Violência exige ação policial, mas solução não se encontra à força

Cada instituição pública, cada espaço democrático, cada instância de poder tem seu quinhão de responsabilidade na construção da cultura da paz, seja no aprimoramento de instrumentos legais, seja na criação de políticas públicas

Publicado em 27/03/2021 às 02h00
Violência
Foguetório e disparos de arma são registrados novamente em Jesus de Nazareth. Crédito: Leitor/A Gazeta

15 de março: a técnica em enfermagem Jaciara da Silva de Moura, de 32 anos, é assassinada com 33 facadas em casa, em Cariacica, na frente da filha de 11 anos. Por falta de mandado de prisão, o marido, principal suspeito do crime, foi liberado quando se apresentou à polícia e confessou o crime. 22 de março: o motorista de aplicativo Amarildo Amaro Freire, de 57 anos, desaparece. No dia seguinte, seu corpo é encontrado amarrado, com sinais de tortura e um tiro na cabeça em Guarapari. Os autores registraram o assassinato em vídeo. 24 de março: um confronto entre policias e criminosos termina com um homem morto em Vitória e desdobra-se em tensão nas ruas, com tentativa de incêndio a coletivos e bloqueio de uma movimentada avenida da Capital.

Em suas diferentes facetas, a violência tem permeado a rotina dos moradores do Espírito Santo, com frequentes casos de feminicídio, crimes contra o patrimônio muitas vezes com desfecho trágico e o já tão batido domínio do tráfico em alguns territórios, com seus efeitos deletérios profundos à cidadania e ao bem-estar da população. Episódios como esses, que são apenas os mais recentes entre os que chocaram os capixabas, exigem respostas das forças policiais, é óbvio, mas a solução não se esgota nelas.

Cada instituição pública, cada espaço democrático, cada instância de poder da sociedade organizada tem seu quinhão de responsabilidade, seja no aprimoramento de instrumentos legais, seja na criação de políticas públicas. Desde a simples definição de metas e prioridades do orçamento público por vereadores nas cidades, até a instituição de leis mais eficientes pelo Congresso Nacional, os diferentes atores da sociedade precisam entender seu papel na construção da cultura da paz e na luta contra a impunidade, que passa logicamente por educação de qualidade e a oferta de um horizonte de oportunidades aos jovens, com emprego e dignidade.

O caos instaurado no bairro Jesus de Nazareth, com reflexos em todo o entorno nos últimos dias, é um exemplo explícito de que o Espírito Santo precisa fazer mais e melhor. Fica difícil explicar para os moradores do bairro, que enfrentam as consequências mais diretas do narcotráfico todos os dias, como a sociedade permite que esse estado de coisas se arraste por anos, décadas, sem alívio.

Em 2016, por exemplo, a TV Gazeta teve acesso a gravações das conversas entre sentinelas do tráfico, que vigiam a movimentação da polícia e garantem a tranquilidade para a movimentação de drogas. Um dos vários pontos de observação dos olheiros fica na mesma rua da sede da PRF e do Dnit, e a menos de 200 metros da Secretaria de Estado de Segurança Pública. Três anos depois, A Gazeta também flagrou, por dias seguidos, a atividade dos olheiros no conforto de um sofá, numa das entradas do bairro, de onde podiam ser vistos com radiocomunicadores e armas por qualquer um que passasse pelas movimentadas avenidas Beira-Mar e Leitão da Silva. Neste 2021, bandidos debocham do Estado e de toda a sociedade com foguetórios e tiros no alto do morro.

A mesma sociedade afrontada pelo massacre diário de suas mulheres, como Jaciara, pelo assassinato cruel de seus cidadãos durante sua luta diária por sustento, como Amarildo, e pela demonstração ostensiva de força de traficantes, com armas em punho no topo de uma comunidade inteira aterrorizada, como na fotografia que ilustra esta página, precisa agir com urgência e firmeza para que cenas como essas não se repitam cotidianamente. Diante da total ausência de humanidade que esses episódios revelam, a sociedade deve responder com todo seu arsenal de civilidade.

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