinha na Fazenda Três Marias, em Linhares, uma de suas paixões. Nos últimos anos, se dividia entre a leitura e a música em sua residência na Ilha do Frade, em Vitória. Desde o começo da pandemia da Covid-19, ele permaneceu em isolamento social. Enfrentava problemas de saúde desde agosto de 2020 e, há pouco mais de um mês, foi internado, falecendo nesta terça-feira (06).>
A partida de Cariê ocorre num dia marcante para a família: o aniversário de sua mãe, Maria Antonieta Queiroz Lindenberg, que teria completado 104 anos nesta terça-feira (06). Ela partiu em 2013, aos 96 anos, após um Acidente Vascular Cerebral (AVC). >
Para Cariê não havia dúvidas de que era capixaba, mesmo tendo sido trazido para Vitória com 17 dias. Nasci no Rio de Janeiro por acaso. Sou capixaba, afirmava. E foi aqui onde cresceu, estudou boa parte da vida e construiu uma história que se entrelaça com o desenvolvimento do Espírito Santo. >
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Filho do ex-governador Carlos Fernando Monteiro Lindenberg e de Maria Antonieta, Cariê passou a adolescência na praia, nadando e jogando pelada com os amigos. Sempre jogando muito mal, mas me divertindo, brincava. >
No final da adolescência, foi para o Rio de Janeiro estudar Direito na Pontifícia Universidade Católica (PUC), onde se formou em 1958. Lá fez grandes amigos que o acompanharam por toda a vida, além de seu inseparável violão. Cariê acompanhou o surgimento da Bossa Nova, ao lado de Tom Jobim, Newton Mendonça, Roberto Menescal. Tempos de boemia que ele lembrava com emoção. Foi uma delícia, um momento fantástico para mim, dizia.>
Foi Cariê quem compôs a música Devaneios, que durante muitos anos era executada no encerramento diário da programação da TV Gazeta. Corro o risco de ser conhecido como o compositor de uma música só, brincava, com o sorriso que sempre o acompanhava.>
Nos últimos 18 anos, Cariê vinha se dedicando à sua nova paixão, a literatura. Publicou seis livros, sendo o último deles em 2019. Nas obras, contou um pouco da sua trajetória, da sua infância e adolescência, dos momentos vividos no Estado, como a grande enchente de 1979, e também se aventurou em crônicas. >
Escrevia como vivia, com leveza. Vejo a vida como uma rosa. Eu posso ver os espinhos e achar que ela é uma porcaria, ou achar que os espinhos são um componente à parte. Prefiro sempre ver o lado mais agradável, resumiu, há 20 anos, no lançamento do seu primeiro livro, Eu e a sorte.>
Ao longo de seus 85 anos, Cariê sempre foi um ferrenho defensor do jornalismo e da liberdade de expressão. Esteve à frente da Rede Gazeta entre os anos de 1965 e 2001. Foi por sua atuação que o Grupo Globo estabeleceu-se no Espírito Santo, tendo a TV Gazeta como afiliada, e posteriormente os negócios se expandiram, com a criação de rádios, do site e das emissoras regionais sediadas em Cachoeiro de Itapemirim, Linhares e Colatina. >
Nunca escondeu sua paixão pela Redação, como revelou em 2018, por ocasião do aniversário de 90 anos da empresa: "Minha tarefa não era lá, mas meu cacoete era ficar lá. Se não inteiramente na Redação, com os caras que eram os editores, diretores, jornalistas. Eu tinha, graças a Deus, excelente trânsito. Porque também era econômico em pedir as coisas, eu nunca mandei. Sempre propus discutir alguma coisa que fosse boa", relembrou, à época.>
Cariê entrou para o mundo empresarial por sorte - como ele mesmo definiu. Sem experiência ou formação em administração, fez a fazenda da família, em Linhares, dobrar de tamanho, embora não tenha lhe dado lucro. Mas foi sob a sua gestão que o jornal A Gazeta, que havia sido comprado para apoiar o PSD e tinha apenas 38 funcionários, ganhou perfil imparcial e desvinculado de partidos políticos.>
