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Publicado em 12 de fevereiro de 2025 às 12:17
Os resultados do Programa de Avaliação da Educação Básica do Espírito Santo (Paebes) divulgados terça-feira (11) mostram melhoria no desempenho de alunos em 2024 no comparativo com o ano anterior. Mas, ainda assim, três em cada quatro estudantes não sabem o suficiente em matemática e apenas quatro em cada 10 têm bom desempenho em português. Para completar, os indicadores revelam que os alunos não recuperaram a performance que demonstravam antes da pandemia da Covid-19. >
Esse baixo aproveitamento pode ser explicado por uma série de fatores que se somam às restrições impostas pela crise sanitária, decretada em março de 2020. >
Maria Amélia Dalvi, doutora em Educação, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), pontua que muitos estudantes tiveram a escolarização prejudicada no período mais restritivo da pandemia, tanto pela falta do convívio no ambiente escolar quanto por uma sucessão de ausências — de mediador capacitado, de recursos tecnológicos, de espaço adequado para estudo. >
Contudo, há questões ainda mais profundas, na avaliação de Maria Amélia, que têm contribuído para esse cenário educacional. Uma delas é a precarização do mercado de trabalho, em que muitas famílias se ocupam de atividades autônomas, com jornadas excessivas e quase nenhuma garantia de direitos, e não conseguem dar a assistência necessária para as crianças e adolescentes em seu processo de aprendizagem. >
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Outro problema citado pela educadora, que também foi coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras da Ufes e é fundadora e coordena o grupo de pesquisa Literatura e Educação, é o fechamento sistemático de bibliotecas nas escolas, algumas vezes transformadas em outros espaços, ou, quando têm uma sala de leitura, não dispõem do profissional habilitado para oferecer as referências aos estudantes. >
"A quarta coisa que pode estar envolvida nesses indicadores é que a sociedade como um todo não retomou ao que era antes da pandemia. Houve intensificação dos meios digitais, da comunicação virtual e um processo muito agudizado de negacionismo cientifico, de desqualificação do jornalismo profissional, do trabalho pedagógico do professor. A gente tem visto que as teorias da conspiração, as chamadas notícias falsas (fake news), tudo tem sido legitimado e abonado", analisa Maria Amélia. >
Maria Amélia Dalvi
Doutora em Educação e professora da UfesAlém de apontar o que considera fatores para o mau desempenho de estudantes, Maria Amélia destaca os desafios para os educadores e gestores da educação pública, a começar pela desigualdade social, que impõe aos alunos menos oportunidades na construção do aprendizado. >
No entanto, há aspectos que passam longe da realidade socioeconômica dos estudantes, como a necessidade de valorização do professor. Segundo Maria Amélia, entre os profissionais com nível superior, na média, o educador tem renda equivalente a 70% do rendimento médio de outras atividades. >
"Se a gente quer uma educação fundamental melhor, a gente precisa melhorar a qualidade de vida, renda e formação dos professores. Para o professor preparar uma boa aula, precisa se manter atualizado, aprimorar a prática. Mas não é só incentivo salarial: às vezes, o professor quer fazer uma pós, mas não tem licença (do gestor), é uma luta para conseguir.">
Maria Amélia cita ainda a falta de infraestrutura em muitas escolas, seja pelos espaços inadequados, seja pelo excesso de calor, como um complicador no processo de ensino-aprendizagem. E ressalta que o próprio sistema educacional, da forma como está organizado atualmente no país, é um desafio pelo modelo curricular e de avaliações em larga escala que, conforme afirma, os próprios criadores (nos Estados Unidos) já constataram que não deveriam ser aplicadas no campo educacional. >
Para completar, ela menciona a necessidade de a sociedade voltar a valorizar o esforço para o aprendizado. "Tem uma generalização social de que se esforçar para aprender é ruim. É preciso criar de novo a cultura de dedicação, do empenho, de zelo com o saber, de respeito pelo professor e profissionais que dedicam sua vida ao conhecimento", conclui Maria Amélia. >
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