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Publicado em 14 de setembro de 2021 às 15:18
Natural da região da Indonésia, no sudeste asiático, o peixe-leão (Pterois volitans) poderia ser apenas uma espécie que você admira em aquários de água salgada. Porém, recentemente, a espécie venenosa — que oferece riscos aos seres humanos — tem sido encontrada no arquipélago de Fernando de Noronha (PE), onde sete exemplares foram capturados nas últimas semanas e a ameaça de que haja outros parece crescente.>
Além de possuir espinhos venenosos no dorso do corpo que podem causar febre, inchaço e dor em humanos, ele representa um sério perigo aos ecossistemas marinhos onde é visto como um animal exótico. É o caso das três localidades em que já foi achado no Brasil — cuja lista não engloba, ainda, o Espírito Santo.>
No entanto, o pesquisador Raphael Macieira diz que deve ser questão de tempo para que o peixe-leão chegue ao mar capixaba. "A tendência é que esses animais desçam a costa, até por fatores oceânicos. Além disso, já foram registrados encontros da espécie, ainda que raros, ao Sul do Estado", afirma. >
Se isso vai acontecer de forma mais rápida ou lenta, segundo o pós-doutor em Oceanografia, é difícil saber. No entanto, os riscos que o animal pode oferecer ao ecossistema marinho por aqui são basicamente os mesmos que poderão ser verificados em outros lugares, inclusive com consequências econômicas.>
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Após ter sido levado para a Flórida (EUA) para aquariofilia, o peixe-leão foi acidentalmente introduzido no Oceano Atlântico, particularmente próximo ao Caribe. Exatamente nesta região, ele conseguiu se reproduzir e virou uma praga, segundo o pesquisador e analista ambiental Ricardo Araújo. >
Ricardo Araújo
Pesquisador do ICMBio NoronhaCoordenador da área de pesquisa, monitoramento e manejamento de espécies exóticas do ICMBio Noronha, o especialista explica que o mesmo poderia acontecer em outros locais, incluindo o arquipélago pernambucano. Na região, o primeiro indivíduo da espécie foi encontrado em dezembro de 2020 e outros sete foram capturados entre agosto e setembro deste ano.>
Antes, no entanto, a espécie já havia sido localizada bem mais perto do Espírito Santo: em Arraial do Cabo (RJ), em 2014 e 2015. Mas, segundo Ricardo, ecologicamente, a distância entre o local e a costa capixaba é grande e os dois peixes-leão achados à época foram coletados, sem se reproduzirem.>
Depois, já no ano passado, mais indivíduos foram encontrados na foz do Rio Amazonas. A partir deste encontro, pesquisadores estimaram que Fernando de Noronha seria um dos primeiros locais do Brasil onde a espécie chegaria, devido a dinâmicas naturais como correntes marítimas.>
PDF de conscientização elaborado pelo ICMBio traz um resumo da espécie e um QRCode por meio do qual é possível informar o local em que o animal foi encontrado
Tamanho de arquivo: 2mb
Diante do risco, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) começou um trabalho de conscientização. Em uma cartilha, pesquisadores difundiram características do animal e pediram para serem avisados se alguém avistasse um peixe-leão. Mas por que recolhê-los? >
O risco inicial tem basicamente duas vertentes. "Em geral, os animais sabem quais são os seus predadores e já têm estratégias de sobrevivência e fuga. Como o peixe-leão não é conhecido, as presas não sabem que ele é um predador. Já os predadores ainda não sabem que ele é uma presa", explica Ricardo Araújo.>
Ricardo Araújo
Pesquisador do ICMBio NoronhaPara tentar agilizar essa dinâmica e contornar o transtorno, algumas ações já são adotadas no Caribe, porém elas também podem trazer impactos. "Eles dão o peixe-leão para o tubarão comer, mas isso pode fazer com que os tubarões associem o humano à alimentação, o que é outro problema", argumenta. >
É o tamanho médio de um peixe-leão adulto
Além das circunstâncias ecológicas, a espécie tem duas características biológicas que colaboram para que ela se torne cada vez mais predominante nos ambientes em que é introduzida. A primeira é a alta voracidade no que diz respeito à alimentação e a segunda, a velocidade reprodutiva.>
Ricardo Araújo
Pesquisador do ICMBio NoronhaJuntos, esses fatores podem gerar um grande desequilíbrio com impactos inclusive econômicos. "Você começa a ter uma diminuição da produção pesqueira, uma diminuição de espécies nativas e endêmicas e, assim, ter uma redução das espécies importantes para a ecologia local", afirma Ricardo. >
Para ajudar a dimensionar o tamanho do risco, o especialista estima que só em Fernando de Noronha, 169 espécies de peixes ósseos e 218 tipos de moluscos e crustáceos poderiam ser gravemente ameaçados. "São todos da comunidade recifal, incluindo os grandes. É muita coisa", garante.>
Os sete peixes-leão encontrados no arquipélago brasileiro entre agosto e setembro deste ano têm a mesma destinação: após coletados por especialistas, são congelados e mandados para a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) ou a Universidade Federal Fluminense (UFF). >
"Nos laboratórios são feitas análises mais aprofundadas. Queremos saber, neste primeiro momento, o que eles estão predando, por meio do conteúdo estomacal, e de onde estão vindo, por meio das semelhanças com outros exemplares, detectadas em um estudo de genética", esclarece Ricardo Araújo.>
Segundo o pesquisador, apenas o primeiro exemplar recolhido na região já deveria ser adulto — mais ainda não se sabe se em idade reprodutiva. Já os demais foram encontrados juvenis, com cerca de 7 cm de comprimento. "Provavelmente, eles vieram de fluxos diferentes", destaca.>
Embora vivam perto de pedras e a mais de 20 metros de profundidade, vale a orientação para todos: se encontrar um peixe-leão, informe o local em que o animal está por meio deste formulário, pelo e-mail [email protected] ou entre em contato com uma unidade do ICMBio.>
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