Filho do ex-governador Carlos Lindenberg, que comandou o Espírito Santo por dois períodos (1947-1951 e 1959-1962), Cariê não quis ingressar na vida política. Na última passagem do pai pelo Palácio Anchieta, chegou a ser convidado a assumir uma cadeira no secretariado, após colaborar ativamente com a campanha, mas declinou da ideia. "Disse ao papai: não tenho conhecimento necessário para fazer-te uma boa companhia; vou continuar no meu carguinho. Mas é preciso você manter a (minha) mesada, porque não vou ficar com essa pobreza", contou, em 2019, com seu característico bom humor.>
Foi um dos responsáveis pelo processo "de forma lenta, real e gradativa", como explicava, de separar o jornal A Gazeta de vínculos políticos, na década de 1960, fato do qual ele sempre manifestou orgulho. "Houve a possibilidade de caminharmos para a isenção e a ponderação das verdades. É uma marca de A Gazeta. Vi isso em vários jornais importantes do Brasil e do mundo, e também nos livros sobre ética jornalística. Absorvi com muita naturalidade", pontuou.>
Uma reflexão que revelou em sua última entrevista, concedida ao jornalista Abdo Chequer em setembro de 2019: No jornalismo não cabe favor. Nem favor a favor e nem favor contra. O jornalismo tem que ser isento, tem que ser a transparência do que ocorre com a sociedade a que ele serve. >
Desde a profissionalização nos anos de 1960, o jornalismo de A Gazeta sempre esteve presente nos momentos importantes da história do Espírito Santo. É difícil pensar em fatos marcantes, foram tantos. Prefiro falar da postura que A Gazeta teve a vida inteira, e que se aprimorou cada vez mais, no sentido de se tornar um veículo de alta confiabilidade pública, porque ela se esmera em evitar divulgar coisas que não sejam exatamente correspondentes à verdade, destacou na última entrevista.>
Cariê Lindenberg
Após conquistar a independência editorial para A Gazeta, Cariê se preocupou em garantir uma gestão séria para a empresa. Já na década de 60 decidiu montar um orçamento e equilibrar as finanças, o que permitiu realizar os investimentos nas décadas que se seguiram, como a construção de uma nova sede, em Bento Ferreira, um novo parque gráfico para o jornal. >
Em paralelo, ele foi em busca de um canal de televisão, no que contou com a ajuda de sua mãe, Maria Antonieta, que o surpreendeu ao conseguiu agendar uma entrevista com Roberto Marinho. Ela jogava cartas com a irmã do Marinho, que agendou o encontrou, contava, rindo da situação.>
Em 11 de setembro de 1976, nascia mais um de seus sonhos: a TV Gazeta. E não parou por aí. Depois veio a expansão para as outras regiões, novos investimentos tecnológicos, as rádios e o site. >
Cariê nunca perdeu a confiança nas mudanças, no impacto que poderiam ter na vida dos capixabas, sempre procurando antecipá-las. Foi assim na criação da TV, quando decidiu transmitir a missa aos domingos. >
E seguiu confiante até mesmo no momento da maior mudança vivida pelo grupo, que em 2019 decidiu interromper a circulação diária de A Gazeta, após mais de 90 anos, com investimento no jornalismo on-line. >
Ao ser questionado sobre o futuro da empresa, ele foi taxativo: O futuro da Gazeta é alvissareiro porque, certamente, sua transparência e sua credibilidade vão se ampliar através do on-line. Teremos mais leitores do que temos hoje com o papel, então a tendência é ampliar o âmbito de pessoas que se servem da Gazeta para saber as notícias do Espírito Santo. >
E concluiu: Somos uma empresa que resolveu, conscientemente, antecipar o que muitos outros ainda estão por fazer. E também resolvemos nos igualar aos tantos outros que já o fizeram. Foi bom, é bom e será bom.>
Em seu livro "Vou te contar", Cariê resumiu sua trajetória na empresa: "Eu encontrei a vida na Gazeta e larguei todo o resto que eu fazia. Talvez um terço ou mais das histórias do livro sejam vinculadas à Gazeta porque foi a coisa mais importante da minha vida".>
Cariê Lindenberg no comando da Rede Gazeta
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