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Justiça suspende cobrança de advogados a pessoas vulneráveis em Nova Venécia

Justiça suspende cobrança de advogados a pessoas vulneráveis em Nova Venécia

Segundo apuração do Ministério Público, advogados chegavam a levar clientes ao banco para receber pagamentos não declarados

Publicado em 20 de março de 2024 às 18:46- Atualizado há um mês

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Justiça
Liminar da Justiça suspende pagamento de honorários de advogados que faziam cobranças exorbitantes em Nova Venécia. (Pixabay)
Felipe Sena
Repórter / [email protected]

A Justiça do Espírito Santo suspendeu o pagamento mensal de valores "exorbitantes" feitos a advogados de Nova Venécia, no Noroeste do Estado. A cobrança era realizada a pessoas idosas e outas em situação de vulnerabilidade que recebem benefícios previdenciários ou assistenciais de até dois salários mínimos (R$ 2.824). Na decisão, também foi definida uma multa de R$ 10 mil, no caso de descumprimento. 

A determinação atende a um pedido feito pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), que entendeu que a cobrança de altos honorários feita pelos advogados violam os direitos de pessoas em situação de hipervulnerabilidade, como idosos, pessoas com necessidades especiais, analfabetos, trabalhadores rurais, inválidos, incapazes e pessoas em condição de pobreza extrema.

Na Ação Civil Pública, o MPES relata que os advogados cobravam altos valores de beneficários de previdência e assistência social que procuravam seus serviços. De acordo com a apuração do órgão ministerial, os advogados chegavam a atrasar o ajuizamento de ações, de forma proposital, por meses e até anos, mesmo com toda a documentação, como forma de obter ganhos maiores com honorários.

Diante da demora na resolução de seus problemas, várias pessoas passaram a procurar o MPES em busca de informações sobre o andamento dos casos. Com isso, descobriu-se que, em várias situações, os advogados nem sequer tinham iniciado o processo, embora a contratação dos serviços advocatícios tenha ocorrido há meses ou anos. Com isso, recebiam pagamentos mensais dos beneficiários, mesmo não atuando em suas causas. 

Justiça suspende cobrança de advogados a pessoas vulneráveis em Nova Venécia

Advogados levavam pessoas até o banco para receber "por fora"

Outro detalhe relatado pelo MPES é que a Justiça já havia determinado a redução de honorários em alguns processos individuais. Apesar disso, os advogados levavam as pessoas até o banco para receber "por fora", de forma não declarada, ou forçando os clientes a realizar pagamentos por outros meios, como cessão de crédito.

Além disso, segundo apuração do Ministério Público, alguns dos advogados citados na ação tinham vínculo empregatício com sindicatos e utilizavam a estrutura da instituição para captar clientes e cobrar valores indevidos de honorários.

O MPEs entrou com a ação contra 11 advogados de Nova Venécia, mas a suspensão dos pagamentos mensais cobrados sobre os benefícios tem eficácia ampla, ou seja, vale para todos os casos em que a cobrança tenha ocorrido. Pessoas que se sintam lesadas pelo pagamento de valores elevados, em situações semelhantes, podem procurar o Ministério Público ou a Defensoria Pública para integrar o mesmo processo.

O que diz a defesa

O advogado Thiago Siqueira, que representa os advogados que são alvo da Ação Civil Pública, entrou em contato com a reportagem e negou as acusações. Por nota, ele afirma que a ação e a decisão do juiz são "uma clara tentativa de afirmar como ilegais práticas absolutamente lícitas e corriqueiras na advocacia previdenciária".

De acordo com a defesa, a demora entre a contratação dos advogados e o ajuizamento das ações se deve ao faço de que havia recursos na esfera administrativa, no INSS. Para ingressar com a causa na Justiça, seria necessário esperar os desfecho desses recursos. Ainda segundo a defesa, não houve cobrança de nenhum valor exorbitante. Abaixo, está o posicionamento da defesa na íntegra.

Manifestação da defesa dos advogados citados na ação

A ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público e a decisão proferida pelo magistrado Maxon Wander Monteiro são uma clara tentativa de afirmar como ilegais práticas absolutamente lícitas e corriqueiras na advocacia previdenciária. 

A suposta demora entre a contratação dos advogados e o ajuizamento das ações se deve exclusivamente ao fato de os advogados terem apresentado recursos administrativos perante o INSS, instância que, sabidamente, leva considerável tempo para apreciar os requerimentos. Nesses casos, os advogados não poderiam ajuizar as ações antes do julgamento dos recursos administrativos; os recursos seriam automaticamente rejeitados. Após o julgamento dos recursos, as respectivas demandas judiciais foram imediatamente propostas. 

Quanto aos advogados que atuam perante sindicatos, a gratuidade de honorários prevista em lei restringe-se às demandas trabalhistas. Isso não impede, porém, que os advogados atuem em demandas previdenciárias destes mesmos sindicalizados. Trata-se de situação extremamente comum. 

Não houve, pelos advogados, a cobrança de qualquer valor exorbitante a título de honorários. Todos os valores pactuados estão estritamente dentro dos parâmetros legais e, ainda, do que é prática corriqueira na advocacia previdenciária, chancelada inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça. 

Os casos em que os advogados acompanharam os respectivos clientes em agências bancárias decorrem do fato de o magistrado negar que a parcela referente aos honorários pudesse ser recebida diretamente pelos advogados. Este destaque de honorários tem previsão legal (art. 22, § 4º do Estatuto da Advocacia), mas tem sido negado pelo magistrado de Nova Venécia sem qualquer justificativa. Nesses casos, os advogados acompanharam seus clientes e receberam apenas os valores combinados. 

Destaca-se, ainda, que as decisões do Dr. Maxon que interferem nos honorários a serem recebidos pelos advogados de Nova Venécia têm sido corriqueiramente cassadas pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, diante de sua inegável ilegalidade.

Finalmente, esclarece-se que a decisão da ação civil pública foi proferida em caráter liminar – sem que, antes, os advogados pudessem elucidar a verdade dos fatos – pelo mesmo magistrado que tem reiteradamente interferido nos honorários a serem recebidos pelos advogados de Nova Venécia. Todas as provas da legalidade da atuação dos advogados serão apresentadas à Justiça, que, certamente, irá reformar a decisão proferida na ação civil pública.

Errata Atualização
21 de março de 2024 às 19:33

Posteriormente à publicação do texto, a defesa dos advogados de Nova Venécia entrou em contato com a reportagem e enviou uma nota se manifestando sobre o caso. A matéria foi atualizada.

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